O etanol, a bioeletricidade e a mitigação das mudanças climáticas - OpAA22

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centros de pesquisa e desenvolvimento

os biocombustíveis num planeta ameaçado Biofuel on an endangered planet

Enquanto o mundo desenvolvido move-se a passos de tartaruga, resistindo e empurrando para o futuro distante as necessárias mudanças em seus portfolios de emissões, o Brasil tem um trunfo significativo: é o primeiro e único país do mundo que terá mais de 50% de sua frota de veículos queimando combustíveis renováveis já no início do novo período do acordo climático, em 2012, quando termina Kyoto. Sabemos que esse protagonismo verde não surgiu de preocupações climáticas. O motor flex é certamente uma solução criativa e barata, que permitiu a consolidação do etanol como combustível viável, apesar da natureza oscilante da sua produção. E a indisputável eficiência na produção brasileira de etanol de cana soma-se como argumento tentador para nos vermos seguros no pódio dos vencedores. Mas será que esse ciclo vai durar e consolidar o Brasil como uma Arábia Saudita verde dos combustíveis renováveis? O primeiro problema é uma aritmética de volumes e áreas que não fecha. Enquanto for somente a frota brasileira, parece que teremos terra suficiente, sem ameaçar a Amazônia nem o cultivo de alimentos. Mas, para catapultar os biocombustíveis no combate às emissões em escala mundial, seria necessária a substituição do petróleo, uma possibilidade que demandaria mais terra para cultivo do que existem solos aráveis em toda a Terra. Por conta dessa constatação, muitas vozes se levantaram contra os biocombustíveis. Entretanto, as críticas se concentram na produção e olvidam as tecnologias na ponta do consumo. Os motores de combustão interna a pistão foram inventados há mais de 100 anos, permanecendo inalterados em sua concepção geral. Apesar dos numerosos componentes sofisticados num motor moderno, a eficiência na conversão ainda é abissal: mais de 80% da energia liberada na combustão termina obscenamente dissipada como calor na atmosfera. Compare-se essa eficiência com a de um veículo elétrico: mais de 90% da energia acumulada nas baterias transformam-se silenciosamente em energia cinética de movimento. Dezenas de protótipos alternativos de motores eficientes foram demonstrados ao longo dos anos - cerâmicos sem arrefecimento, radiais com pistões rotativos, de 6 tempos com injeção alternada de água, turbinas, etc. E recentemente, sistemas híbridos, que combinam a tração elétrica (com baterias) a um gerador com pequeno motor a combustão, que permite grandes autonomias, um protótipo do Mini roda 1.500 km com um tanque de gasolina. Ou ainda, o mais eficiente: células de combustível que podem extrair o hidrogênio diretamente do etanol ou gasolina, sem combustão, e produzir eletricidade para alimentar motores elétricos.

While the developed world moves ahead at a turtle’s pace, resisting and postponing to the distant future the necessary changes to its emission portfolios, Brazil holds a significant trump card: it is the first and only country in the world that will have in excess of 50% of its vehicle fleet running on renewable fuel by the time the new climate agreement begins (in 2012, when Kyoto ends). We know that this green role did not result from climate concerns. The "flex" engine is surely a creative and cheap solution, which allowed consolidating ethanol as feasible fuel, notwithstanding the oscillating nature of its production. To the undisputed efficiency of the Brazilian production of ethanol from sugarcane one must add a tempting argument in order to make sure we are safely installed on the winners’ podium. But will this cycle last long enough to consolidate Brazil as a green Saudi Arabia of renewable fuel? The first is an arithmetic problem in which volumes and areas do not match. As long as it is only the Brazilian fleet, it seems we will have sufficient land, without endangering Amazonia or the cultivation of food. But in order to catapult biofuel in the fight against emissions on a world scale, it would be necessary to replace oil, a possibility that would require more land for cultivation than there is tillable land available anywhere on Earth. Due to this fact, many voices spoke out against biofuel. However, criticism is concentrated on the production, while technologies at the consumption end are forgotten. Internal piston driven combustion engines were invented more than 100 years ago, and remain unchanged in their general concept. Notwithstanding the numerous sophisticated components in a modern engine, efficiency in the conversion is still abysmal: more than 80% of the freed energy in the combustion ends up obscenely dissipated as heat into the atmosphere. Let us compare this efficiency with that of an electric vehicle: more than 90% of the accumulated energy in the batteries is silently transformed into kinetic movement energy. Dozens of alternative prototypes of efficient engines have been demonstrated over the years (ceramic without cooling, rotary radial piston, 6-stroke with alternated water injection, turbines, etc.). And recently, hybrid systems appeared, which combine electric traction (battery powered) with a generator equipped with a small combustion engine, that allows for plenty autonomy (a prototype of the Mini ran 1,500 km on a tank of gasoline. Or still, the more efficient: fuel cells that can extract hydrogen directly from ethanol (or gasoline), without combustion taking place, to produce electricity to feed electric motors.

" Para evitar que o bonde da história nos pegue de calças curtas, na condição de obsolescência e inadequação para um novo mercado ultraverde que vem por aí, manda a boa providência que nos antecipemos. Pelo lado de quem produz, o etanol de celulose é só o começo. " Antonio Donato Nobre

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Pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia Researcher of National Research Institute of Amazonia


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