Ceos #5 Na raiz do preconceito (2020/1)

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SE EXISTE PARTO HUMANIZADO, O OUTRO É DESUMANIZADO? O EMPODERAMENTO DA MULHER EM UM DOS MOMENTOS MAIS IMPORTANTES DE SUA VIDA POR CARLA CARVALHO

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parto humanizado traz muita polêmica dentro do meio médico: se existe parto humanizado, o outro é desumanizado? Quais são as diferenças? A médica obstetra Caroline Chiarelli, atuante nas cidades de Muçum, Encantado e Guaporé (Rio Grande do Sul) é integrante da equipe Maternalle e da Rede Feminista de Ginecologistas e Obstetras, que consiste em um grupo de médicas ginecologistas e obstetras do Brasil todo que luta pelos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Ela explica que, na verdade, o conceito de humanização não existe para anular outro. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, “humanizar o parto é um conjunto de condutas e procedimentos que promovem o parto e o nascimento saudáveis, pois respeita o processo natural e evita condutas desnecessárias ou de risco para a mãe e o bebê”. Em 2018, a OMS emitiu uma série de novas recomendações para estabelecer padrões globais de cuidado para mulheres grávidas e saudáveis, diminuindo assim intervenções médicas desnecessárias. O conceito de parto humanizado possui três grandes pilares: o protagonismo da mulher, atendimento baseado em evidências científicas e uma equipe multidisciplinar. Caroline explica que há uma antiga construção social de que o corpo da mulher não é 8

suficientemente preparado, que o parto é muito doloroso e difícil. Fazer as mães resgatarem esse poder é, segundo a médica, uma tarefa de quem está informando e orientando a mulher sobre os procedimentos. “Devolver o parto para a mulher. Ela é dona do seu parto, ela vai fazer escolhas informadas com apoio de toda equipe que tiver assistindo do puerpério até o parto.[...] Tomar para si novamente a própria natureza feminina que está relacionada ao parto normal”. A mãe Mariângela Barichello Baratto, 27 anos, soube desde sempre que gostaria de ser mãe e queria parto normal. Ela conta que, ao descobrir sua primeira gravidez, em 2018, pesquisou sobre o parto e o protagonismo da mulher durante o processo. Ela vem de uma família de mulheres que pariram naturalmente e, conforme se aproximava do assunto, percebeu que atualmente as coisas não aconteciam dentro da normalidade que conhecia. Mariângela, que é também atual gestante de 5 meses, conta que ficou com medo de sofrer violência obstétrica e de sua opinião não ser respeitada na hora de parir seu próprio filho. “Conforme fui me aprofundando sobre o assunto, fui me empoderando e sentindo segura, mas ao mesmo tempo tive receio da minha opinião não ser respeitada na hora do parto. E foi ali que aprendi

sobre alguns instrumentos: plano de parto, presença da doula e várias coisas que contribuem para que a voz da mulher seja ouvida em trabalho de parto”. O segundo pilar do parto humanizado, a cientificidade, consiste em tudo que é proposto e defendido pela maneira de conduzir um parto, desde um pré-natal até o dia do nascimento, ser sempre baseado em evidências científicas atualizadas. “É um dever do profissional da saúde explicar para a mulher por que a gente está tomando aquela ou outra decisão. É uma decisão com corresponsabilidade da mulher”. Por experiência própria em fazer cesáreas desnecessárias, a médica, que se formou obstetra por se interessar desde criança por partos, afirma que durante o pré-natal há diálogo com a mãe sobre todos os procedimentos que possam ser necessários ao longo do processo, incluindo intervenções. “A maioria das mulheres precisam simplesmente que sejam deixadas em paz e que se respeite o tempo que elas necessitam para passar pelas etapas do parto”. As intervenções são sempre oferecidas e explicadas conforme a necessidade para que o parto possa ocorrer de forma fluida. Isso pode ser uma simples sugestão de mudança de posição, realização de exercícios spinning babies (método que propõe uma sequência de movimentos durante a gestação e trabalho


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