ESPECIAL CONFERÊNCIA GESTÃO DE FROTAS EXPO & MEETING 2021
OPINIÃO HÉLDER PEDRO SECRETÁRIO-GERAL DA ACAP PRESIDENTE DO COMITÉ DE LIGAÇÃO DA ACEA
A Velha Europa e a descarbonização
A
União Europeia tem vindo a aprovar, ao longo dos últimos anos, uma legislação sobre a transição climática que tem vindo a estabelecer, metas cada vez mais difíceis de cumprir e que, em nossa opinião, não tiveram em conta a realidade. Mas, estamos na Europa e é com este cenário que vamos trabalhar. O recente pacote “Fit for 55”, apresentado em julho pelo vice-presidente da Comissão Europeia, Franz Timmermans, contempla várias propostas legislativas para atingir os novos objetivos de descarbonização. No caso das emissões de veículos ligeiros de passageiros, o objetivo atual é a redução das emissões em 37,5%, em 2030. Ora, este novo pacote aponta para uma redução de 55% nesse mesmo ano! E para uma redução de 100% em 2035, o que, a ser aprovado, significa o fim da comercialização dos motores de combustão interna nessa data! Recorde-se que, quando o Parlamento Europeu aprovou o objetivo de redução de 37,5% para 2030, a própria Comissão tinha apresentado uma proposta de redução de 35%. Entretanto, a nova Comissão vem agora aumentar esse objetivo para 55%! Estamos, pois, na velha Europa a querer ir, deste modo, à frente do resto do mundo no que respeita à transição para a descarbonização da economia. A Associação Europeia de Construtores de Automóveis (ACEA) tem, recorrentemente, chamado a atenção dos vários poderes da União Europeia, para a necessidade de termos uma transição realista e objetiva. Devemos lembrar que as emissões de CO2,
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dos veículos novos, já se reduziram em 23% nos últimos dez anos. Esta redução não tem paralelo noutros sectores económicos e revela o grande investimento efetuado pela indústria no sentido da descarbonização. A este propósito, é preciso salientar que a indústria automóvel é a que, de forma destacada, mais investe em I.D., na União Europeia. Anualmente, este investimento (no montante de sessenta e dois biliões de Euros), representa 33% do total do investimento em ID na UE. É ainda de salientar que 12,6 milhões de europeus trabalham no sector automóvel, o qual representa 8,2% do PIB europeu. Mas o pacote “Fit for 55”, agora apresentado, não refere concretamente três aspetos que consideramos essenciais. O primeiro, a necessidade de uma sólida rede de carregamento a nível europeu, que seja de fácil acesso aos cidadãos. A chamada Diretiva AFIR (Alternative Fuel Infrastructure Regulation) vem, pela primeira vez, propor uma métrica para a instalação de pontos de carregamento, que não é, de todo, realista. Assim, enquanto estabelece como objetivo 3,5 milhões de pontos de carregamento na U.E., estudos indicam que, para o cumprimento dos propostos de redução de emissões instituídos para 2030, serão necessários sete milhões de pontos de carregamento… É de salientar que existem, atualmente, 225 mil pontos de carregamento e que destes, 70% estão localizados em apenas três países (Holanda, Alemanha e França). A segunda questão não abordada é a capacidade de acesso dos cidadãos europeus aos veículos eletrificados, dada a diferença de poder de compra dos cidadãos europeus entre Estados. Atualmente, 73% das vendas de veículos elétricos estão concentradas em apenas quatro países, os
quais possuem os mais elevados PIB/per capita da União Europeia. O terceiro ponto prende-se com a necessidade de haver uma transição justa no que respeita ao impacto que a transição para veículos de emissões zero vai ter para muitas empresas, sobretudo fabricantes de componentes, em muitas regiões da Europa. Várias associações, sindicatos e outras organizações têm chamado a atenção da Comissão Europeia para este facto. Estima-se que esta transição terá impacto no emprego de cerca de 2,4 milhões de trabalhadores. O vice-presidente da Comissão, Franz Timmermans, referiu que novos postos de trabalho serão criados com as medidas agora apresentadas. Mas não será fácil a readaptação da economia e da sociedade, devido às diferentes necessidades dos empregos a criar. Dito isto, apesar destes constrangimentos, é importante salientar que não podemos ter uma política de “avestruz” em relação ao assunto. Ou seja, não podemos simplesmente “enterrar a cabeça na areia”! A indústria automóvel provou que é uma indústria resiliente, que sempre soube readaptar-se à custa de elevados investimentos e tem consciência do seu papel na questão da sustentabilidade ambiental. Os diversos construtores têm apresentado os seus planos no caminho da eletrificação e estão apostados nessa direção. Porém, como vimos anteriormente, em qualquer dos três pontos salientados, os poderes públicos têm também um importante papel a desempenhar, trabalho que, em nossa opinião, não está a acontecer. É isso que, quer a nível europeu, quer a nível nacional, a indústria tem vindo a exigir e vai continuar a fazê-lo.