Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro
André Butzke de Almeida
OS SACRAMENTOS DA INICIAÇÃO CRISTÃ na perspectiva querigmático-catequética de jovens e adultos
RIO DE JANEIRO 2018
Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro
OS SACRAMENTOS DA INICIAÇÃO CRISTÃ na perspectiva querigmático-catequética de jovens e adultos
André Butzke de Almeida
Monografia apresentada à Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro (FSB/RJ) como um dos requisitos para obtenção do grau de Bacharel em Teologia. Orientadora: Profa. Dra. Francilaide de Queiroz Ronsi
RIO DE JANEIRO 2018
ALMEIDA, André Butzke de. Os Sacramentos da Iniciação Cristã na perspectiva querigmático-catequética de jovens e adultos. Rio de Janeiro: FSB/RJ, 2018. 49p. Monografia apresentada à Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro como um dos requisitos para obtenção do grau de Bacharel em Teologia. Orientadora: Profa. Dra. Francilaide de Queiroz Ronsi Palavras-chave: sacramento, evangelização, querigma, catequese.
Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro
A Monografia “Os Sacramentos da Iniciação Cristã na perspectiva querigmáticocatequética de jovens e adultos”, apresentada pelo aluno ANDRÉ BUTZKE DE ALMEIDA à Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro (FSB/RJ) como um dos requisitos para obtenção do grau de Bacharel em Teologia foi aprovada, obtendo o grau _______ (_____).
______________________________________________ Profa. Doutora Francilaide de Queiroz Ronsi
Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro
Rio de Janeiro, _____ de ____________ de _______.
Aos meus irmãos do G.O. Tenda do Senhor, família que escolhi para mim, por incentivarem meu crescimento intelectual.
Agradecimentos Ao bom Deus, porque em sua infinita misericórdia me capacitou para esse estudo. A Ele seja toda a honra e toda a glória. À Virgem Santíssima, minha Mãe e Senhora, por toda intercessão e proteção. Ao meu Anjo da Guarda, por sempre me guiar e sustentar no Caminho da Verdade e da Vida. Aos meus Patronos e Intercessores Santo André, São Bento e São João Paulo II, pela intercessão. Aos meus irmãos João Guilherme e Guilherme Emerson, por todo apoio e colaboração nesse estudo. Aos meus irmãos Eurico, Eliane Cristina, João e Pedro, por todo carinho e incentivo. E às amigas Vandeia e Paula, por todos os estudos em grupo, conversas e debates sobre o tema, e obras emprestadas, além de uma fundamental ajuda com a formatação do trabalho.
Ao mestre cabe falar e ensinar; ao discípulo, calar e ouvir. São Bento de Núrsia
RESUMO O presente estudo tem como objetivo fazer uma reflexão a respeito da evangelização proposta pelo Rito da Iniciação Cristã de Adultos (RICA), tendo como base o anúncio do querigma e o estudo do Catecismo da Igreja Católica. Querigma e catequese, como duas faces da mesma moeda, se complementam e permeiam, sendo diferentes em suas ações e similares em seu objetivo. A essência de ambos é apresentar a grande Boa Nova de Jesus, que esteve morto, mas agora vive para sempre (Ap 1, 18) e chama o homem para viver essa vida nova nEle e com Ele. A vida em abundância (Jo 10, 10) proposta pelo Senhor é possível, mas tem exigências próprias de conversão e entrega. Partindo de um ensaio sobre os sacramentos, com foco principal nos três sacramentos da iniciação cristã, procura nos meandres da nova evangelização, proposta pela Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi e pela Exortação Apostólica Catechesi Tradendae, um caminho mais eficaz e eficiente para se alcançar o coração do homem que, pecador por sua natureza, tem a necessidade de Deus e de sua Salvação, Jesus Cristo, vivendo uma nova experiência no poder do Espírito Santo, buscando a santidade proposta pelo próprio Cristo no seu Evangelho (Mt 5, 48).
Palavras-chave: sacramento, evangelização, querigma e catequese.
ABSTRACT The goal of the present study is to reflect on the evangelization proposed by the Rite of Christian Initiation of Adults (RCIA), based on the announcement of the kerygma and the study of the Catechism of the Catholic Church. Kerygma and catechesis, as two sides of the same coin, complement one another and permeate, differing in their actions and similar in their purpose. The essence of both is to present the great Good News of Jesus, who was dead, but now lives forever (Rev 1, 18) and summons men to live this new life in Him and with Him. Life in abundance (John 10, 10) proposed by the Lord is possible, but has its own requirements of conversion and surrender. Starting from an article on the sacraments, with a main focus on the three sacraments of Christian initiation, it seeks in the meanders of the new evangelization proposed by the Apostolic Exhortation Evangelii Nuntiandi and by the Apostolic Exhortation Catechesi Tradendae, a more effective and efficient way to reach the heart of the a man who, sinner by his very nature, has the need of God and His Salvation, Jesus Christ, living a new experience in the power of the Holy Spirit, in search of the holiness proposed by Christ Himself in His Gospel (Mt 5, 48).
Keywords: sacrament, evangelization, kerygma and catechesis.
ABREVIATURAS E SIGLAS CCE – Catechismus Catholicae Ecclesiae CIC – Codex Iuris Canonici CT – Exortação Apostólica Catechesi Tradendae CTAM – Compêndio de Teologia Ascética e Mística DD – Carta Apostólica Dies Domini EdE – Carta Encíclica Ecclesia de Eucharistia EN – Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi FD – Constituição Apostólica Fidei Depositum LG – Constituição Dogmática Lumen Gentium MF – Carta Encíclica Mysterium Fidei RICA – Rito da Iniciação Cristã de Adultos SC – Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium
SUMÁRIO
1 Introdução
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2 OS SACRAMENTOS
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2.1 Os Sacramentos da Igreja
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2.2 Os Sacramentos da Iniciação Cristã
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2.3 Os Sacramentos de Serviço
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2.4 Os Sacramentos de Cura
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3 A INICIAÇÃO CRISTÃ
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3.1 O Batismo
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3.2 A Confirmação
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3.3 A Eucaristia
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4 O QUERIGMA
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4.1 O Amor de Deus
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4.2 O Pecado
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4.3 A Salvação de Jesus
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4.4 A Fé
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4.5 A Conversão
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4.6 O Dom do Espírito Santo
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4.7 A Comunidade Cristã
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5 A CATEQUESE
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5.1 A Profissão de Fé
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5.2 A Celebração do Mistério de Cristo
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5.3 A Vida em Cristo
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5.4 A Oração Cristã
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6 Conclusão
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Referências
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1. Introdução A sociedade contemporânea traz consigo diversos desafios, muitos dos quais sem respostas nem ensaios para que sejam encontradas tais respostas. A Igreja, inserida nessa sociedade, também tem seus desafios. Dentre eles, encontrar caminhos seguros para que o povo de Deus não se perca no meio de tanta novidade que, normalmente, gira em torno de ídolos tão distantes do Deus único e verdadeiro. Como evangelizar o homem do século XXI? Ainda é possível atingir o coração da humanidade com verdades tão antigas e tão atuais? Desde meados do século passado que, através do Concílio Vaticano II, a Igreja tem buscado não novas verdades ou ideias, mas novos métodos e meios para que a Verdade seja reestabelecida em meio a um povo que se afastou e se afasta gradativamente de Deus. O presente trabalho não tem por objetivo dar respostas concretas a essa busca, mas analisar os caminhos já encontrados pelo Magistério Católico. Evangelização e catequese precisam ser repensadas. Não no seu conteúdo, mas nos seus métodos, na sua aplicação, nos seus objetivos. O mundo hodierno roda em torno de números, sejam eles do mercado financeiro ou do censo. Quanto mais, melhor. O foco do homem contemporâneo é lotar espaços, colecionar recordes, ser mais, ser maior, ter fama. Mas, o que esses números todos têm, na verdade, trazido? Solidão em meio a milhares de outras pessoas? Vazios existenciais porque os objetos não suprem as reais necessidades da humanidade? Que necessidade é essa? Deus. O homem tem necessidade de um Deus que também tem necessidade do homem. Este tem por ser incompleto, limitado, imperfeito. Aquele, porque, na sua completude e perfeição, quer se dar ao homem, amar o homem, salvar o homem. Os Sacramentos tornam-se um grande meio pelo qual o Pai, no Filho, pela ação do Espírito Santo, alcança o coração do homem, transforma a sua vida e dá a condição básica para que a humanidade responda com segurança ao chamado inicial de Deus: a santidade. Mas, para que os Sacramentos possam efetuar as obras para as quais foram instituídos, é necessário que os filhos de Deus, através da Igreja, no poder e na fortaleza do Espírito Santo, cumpram sua missão de evangelizar, de atingir o coração dos seus semelhantes, no mais íntimo. O anúncio do querigma torna-se fundamental, mas não um anúncio feito de qualquer maneira. Os métodos e a didática têm que ser adequados ao público. Não se pescam tubarões com isca e anzol, nem se caçam leões com estilingues. A cada missão, de acordo com o público-alvo, há que se estabelecer uma metodologia eficaz, para que a Palavra de Deus não seja lançada fora.
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Nesse aspecto, o Ritual da Iniciação Cristão de Adultos – RICA – traz algumas respostas e indicações de como proceder em ambas as etapas da evangelização: o anúncio e a catequese. Não se trata de mudar o conteúdo, pois a Verdade de Deus é eterna e perene, mas trata-se de como apresentar um Deus desconhecido no meio de um povo cheio de falsos deuses e ídolos. Anúncio e catequese, emissão inicial e eco: conversão e crescimento na fé. Toda a pesquisa desse trabalho foi feita a partir de duas Exortações Apostólicas: Evangelii Nuntiandi e Catechesi Tradendae, em associação com o Catecismo da Igreja Católica e o próprio RICA, acrescidos de outros documentos do Magistério Eclesial e obras referenciadas no meio acadêmico. Essa monografia não tem intenção de esgotar o tema, nem tampouco dar respostas definitivas, como já supramencionado, mas apenas refletir sobre os aspectos da nova evangelização e sua aplicação aos jovens e adultos de uma sociedade que vive longe do seu Criador.
2. Os Sacramentos Os sacramentos são sinais sensíveis, palavras e ações, confiados à Igreja pela sua Cabeça, o Cristo, que os instituiu e por meio dos quais Ele próprio atua, pela ação do Espírito Santo, para a santificação do Seu Corpo. Cada sacramento tem seu ritual e significado, e cada um realiza a graça própria naquele que o recebe. Efetivamente, os sacramentos são a comunicação da graça de Deus através do derramamento do Espírito Santo por Cristo, através das vias instituídas por Ele. Ensina o Catecismo: “Sentado à direita do Pai” e derramando o Espírito Santo em seu Corpo, que é a Igreja, Cristo age agora pelos sacramentos, instituídos por Ele para comunicar sua graça. Os sacramentos são sinais sensíveis (palavras e ações), acessíveis à nossa humanidade atual. (CCE 1084)
Jesus é o Sacramento do Pai. Deus, que é um mistério, se revela em Jesus Cristo, sinal vivo e verdadeiro da sua ação na humanidade, parte de Si. Deus é invisível; ninguém jamais viu a Deus (Jo 1, 18). “Quem me vê, vê o Pai. Como podes dizer: ‘mostra-nos o Pai!’?” (Jo 14, 9). Cristo é o caminho entre o Pai e os homens, ou seja, o sinal, a via pela qual o Pai se dá a conhecer aos homens. Jesus é a comunicação do Pai aos homens, o Mediador. O Sacramento do Pai é destinado à instrução dos homens acerca de Quem Ele representa. O Cristo, Filho do Pai, tem por missão e objetivo sinalizar ao Pai. Enquanto Sacramento, sua geração e envio está no Pai e seu objetivo é apresentar à humanidade o Criador de todas as coisas visíveis e invisíveis. É ensinar que o fim último, que está em Deus, da obra mais perfeita de Deus, que é o homem, está no próprio Deus através do seu Sacramento. A Igreja, por sua vez, é o sacramento de Jesus, o Filho. Fundada por Cristo sobre Pedro, a pedra (Mt 16, 18), a Igreja é o sinal do Divino entre os homens. Assim como Cristo é o Sacramento do Pai e, por isso, aponta para o Pai, a Igreja, sacramento do Filho, que procede do Pai e do Espírito Santo, aponta para o Altíssimo Deus, que é Uno e Trino. A Igreja é sacramento do Filho enquanto é caminho pelo qual os homens podem chegar ao conhecimento e à experiência de Deus. O sacramento do Filho, a Igreja, é o Corpo da sua origem, ou seja, de Cristo. Jesus é a Cabeça da Igreja, seu Corpo, que é instrumento da comunhão entre Deus e os homens. A Igreja é a via pela qual é dispensada aos homens a vida divina. E essa é a missão da Igreja: levar os homens para Deus, à união com Deus, através da ação do Espírito Santo, e santificá-los na Verdade que é o próprio Deus. “Como tu, Pai, estás em mim e eu em ti, que eles estejam em nós” (Jo 17, 21).
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2.1 Os Sacramentos da Igreja
Assim como o Cristo é o Sacramento do Pai e tudo o que Ele faz conduz ao Pai, a Igreja, como sacramento do Filho, pelos méritos desse mesmo Filho e pela ação do Espírito Santo, em comunhão com o Pai, por meio de ritos sensíveis, faz com que a humanidade receba do Filho a condução ao Pai, pela ação do Espírito Santo. Os instrumentos que a Igreja utiliza, instituídos por Cristo, são chamados sacramentos da Igreja. A obra salvífica de sua humanidade santa e santificante é o sacramento da salvação que se manifesta e age nos sacramentos da Igreja. [...] A Igreja contém, portanto, e comunica a graça invisível que ela significa. É neste sentido analógico que ela é chamada de “sacramento”. (CCE 774)
Os sacramentos não têm origem na Igreja, mas no próprio Cristo. Ele os confiou à Igreja para serem ferramentas de santificação dos homens. Por sua vez, os sacramentos são manifestações do amor de Deus, que se ocupa de guiar e instruir o seu povo. Os sacramentos exprimem e fortalecem a fé, produzem frutos naqueles que os recebem. Os sacramentos são as sete ferramentas que o Pai usa, através do Espírito Santo, para curar e transformar os que os recebem, conformando-os com o seu Filho. Eles são: Batismo, Confirmação (Crisma), Eucaristia, Matrimônio, Ordem, Reconciliação (Confissão ou Penitência) e Unção dos Enfermos. Os sete estão dispostos em três grupos: Sacramentos da Iniciação Cristã (Batismo, Confirmação e Eucaristia), Sacramentos de Serviço (Matrimônio e Ordem) e Sacramentos de Cura (Reconciliação e Unção dos Enfermos). Cada um deles com a função de santificar o homem em cada etapa de sua vida, sejam os ordenados à santificação pessoal, sejam à santificação dos outros.
2.2 Os Sacramentos da Iniciação Cristã
Os Sacramentos da Iniciação Cristã, como o próprio nome sugere, são os sacramentos que todo homem iniciado na Fé deve receber. São sacramentos de entrada na Igreja, ministrados por ela, com o aval de Cristo, sua Cabeça, para a iniciação do homem na vida cristã. A Iniciação Cristã é algo que se realiza desde os tempos dos apóstolos, por etapas, e que podem ser percorridas em tempos diferentes, dependendo de cada realidade. Pelos sacramentos da Iniciação Cristã, são lançados os fundamentos da vida e da fé cristãs. A participação na natureza divina que os homens recebem como dom mediante a graça de Cristo, apresenta certa analogia com a origem, o desenvolvimento e a sustentação
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da vida natural. [...] Assim, por efeito destes sacramentos da iniciação cristã, estão em condições de saborear cada vez mais os tesouros da vida divina e de progredir até alcançar a perfeição da caridade. (CCE 1212)
O primeiro dos sacramentos, o Batismo, é a porta de entrada da vida no Espírito e é o que dá acesso aos outros sacramentos. O Batismo é o fundamento de toda a vida cristã; é imersão e regeneração pela água na Palavra, sepultamento do catecúmeno na morte de Cristo, da qual com Ele ressuscita como nova criatura. É o sacramento em que o fiel recebe o Espírito Santo e torna-se membro de Cristo, integra o Corpo de Cristo, que é a Igreja. Pelo Batismo acontece a libertação do pecado original e a regeneração da carne e do espírito de criatura em filho de Deus. “Outrora éreis treva, mas agora sois luz no Senhor: andai como filhos da luz” (Ef 5, 8). (O Batismo) faz-nos partícipes da sua vida e permite-nos viver em conformidade com os seus sentimentos e exemplos, e dessa maneira, alcançar a perfeição cristã. Como decorrência, surge o dever de combater o pecado e suas causas, de aderir a Jesus Cristo e imitar suas virtudes. (CTAM 251)
O sacramento da Confirmação é o sacramento da maturidade na vida cristã; é a consumação da graça batismal. É o sacramento que confirma o Batismo e consolida a graça santificante. Entretanto, o Batismo não é um sacramento que necessita de qualquer tipo de ratificação para tornar-se efetivo. A Confirmação é o sacramento da maturidade espiritual, que não deve ser confundida com a idade adulta do crescimento natural. Na Confirmação, o cristão assume a responsabilidade, outrora assumida pelos seus pais e padrinhos, e recebe a graça e o selo do Espírito Santo; o cristão é revigorado e assume o dever de tomar parte na vida da Igreja. A Confirmação torna-nos soldados de Cristo. Adiciona à graça batismal uma graça especial de fortaleza, para que possamos professar generosamente a fé diante de todos os inimigos e, especialmente, contra o respeito humano, que é causa de tão grande número de homens deixar de praticar os deveres religiosos. (CTAM 252)
A Eucaristia é o Sacramento por excelência; é fonte e ápice de toda a vida cristã (SC 10). É o tesouro mais precioso dado à humanidade através da Igreja, pelo Espírito Santo, em comunhão com o Pai. A Eucaristia é o próprio Cristo que se faz Pão para se dar em alimento ao seu povo. Ela contém todo o bem espiritual da Igreja, porque é o próprio Deus, em Corpo, Sangue, Alma e Divindade. E, em comunhão com o Filho, por ser Deus, recebemos o Pai e o Espírito Santo. É chamada também Comunhão, porque é nela que o cristão se faz um com seu Senhor, o Cristo, do qual ele é parte do Corpo, a Igreja, por graça concedida pelo mesmo Cristo, no Espírito e no Pai.
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A Eucaristia nutre nossa alma, que, como o corpo, tem necessidade de alimento para viver e fortalecer-se. Porém, para sustentar uma vida divina é preciso um alimento divino e este é o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo, sua alma e divindade, que nos transforma em outros Cristos, comunicando-nos o seu modo de ser, seus sentimentos e virtudes, e especialmente seu amor a Deus e aos homens. (CTAM 253)
2.3 Os Sacramentos de Serviço
Os sacramentos do Matrimônio e da Ordem são sacramentos ordenados para a salvação de outros. Se são úteis para a salvação pessoal, acontece quando vividos para o que estão ordenados, ou seja, no serviço de outros. Os varões são consagrados pelo sacramento da Ordem para serem imagem do próprio Cristo; os esposos, através do Matrimônio, são consagrados e fortalecidos para cumprir dignamente os deveres pertinentes à vida matrimonial cristã. Conferem uma missão particular na Igreja e servem para a edificação do Povo de Deus. Nesses sacramentos, os que já foram consagrados pelo Batismo e pela Confirmação para o sacerdócio comum de todos os fiéis podem receber consagrações específicas. (CCE 1534-1535)
O sacramento do Matrimônio é a aliança entre homem e mulher, pela qual constituem entre si uma comunhão para toda vida. O amor conjugal dirige-se a uma união profundamente pessoal, conduz senão a fazer dos que recebem o sacramento um só corpo e uma só alma (Gn 2, 24). Purifica e consolida as características normais de todo amor conjugal; eleva-as a ponto de torná-las a expressão dos valores propriamente cristãos. Através do sacramento do Matrimônio, os esposos se habilitam a testemunhar e representar a fidelidade de Cristo à sua Igreja no seu relacionamento. Para santificar a família, célula primordial da sociedade, o sacramento do Matrimônio dá aos cônjuges as graças que mais necessitam: a da fidelidade absoluta e constante, tão difícil para o coração inconstante do homem; a da santidade do leito conjugal, apesar das solicitações contrárias da concupiscência; a de se consagrarem com inalterável devoção à educação cristã dos filhos. (CTAM 257)
O Código de Direito Canônico apresenta essa aliança entre homem e mulher como um pacto por toda a vida: O pacto matrimonial, pelo qual o homem e a mulher constituem entre si o consórcio de toda a vida, por sua índole natural ordenado ao bem dos cônjuges e à geração e educação da prole, entre batizados foi por Cristo Senhor elevado à dignidade de sacramento. (CIC 1055 §1)
Já o ministério ordenado, ou seja, o grupo constituído de homens varões que receberam o sacramento da Ordem, está a serviço do povo de Deus. Através deste sacramento, o homem é transformado em elo sacramental entre a ação litúrgica da Igreja, operada pelo Espírito Santo,
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àquilo que fizeram e disseram os apóstolos, ao que disse e fez o próprio Cristo, fonte e fundamento dos sacramentos da Igreja. Através do sacramento, tornam-se responsáveis por guiar o povo para Deus. São ministros da Igreja. Portanto, são os responsáveis por levar o povo ao encontro com Deus através da Liturgia, da Palavra de Deus e da vida sacramental. A Ordem confere aos ministros da Igreja não somente poderes maravilhosos para consagrar a Eucaristia, administrar os sacramentos e pregar a doutrina evangélica, mas também a graça de exercê-los santamente. Em especial, dá-lhes um ardente amor para com o Deus da Eucaristia e para com as almas e, ainda, uma vontade firme de imolarse e consumir-se inteiramente por essas duas nobres causas. (CTAM 256)
Esse sacramento tem caráter indelével por instituição divina e, como diz o Direito Canônico, é essencialmente para o serviço do povo do Deus: Mediante o sacramento da ordem, por divina instituição, alguns de entre os fiéis, pelo caráter indelével com que são assinalados, são constituídos ministros sagrados, e assim são consagrados e delegados a servir, segundo o grau de cada um, com título novo e peculiar, o povo de Deus. (CIC 1008)
2.4 Os Sacramentos de Cura
Os sacramentos de Cura, Reconciliação e Unção dos Enfermos, foram instituídos afim de que nessa peregrinação terrestre o homem pudesse experimentar a misericórdia de Deus. Esses sacramentos, assim como todos os outros, com exceção do Batismo, são para todo o Corpo de Cristo, a Igreja. Tendo ciência de que o homem peca e que o pecado é uma privação do Divino, o Senhor, por meio da sua Igreja, dá, pela ação do Espírito Santo, meios eficazes para a salvação das almas. Meios esses que seus ministros ordenados usam, em nome da Igreja, para cuidar, instruir e regenerar todo o povo de Deus, que se reconhece necessitado de misericórdia e atualização da Graça. O Senhor Jesus Cristo, médico de nossas almas e de nossos corpos, que remiu os pecados do paralítico e restituiu-lhe a saúde do corpo, quis que sua Igreja continuasse, na força do Espírito Santo, sua obra de cura e de salvação, também junto de seus próprios membros. É esta a finalidade dos dois sacramentos de cura: o sacramento da Penitência e o sacramento da Unção dos Enfermos. (CCE 1421)
O sacramento da Reconciliação é exatamente o que o nome sugere: reconciliação com Deus, pois o homem pecou e peca. O pecado, por ser uma negação de Deus, um ato pessoal e decisão da vontade, necessita de um ato de conversão, de mudança, para que haja o perdão: uma aceitação, um ato pessoal e decisão de, diante do ministro ordenado, na pessoa do próprio Cristo, admitir as faltas cometidas contra Deus e o próximo. E, assim, mediante um sincero
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arrependimento, receber o dom do Espírito Santo através da absolvição ofertada por Cristo através das palavras – fórmula própria – proferida pelo ministro. Se tivermos a infelicidade de perder a vida da graça pelo pecado mortal, o Sacramento da Penitência lavará as nossas faltas no Sangue de Jesus Cristo, cuja virtude nos é aplicada pela absolvição, contanto que estejamos sinceramente contritos e resolvidos a romper com o pecado. (CTAM 254)
Pelo sacramento da Unção dos Enfermos, a Igreja entrega, através da oração do ministro ordenado, o enfermo aos cuidados do Senhor da vida, que sofreu, morreu e ressuscitou. A doença pode levar à angústia, desespero ou à atitude de fechar-se sobre si mesmo; mas, também, levar à proximidade ou retorno a Deus. É o sacramento destinado a reconfortar os que são provados pela enfermidade. Como todos os sacramentos, a Unção dos Enfermos é uma celebração litúrgica e comunitária. Quando a morte bate a nossa porta, temos necessidade de consolo diante, tanto das angústias e temores que trazem as lembranças das faltas passadas, como das enfermidades presentes e dos juízos de Deus. A Unção dos Enfermos, ao derramar o óleo santo sobre os nossos principais sentidos, derrama também na alma uma graça de alívio e conforto espiritual, que nos livra do que restou do pecado, reanima a confiança. (CTAM 255)
A graça de Deus, pela sua misericórdia derramada nos sacramentos de cura, é um movimento tanto de retorno ao próprio Deus como de alívio e consolação. A alma que sofre, seja pela ferida do pecado ou pela dor de uma enfermidade, ao ser alcançada pela misericórdia de Deus, se volta ao seu Criador e cumpre seu desígnio primeiro que é estar na presença do Senhor, em adoração e louvor. Deus nunca desistiu do homem. E os sacramentos da Reconciliação e da Unção dos Enfermos são provas latentes dessa insistência por parte do Altíssimo.
3. A Iniciação Cristã
Após o nascimento da Igreja, que se dá com o derramamento do Espírito Santo, promessa do Pai através do Filho, no dia de Pentecostes, a mensagem do Evangelho passa por uma expansão além do território de onde fora inicialmente pregado. Atinge Roma, o centro do Império Romano, ainda no século I. Os cristãos logo começam a ser perseguidos e nasce, entre eles, uma suprema identificação com o Senhor, que é vivida com o derramamento do próprio sangue. No início do século IV, a Igreja ganha liberdade de culto e as graças do Imperador. O querigma é a transmissão do âmago da mensagem de Cristo, do seu Evangelho, com o intuito de converter os que não são cristãos. O testemunho é a forma mais eficaz de evangelização. É o anúncio fundamental. Os que ouviram esse anúncio através de Pedro acreditaram e muitas foram as conversões. Os passos que desencadearam a iniciação à vida cristã na Igreja dos primeiros séculos são: testemunho, anúncio, conversão, fé e Batismo. A vida das comunidades cristãs do início da Igreja firmava-se basicamente sobre o querigma e a catequese, a celebração da fração do pão, a oração e a vida prática na comunhão de almas e corações. A catequese e a vida prática comunitária eram inseparáveis. E toda a comunhão levava, inclusive, à venda dos bens e disposição do dinheiro em favor da comunidade, para que fosse dado a cada um conforme sua necessidade, sob orientação dos Apóstolos, como se lê no livro de Atos: A multidão dos que haviam crido era um só coração e uma só alma. Ninguém considerava exclusivamente seu o que possuía, mas tudo entre eles era comum. Com grande poder os apóstolos davam o testemunho da ressurreição do Senhor, e todos tinham grande aceitação. Não havia entre eles necessitado algum. De fato, os que possuíam terrenos ou casas, vendendo-os, traziam os valores das vendas e os depunham aos pés dos apóstolos. (At 4, 32-34)
Sendo o Batismo a porta de entrada para a comunidade cristã, desenvolveu-se o "Credo", ou "Símbolo da Fé", que se tornou conteúdo básico na catequese para a vida cristã. Não só a catequese – o eco do querigma –, mas as práticas de conversão para a vida nova em Cristo: práticas oracionais, ascéticas e obras de misericórdia. Já eram sabedores de que essas práticas eram boas e frutuosas para a vida no Espírito, contribuíam para o fervor na oração, tão necessário. O fervor fará dilatar ainda mais a nossa alma, pois, afinal de contas, o fervor é somente uma disposição generosa de nada recusar a Deus, de deixá-lo agir com a plenitude da sua virtude e de colaborar com Ele com todas as forças. Essa disposição aprofunda e dilata a nossa alma, torna-a mais apta às efusões da graça, mais dócil à ação do Espírito
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Santo, mais pronta a corresponder-lhe. Dessa mútua colaboração brotam frutos abundantes de santificação. (CTAM 260, B, b)
Um membro da comunidade assumia a responsabilidade (apadrinhava) sobre um convertido ou simpatizante da fé ao apresentá-lo à autoridade: um Bispo, presbítero ou diácono. Tornava-se responsável pelo seu acompanhamento e preparação para receber os sacramentos da iniciação cristã: Batismo, Confirmação e Eucaristia. Essa prática era denominada "catecumenato". O tempo de preparação variava de um a três anos. Na Quaresma, iniciava-se a preparação imediata. E na Vigília Pascal, recebiam-se os três sacramentos. Havia a oração de santificação sobre as águas batismais, invocando o Espírito Santo; logo após, a afirmação de uma renúncia ao demônio; depois, um tríplice interrogatório e a profissão de fé, com as suas submersões e imersões. Após o Batismo, havia a unção com o óleo do Crisma, selo com a cruz e a imposição das mãos, pedindo e invocando o Espírito Santo para uma bênção. Após a Confirmação, o neófito (renascido) recebia a Eucaristia.
3.1 O Batismo
O Batismo, cujo sinal original e pleno é a imersão, significa a descida do cristão ao túmulo e seu sepultamento com Cristo na morte, afim de que com Ele também ressurja para uma vida nova. O Batismo é, de maneira especial, a porta de entrada da vida da fé, da vida cristã. Assim como todos os outros sacramentos, é vínculo sagrado que o une a todos e o incorpora a Cristo. Toda a vida cristã traz a marca do amor esponsal de Cristo e da Igreja (CCE 1617). Chamado também de Santo Batismo, ele é o fundamento dessa vida cristã. É a regeneração do homem como filho de Deus, libertando-o do pecado e da morte. É denominado Batismo com base no rito central pelo qual é realizado: batizar significa mergulhar. Portanto, o Batismo é o mergulho inicial no Mistério de Deus, que é plenamente vivido e experimentado na Eucaristia. Todas as prefigurações da antiga aliança encontram sua realização em Jesus Cristo: a travessia do Mar Vermelho é um sinal da vitória de Cristo, e também do Batismo (CCE 117); a circuncisão de Jesus, no oitavo dia depois de seu nascimento, é sinal de sua inserção na descendência de Abraão; este também é um sinal do Batismo. O dilúvio e a arca de Noé também prefiguram a salvação pelo Batismo, a renovação ou regeneração, vida nova pela água. Desde a origem do mundo, a água é a fonte da vida e da fecundidade. O Batismo também é prefigurado na travessia do Jordão, pela qual o povo de Deus recebe o dom da terra prometida
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à descendência de Abraão, imagem da vida eterna. Após sua ressurreição, Cristo confere a missão de batizar aos Apóstolos. Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. E eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos! (Mt 28, 19-20)
Assim como pelas águas Deus fez nova a face da Terra com o dilúvio, pelas águas batismais, Deus faz nova a alma do homem, transforma a criatura em um verdadeiro filho seu, imprimindo em sua alma seu selo indelével, infundindo o Espírito Santo, seu Dom. Assim como o Mar Vermelho, águas salgadas que significavam morte, foi atravessado, assim o Cristo atravessa da morte para a vida com a sua ressurreição e faz com que da morte nasça para a vida o mais novo membro de seu Corpo, a Igreja, através do gesto de imergir e emergir. Tradicionalmente, o rito do Batismo é realizado no batistério. Essencialmente, esse rito consiste em mergulhar na água o candidato ou em derramar água sobre sua cabeça, pronunciando a invocação da Santíssima Trindade, isto é, do Pai, do Filho e do Espírito Santo. O significado e a graça do sacramento do Batismo aparecem com clareza nos ritos de sua celebração. O sinal-da-cruz no limiar da celebração, assinala a marca de Cristo naquele que vai pertencer-lhe e significa a graça da redenção que Cristo nos proporcionou por sua cruz. O anúncio da Palavra de Deus ilumina com a verdade revelada os candidatos e a assembleia, e suscita a resposta da fé, inseparável do Batismo. Com efeito, o Batismo é de maneira especial “o sacramento da fé”, uma vez que é a entrada sacramental na vida de fé. (CCE 1235-1236)
Os ministros do Batismo são os mesmos que os responsáveis pela ministração dos outros sacramentos da Igreja, ou seja, os ministros ordenados. São eles: o Bispo e o presbítero, e, na Igreja latina, também o diácono. Em caso de real necessidade, qualquer pessoa, mesmo que não tenha recebido o sacramento do Batismo, pode batizar, desde que tenha a intenção de fazer o mesmo que a Igreja faz, e utilize a fórmula batismal trinitária, com o derramamento de água sobre a cabeça do candidato. Toda pessoa não batizada pode receber o Batismo, independentemente da idade. Contudo, caso seja adulto, terá de passar por uma preparação para receber o sacramento do Batismo. Sendo iniciação à fé e à vida cristã, deverá recebê-lo também com a Confirmação e a Eucaristia. Trata-se de uma formação à vida cristã integral. Os catecúmenos devem ser iniciados nos mistérios da salvação pela prática de uma autêntica vida evangélica.
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Os catecúmenos “já estão unidos à Igreja, já pertencem à casa de Cristo, não sendo raro levarem uma vida de fé, esperança e caridade”. A mãe Igreja já os envolve como seus em seu amor, cercando-os de cuidados. (CCE 1249)
A Igreja é necessária para a salvação. O único mediador e caminho da salvação é Cristo; Ele é o fundador da Igreja, seu Corpo, da qual Ele é a Cabeça. A entrada no mistério da salvação, na peregrinação, é o sacramento do Batismo. Não podem ser salvos os que, conhecendo, ignoram ou renunciam à Igreja fundada por Deus. Diferentemente daqueles que, sem conhecer a salvação de Cristo através da sua Igreja, buscam o Bem e as boas obras. Aqueles, porém, que sem culpa ignoram o Evangelho de Cristo e sua Igreja, mas buscam a Deus com coração sincero e tentam, sob o influxo da graça, cumprir por obras a sua vontade conhecida por meio do ditame da consciência podem conseguir a salvação eterna. (LG 16)
Um dos efeitos do Batismo é selar o cristão com um sinal espiritual indelével de sua pertença a Cristo – imprime caráter. Nenhum pecado pode apagar esta marca, se bem que possa impedir o Batismo de produzir frutos salvíficos. Não há rebatismo. O Batismo é único e tem por efeito, também, a remissão do Pecado Original e de todos os pecados pessoais. É verdadeiramente um nascimento para uma vida nova, livre em Deus. Pela obediência de um só, Cristo, o novo Adão, todos são salvos.
3.2 A Confirmação O sacramento da Confirmação – ou Crisma – é a consumação da graça batismal. Por ele, há uma vinculação mais perfeita do homem à Igreja de Cristo, o que faz com que o fiel esteja mais estritamente obrigado à fé. A partir da recepção desse sacramento, o crismado é fortalecido com uma força especial do Espírito Santo e se torna uma verdadeira testemunha de Jesus e da sua Igreja, a quem deve difundir e defender tanto por obras quanto por palavras (CCE 1285). A Crisma faz do fiel um soldado de Cristo. Da mesma forma que o sacramento do Batismo, a Confirmação imprime caráter e só pode ser recebida uma única vez. Esse caráter porta-se como um selo espiritual que reveste o homem da fortaleza do Espírito Santo. Adolphe Tanquerey, no seu Compêndio de Teologia Ascética e Mística, define de forma clara e objetiva o que é o Sacramento da Confirmação: A Confirmação torna-nos soldados de Cristo. Adiciona à graça batismal uma graça especial de fortaleza, para que possamos professar generosamente a fé diante de todos os inimigos e, especialmente, contra o respeito humano, que é a causa de tão grande número de homens deixar de praticar os deveres religiosos. É para isso que nesse momento os dons do Espírito Santo, que já haviam sido recebidos no Batismo, são-
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nos conferidos de modo especial, para iluminar a nossa fé, para fazê-la mais viva e penetrante, e também para fortalecer a nossa vontade contra todas as quedas. Disso deriva a necessidade de cultivar os dons do Espírito Santo, especialmente os que nos fazem cristãos militantes. (CTAM 252, b)
Desde o Antigo Testamento, o Espírito Santo é profetizado e viria sobre o Messias para que Ele pudesse cumprir sua missão salvífica (CCE 1286). Tendo sua vida absolutamente vivida em plena comunhão com o Espírito Santo, desde a sua concepção, ao receber esse mesmo Espírito no seu Batismo (Jo 3, 34), Jesus mostrava que o Pai lho dava sem limites. A plenitude do Espírito no Cristo era a fortaleza que, enquanto homem, Ele precisava para cumprir sua missão em obediência ao Pai. E, mediante o envio do Senhor aos seus apóstolos, para que fossem e pregassem o Evangelho a toda criatura (Mc 16, 15), era mister que o mesmo Espírito que repousava sobre o Cristo também fosse enviado a toda a comunidade cristã, pois não há evangelização sem a força e o poder do Espírito Santo (EN 75). Força e poder que foram derramados sobre a Igreja nascente no dia de Pentecostes e que impulsionaram os apóstolos a saírem do local em que estavam e pregassem o anúncio da morte e ressurreição de Jesus (At 2). A unção, no simbolismo bíblico e antigo, é rica de significados: o óleo é sinal de abundância e de alegria, ele purifica (unção antes e depois do banho) e torna ágil (unção dos atletas e lutadores), é sinal de cura, pois ameniza as contusões e as feridas, e faz irradiar beleza, saúde e força. (CCE 1293)
Desde os primeiros séculos, a Igreja utilizou-se da imposição das mãos para a transmissão do Espírito Santo como forma de unção (At, 10, 38). Delegava esse poder àqueles que eram mandados em missão, como apóstolos, soldados de Cristo. Juntou-se a esse gesto, um óleo perfumado – o Crisma – para que o agora soldado de Cristo pudesse exalar o odor de Deus e levar sua Palavra e doutrina. Ser ungido pelo Espírito Santo é participar da mesma missão de Jesus. O Crisma, o óleo perfumado da Confirmação, é consagrado pelo Bispo na Quinta-feira Santa durante a Missa do Crisma. Ele é o único óleo consagrado; os outros dois, o óleo dos catecúmenos e o óleo dos enfermos, são apenas abençoados. Essa diferenciação se dá por conta da sua própria missão e uso: enquanto esses são usados para abençoar e trazer alívio, aquele traz consigo o poder de envio do Espírito Santo, que fortalece o enviado. Na praxe do Rito Romano, a Confirmação é ministrada em separado do Batismo. O comum é que o fiel seja batizado ainda criança, bem cedo, postergando a Confirmação para a adolescência ou uma idade mais adulta. Por esse motivo, a liturgia sacramental da Confirmação se inicia com a renovação das promessas do Batismo e com a profissão de fé dos confirmandos,
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o que clarifica que a Confirmação é uma sequência natural do Batismo. No caso do Batismo de adultos, a Crisma é ministrada sequencialmente ao Batismo, como acontecia nos primeiros séculos da Igreja, sendo admitido, em seguida, à recepção da Sagrada Eucaristia. Durante o ritual da Confirmação, o Bispo invoca a Efusão do Espírito Santo sobre todos aqueles que serão confirmados em breve. Após esse momento, segue-se a unção individual de cada fiel, conforme indica o Catecismo: No rito latino, o sacramento da Confirmação é conferido pela unção do santo crisma na fronte, feita com a imposição da mão, e por estas palavras: ‘N, recebe, por este sinal, o Espírito Santo, o dom de Deus’. [...] O ósculo da paz, que encerra o rito do sacramento, significa e manifesta a comunhão eclesial com o Bispo e com todos os fiéis. (CCE 1300-1301)
Tanto no Oriente quanto no Ocidente, o Bispo é o ministro ordinário da Confirmação (LG 26). Na Igreja oriental, quando ocorrem na mesma cerimônia o Batismo e a Confirmação, é o próprio presbítero batizante que administra também a Confirmação. Mas, como já apresentado anteriormente, o faz com o óleo do Crisma consagrado pelo Patriarca ou pelo Bispo. Já na Igreja latina, apenas o Bispo pode administrar esse sacramento, exceto em caso de extrema necessidade, quando ele pode conceder essa faculdade aos presbíteros também. Em casos extremos, como perigo de morte, todo e qualquer presbítero pode dar a Confirmação, como indica o Direito Canônico: O ministro ordinário da confirmação é o Bispo; administra validamente este sacramento também o presbítero que tem essa faculdade em virtude do direito universal ou de concessão especial da autoridade competente. Pelo próprio direito gozam da faculdade de administrar a confirmação: [...] 3.º quanto aos que se acham em perigo de morte, o pároco e até qualquer presbítero. (CIC 882-883)
Todo e qualquer batizado que tenha atingido a idade da razão e ainda não tenha sido confirmado pode e deve receber o sacramento da Confirmação (CCE 1306). Para recebê-lo, é preciso estar em estado de graça, ou seja, sem nenhum pecado mortal. A purificação se faz necessária em vistas não apenas da salvação, que já não seria coisa pequena, mas em vista do próprio Dom do Espírito Santo. Não se pode receber tão distinto hóspede em morada suja e sem cuidados. Esse sacramento faz parte dos chamados Sacramentos da Iniciação Cristã, e não ser confirmado implica em não ter sua iniciação na caminhada da fé completa. Isso não invalida de forma alguma o Batismo, que tem sua validez e eficácia em si mesmo, mas deixa inacabada a iniciação cristã. Por ser tido como o sacramento da maturidade cristã, há que se diferenciar esta da maturidade biológica. Santo Tomás de Aquino o afirma:
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A idade do corpo não constitui um prejuízo para a alma. Assim, mesmo na infância, o homem pode receber a perfeição da idade espiritual da qual fala o livro da Sabedoria (4, 8): ‘Velhice venerável não é longevidade, nem é medida pelo número de anos”. Assim é que muitas crianças, graças à força do Espírito Santo que haviam recebido, lutaram corajosamente e até o sangue por Cristo. (CCE 1308)
A Confirmação é uma efusão especial do Espírito Santo (CCE 1302) e produz no confirmado o crescimento e o aprofundamento da graça batismal (CCE 1303). Outros efeitos podem ainda ser observados como um estreitamento na relação com o Pai, maior união com Cristo e sua Igreja, um aumento considerável na ação do Espírito Santo com seus dons e carismas, além da força especial vinda do mesmo Espírito para testemunhar Jesus vivo e ressuscitado. A preparação para a Confirmação deve ser feita de forma integral, madura e sólida, e visar conduzir o confirmando a uma união mais íntima com Jesus Cristo (CCE 1309). Desde seu começo, deve buscar trazer o fiel para Deus e dar bases que inicie um relacionamento profundo com o Criador, através do seu Filho, no poder do Espírito Santo. Antes da etapa catequética, apresenta-se um tempo de conversão através da evangelização querigmática. O RICA – Rito da Iniciação Cristã de Adultos – apresenta um itinerário seguro que versa em torno da tríplice etapa: querigma (instituição dos catecúmenos) – catequese (eleição) – sacramento (celebração). Nesse itinerário, além do tempo de informação e amadurecimento, há etapas ou passos, pelos quais o catecúmeno, ao caminhar, como que atravessa uma porta ou sobre um degrau: a) verifica-se a primeira etapa quando, aproximando-se de uma conversão inicial, quer tornar-se cristão e é recebido como catecúmeno pela Igreja; b) a segunda quando, já introduzido na fé e estando a terminar o catecumenato, é admitido a uma preparação mais intensiva para os sacramentos; c) a terceira quando, concluída a preparação espiritual, recebe os sacramentos de iniciação cristã. (RICA 6)
3.3 Eucaristia
O sacramento da Eucaristia é a fonte e o ápice de toda a vida cristã (LG 11). O homem batizado, rei, profeta e sacerdote, e confirmado, revestido da fortaleza do Espírito Santo para ser soldado de Cristo, encontra na Eucaristia o alimento que o sustenta para a caminhada. A Eucaristia é o Sacramento dos sacramentos, pois todos os demais apontam para ela e dela tiram todo o seu bem espiritual, pois a Eucaristia dá a graça e, também, o Autor da graça, Jesus Cristo. A Igreja vive da Eucaristia (EdE 1). E isto não é apenas uma verdade de fé, nem uma experiência diária de fé, mas é o núcleo do mistério da Igreja. Jesus prometeu estar com o homem até os finais dos tempos (Mt, 28, 20). E a Eucaristia é essa presença real do Senhor no
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meio do seu povo. A conversão do pão e do vinho no Corpo e no Sangue de Cristo é o cumprimento perfeito da promessa de Jesus. Desde o início da Igreja, em Pentecostes, que a Eucaristia marcou o ritmo da marcha da Igreja rumo a Pátria Celeste. A Eucaristia, presença salvífica de Jesus na comunidade dos fiéis e seu alimento espiritual, é o que de mais precioso a Igreja pode ter em seu caminho ao longo da história. Assim se explica a cuidadosa atenção que ela sempre reservou ao mistério eucarístico, uma atenção que sobressai com autoridade no magistério dos concílios e dos sumos pontífices. (EdE 9)
Eucaristia significa ação de graças. É agradecimento a Deus por tamanha graça de se fazer tão próximo do homem. Também significa a Ceia do Senhor em memória daquela que Jesus tomou com seus discípulos às vésperas de sua paixão. É ainda a Fração do Pão como recordação do gesto do Senhor em repartir o pão com os seus na ceia derradeira, além de ter sido o gesto pelo qual seus discípulos o reconheceram no caminho de Emaús. Outros termos ainda definem o que é a Eucaristia: assembleia eucarística, memorial da paixão e da ressurreição do Senhor, santo sacrifício, santa e divina liturgia, comunhão e santa missa. Contudo, tudo remete à presença sacramental do Cristo no meio do seu povo: diversos termos, diversos nomes, um só Deus e Senhor, um só milagre, uma só presença real. A Eucaristia foi prefigurada em diversas passagens bíblicas. Logo no Antigo Testamento, “Melquisedec, rei de Salém, trouxe pão e vinho; ele era sacerdote do Deus Altíssimo” (Gn 14, 18); os judeus comeram pães sem fermento (Ex 12, 15). Já no Novo Testamento, o primeiro milagre de Jesus foi numa festa de casamento, transformando a água em vinho (Jo 2, 2-10) por intercessão de sua Mãe, Maria. Já no milagre da multiplicação dos pães (Mt 14, 14-20), Jesus prefigurou a abundância sem igual que seria seu Corpo na Eucaristia. Em outra ocasião, o Senhor exortou o povo a trabalhar não por um pão que alimenta somente o corpo, mas um pão que permanece até a vida eterna (Jo 6, 27). Alimento esse que Ele mesmo dará à humanidade; um alimento que o Pai marcou com seu selo. Mais adiante, o Senhor revela que pão é esse, ou, melhor, Quem é esse pão: “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim, nunca mais terá fome, e o que crê em mim nunca mais terá sede” (Jo 6, 35). A Eucaristia, como Sacramento dos sacramentos, ganha uma importância diferenciada na responsabilidade dos fiéis batizados na Igreja. “A celebração dominical do Dia e da Eucaristia do Senhor está no coração da vida da Igreja” (CCE 2177). Era no dia da Ressurreição que os fiéis se reuniam para celebrar a Eucaristia. Estes são obrigados a participar da Eucaristia dominical e nos dias de preceito. Contudo, aos que são impedidos por motivos muito sérios, não há pecado em não participar nos dias em que a Igreja determinar.
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No domingo e nos outros dias de festa de preceito, os fiéis têm a obrigação de participar da missa; além disso, devem abster-se das atividades e negócios que impeçam o culto a ser prestado a Deus, a alegria própria do dia do Senhor e o devido descanso da mente e do corpo. Satisfaz ao preceito de participar da missa quem assiste à missa em qualquer lugar onde é celebrada em rito católico, no próprio dia da festa ou na tarde do dia anterior. (CIC 1247-1248)
A liturgia da Eucaristia consiste, basicamente, em dois momentos que formam uma unidade perfeita: a liturgia da Palavra e a liturgia Eucarística. Numa, ouve-se a Palavra do Senhor aplicada para determinado tempo, celebração, visando, sempre, a maior glória de Deus; noutra, contempla-se a realização miraculosa da transubstanciação, em que o pão se torna Corpo e o vinho, Sangue de Cristo. Na transubstanciação, acontece algo único: altera-se a natureza sem se alterar a forma. É Corpo com gosto e aparência de pão, e Sangue com gosto e aparência de vinho. É Deus envolto em um mistério. Convém recordar primeiramente aquilo que é, por assim dizer, a síntese e o ponto mais sublime desta doutrina: que no mistério eucarístico é representado de modo admirável o sacrifício da cruz, consumado uma vez para sempre no Calvário; e que nele se relembra perenemente a sua eficácia salutar na remissão dos pecados que todos os dias cometemos. (MF 27)
Os únicos ministros da Eucaristia são os ministros ordenados no segundo ou terceiro graus da ordem: os presbíteros e os Bispos. Não há exceção para a celebração do mistério do próprio Divino. Apenas eles podem presidir a celebração eucarística. Apesar de existirem outros que são também chamados de ministros, que são os Ministros Extraordinários da Sagrada Comunhão, nenhuma autoridade concedida por Deus ou pela Igreja têm para celebrar o mistério eucarístico. A Eucaristia deve ser celebrada pelo ministro no Altar e utilizando de pão e vinho. Somente o sacerdote validamente ordenado é o ministro que, fazendo as vezes de Cristo, é capaz de realizar o sacramento da Eucaristia. Celebra licitamente a Eucaristia o sacerdote não impedido por lei canônica. (CIC 900)
Todos os fiéis batizados devidamente preparados podem receber a Eucaristia; contudo, deve-se observar os impedimentos para tal. Para receber o Cristo, é necessário ser obediente à sua Igreja. Logo, deve-se observar as normas que a Doutrina prescreve para melhor viver comunitariamente esse Mistério. Não se pode estar em pecado grave (ou mortal), que corta o laço com Deus, deve-se observar o jejum eucarístico – de 1 hora – e a confissão periódica, como minimamente prescreve a Igreja. A Eucaristia é o centro da vida cristã, é a fonte de onde jorra a graça do Senhor, é o próprio Senhor no mistério da Trindade. Desta forma, não há vida cristã católica sem a Eucaristia porque, sem ela, toda a fé perde o sentido, as orações perdem o sabor, o homem perde
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o rumo de si mesmo, que está contido no Altíssimo Deus. A vida sacramental é necessária para o amadurecimento na fé e no conhecimento de Deus. O Senhor realiza sua obra no homem que procura ser fiel a Ele nos sacramentos e no viver os valores evangélicos, segundo a orientação da Igreja. A conversão parte de uma decisão e é um processo pessoal e experimental, como apresenta o Catecismo: A conversão e a penitência cotidiana encontram sua fonte e seu alimento na Eucaristia, pois nela se torna presente o sacrifício de Cristo que nos reconciliou com Deus; por ela são nutridos e fortificados aqueles que vivem da vida de Cristo: ‘ela é o antídoto que nos liberta de nossas faltas cotidianas e nos preserva dos pecados mortais’. (CCE 1436)
A Eucaristia é, portanto, o Pão da Vida que regula a vida do homem através do Espírito Santo numa transformação que, antes, acontece dentro e transborda para fora em atos de amor, porque Deus é amor e não pode deixar de amar e fazer o homem mais semelhante a Si mesmo, ou seja, através de manifestações de amor.
4. O Querigma
Evangelizar não se trata apenas de anunciar Cristo, mas também estabelecer um ambiente e uma estrutura que sejam tão evangélicas que possam proporcionar a vivência do amor entre as pessoas. Portanto, evangelizar não é anunciar uma salvação individual, mas que Deus quis formar um povo, uma Igreja, para que todos sejam salvos enquanto comunidade. A salvação integral só acontece quando todos os homens, seus ambientes e estruturas, forem renovados pelos valores do Evangelho e dirigidos pelo poder do Espírito Santo. Nesse processo de evangelização, distinguem-se claramente dois momentos sucessivos, complementares e interdependentes, porém diferentes: o querigma e a catequese. O querigma é a primeira etapa, o primeiro anúncio. Essa palavra – querigma – tem sua origem na língua Grega e significa proclamar, gritar, anunciar. Tendo o cristianismo como base Jesus Cristo, o querigma cristão é apresentar Jesus Cristo, morto, ressuscitado e glorificado para que o povo de Deus tenha uma experiência de vida nova. A Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi, de Paulo VI, ensina que a evangelização querigmática é a base de toda a missão da Igreja e que essa missão constitui a sua identidade mais profunda: A tarefa de evangelizar todos os homens constitui a missão essencial da Igreja; tarefa e missão, que as amplas e profundas mudanças da sociedade atual tornam ainda mais urgentes. Evangelizar constitui, de fato, a graça e a vocação própria da Igreja, a sua mais profunda identidade. Ela existe para evangelizar. (EN 14)
Talvez, um dos obstáculos da evangelização atual promovida pela Igreja esteja localizado exatamente na falta de distinção entre essas duas etapas do mesmo processo. Querse catequizar antes de se anunciar o querigma, antes de se apresentar Jesus Cristo como Senhor e Salvador do homem. Ensinar antes da conversão é como querer alimentar uma criança recémnascida com alimentos sólidos. Antes da catequese, antes de se ensinar a sã doutrina católica, deve-se promover uma experiência do amor de Deus e da salvação de Jesus. O querigma é dividido em sete temas, que são as etapas querigmáticas. São elas: o amor de Deus, o pecado, a salvação de Jesus, a fé, a conversão, o dom do Espírito Santo e a Igreja, a Comunidade Cristã.
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4.1 O Amor de Deus
O homem foi criado à imagem e semelhança de Deus por amor (Gn 1, 26s). Chamando o homem à existência por amor, chamou-o, ao mesmo tempo, ao amor. Por ser amor e por viver em si mesmo um mistério de comunhão pessoal de amor, criando o homem à sua imagem, Deus inscreve na humanidade a capacidade e a responsabilidade do amor e da vivência desse amor em comunhão, harmonia, equilíbrio e felicidade. E, como todo aquele que ama, Deus quer o melhor para o homem. Ama a cada um pessoalmente, chama pelo nome à existência e quer levá-lo à plena realização de seu plano de amor. Esse amor de Deus não se mostra apenas na criação, mas, sobretudo, na regeneração; não foi só criar o homem do nada, mas ressuscitá-lo do pecado, fazendo do homem uma nova criatura graças ao novo nascimento em Jesus Cristo. O Espírito Santo, vínculo de amor e de unidade da Trindade, é o amor pessoal de Deus em cada ser humano, e é dado ao homem em plenitude, sendo derramado em seu coração. Essa manifestação do Espírito Santo no coração do homem é a expressão do amor de Deus, do seu plano eterno de salvação, que tem no Pai a fonte, em Jesus Cristo, o centro, e no Espírito Santo, a chave e o motor. Entre as virtudes cristãs, a mais unitiva, a que une a alma inteira a Deus, é a divina caridade (amor). [...] Somente a caridade une-nos inteiramente a Deus. Ela pressupõe a fé e a esperança, mas ultrapassa-as. Apodera-se totalmente de nossa alma; inteligência, coração, vontade, energia, e entrega-a sem reservas a Deus. (CTAM 316317)
Antes de qualquer outra coisa ou doutrina, é fundamental chamar os jovens e adultos a uma experiência pessoal e única do amor de Deus, pois será essa experiência que abrirá suas vidas e seus corações para a grande obra de conversão que precisa ser realizada durante a caminhada de cristificação pessoal. Evangelizar deve ser mais do que simplesmente falar do amor de Deus, mas mostrar um Deus que é Pai, que ama incondicionalmente, e que deseja, acima de tudo, a felicidade do ser humano, pois Deus criou o homem por amor e para o amor.
4.2 O Pecado
Em resposta ao grande amor do Criador, o homem diz não e o pecado entra no mundo. Não se pode sentir e viver o amor de Deus e a vida abundante que Jesus prometeu (Jo 10, 10) porque o pecado separa a humanidade do seu Criador, única fonte de amor e de vida. O pecado
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priva o homem da glória de Deus (Rm 3, 23), e essa privação leva esse homem na direção contrária ao caminho de vida que o Senhor traçou para que a humanidade, agora pecadora, pudesse viver em felicidade. Deus criou o homem num estado pleno de amizade com Ele, o Criador. Mas o homem, enganado e seduzido pelo Mal, abusou da sua liberdade e voltou-se contra o Pai, buscando chegar a sua realização própria independentemente de Deus, de forma autônoma. O homem pecou. Com isso, passa a se afastar completamente do Criador, voltando seu olhar apenas para si e para os seus desejos, suas vontades, suas necessidades, não reais, mas criadas pela sua vontade já deturpada e obnubilada pelo pecado. O pecado é uma falta contra a razão, a verdade, a reta consciência. É uma falta contra o amor verdadeiro para com Deus e para com o próximo por causa de um apego perverso a certos bens, materiais ou espirituais. É algo que fere a natureza do homem e a comunhão com Deus, ofendendo a solidariedade humana. O pecado é, em si, uma palavra, um ato, uma omissão ou um desejo contrário à lei eterna estabelecida por Deus na Criação do mundo. Em suma, é uma ofensa direta e grave a Deus. O pecado é uma transgressão voluntária da lei de Deus. Portanto, é uma desobediência a Deus, uma ofensa contra Ele, pois é uma preferência de nossa vontade à dele e uma violação aos soberanos direitos que Ele tem sobre nossa submissão. (CTAM 707)
O homem recusa-se a reconhecer a Deus como seu princípio. Isso o faz perder a união com a sua finalidade última e rompe toda a harmonia consigo mesmo, com os demais homens e com toda a criação. Como consequência, o ser humano se prejudica e fere profundamente seu corpo e mente com doenças, angústias, desequilíbrios e inseguranças, prejudica sua capacidade de amar e ser amado, vivendo relacionamentos falsos e inexistentes, constrói uma sociedade corrompida, individualista, violenta, enfim, transforma o cosmos em caos. E, ainda, tenta culpar o Criador por todo esse mal, sendo o próprio homem o seu originador e causador.
4.3 A Salvação de Jesus
O homem é de natureza pecadora, decaída. Por isso, peca. Peca por força de sua própria natureza. E, portanto, não pode salvar-se a si mesmo (Sl 48, 8). Somente Deus tem a solução para os problemas do ser humano. Solução essa que Ele dá e oferece a cada momento, a cada homem; oferta pela qual a humanidade encontra a salvação. É por Jesus e em Jesus que o Pai oferece a salvação ao homem caído.
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Jesus Cristo é a promessa de redenção de Gênesis (3, 15). Ele é a arca da salvação oferecida por Deus aos homens submersos no pecado. O nome de Jesus traduz a sua missão – Deus Salva: “[..] tu o chamarás com o nome de Jesus, pois Ele salvará o seu povo dos seus pecados” (Mt 1, 21). Ele veio ao mundo para vencer o príncipe desse mundo (Jo 16, 33) e testemunhar o grande amor que o Pai tem pela humanidade caída e assolada pelo pecado. A dívida do homem para com o Criador era impagável. A morte é o preço do pecado (Rm 6, 23), a natureza do homem é pecadora; portanto, o homem jamais poderia pagar o preço do seu pecado. O Filho de Deus feito homem, em tudo semelhante, exceto no pecado, era o único capaz de pagar o preço do pecado do ser humano e restaurar a humanidade. Jesus, o novo Adão, assumiu as consequências do pecado para devolver aos homens a liberdade de filhos de Deus. Jesus não vem apenas para tirar o pecado do mundo, mas também para manifestar o grande amor do Pai pelo ser humano. Ele veio trazer a vida e vida em abundância (Jo 10, 10). Veio nos comunicar uma vida nova, a partir da sua ressurreição. Veio trazer à humanidade o sentido perdido com o pecado original, levando o homem a experimentar, novamente, a graça santificante numa vida de intimidade com o Senhor. A salvação trazida por Jesus parte da sua Encarnação, pois toma parte da natureza humana, habita com os homens, assume suas limitações e deficiências. Vive plenamente a vida humana, exceto no pecado. Depois, segue pela sua morte de cruz, obediente ao Pai, onde prova o amor que Deus tem pelos seus filhos. Culmina com sua ressurreição, quando se levanta do reino dos mortos e inaugura uma nova vida, que Ele oferta ao homem, a todo aquele que, por sua vez, também quiser seguir seus passos e obedecer ao Pai. Jesus morre a morte do homem para que este possa viver a sua vida divina, e com isso, salva o homem do pecado.
4.4 A Fé
Fé não é apenas reconhecer a existência de Deus ou aceitar as verdades por Ele reveladas, mas é o encontro com Jesus ressuscitado. Encontro que faça uma mudança completa no curso e no sentido da vida do homem, como o que ocorreu com Saulo no caminho de Damasco (At 9). Ter fé em Jesus não é apenas seguir sua doutrina, mas é ter uma relação pessoal com Jesus vivo como Deus e Senhor. Não se pode reduzir a experiência de fé a uma religião de práticas exteriores, que têm seu valor em si mesmas, apenas cumprindo deveres. Também não se pode reduzir a uma moral
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restritiva, a um código de normas negativas que limitam a liberdade do homem, vivendo uma vida de proibições. Nem ainda a uma ideologia humanista que tem em Jesus apenas um ser extraordinário e o Evangelho como um programa de libertação social. A fé deve ser um encontro pessoal com Jesus. Sendo a fé um dom de Deus e, ao mesmo tempo, uma livre adesão de nossa alma, é evidente que para nela progredir é necessário oração e esforço pessoal. Essa dupla influência tornará a fé mais esclarecida e simples, mais firme e ativa. (CTAM 1180)
É a partir desse encontro vivo com o Ressuscitado que se principia uma vida religiosa autêntica. É necessário que se acolha e receba Jesus em sua vida e coração, pois Ele precisa entrar e morar dentro do coração do homem (Ap 3, 20), salvando, libertando e transformando todo o seu interior. Somente a partir desse encontro vivo com Jesus é que se inicia uma vida nova que se expressa e manifesta em um compromisso moral e em uma vida de culto e de religião como fruto e consequência normal da viva presença do Cristo. Fé é uma resposta à presença e à ação salvífica de Deus através de seu Filho, Jesus. É um sim lúcido, maduro, incondicional e consciente que o homem dá uma vez e renova permanentemente. É a adesão responsável e livre a Jesus e à totalidade da sua mensagem e da sua obra. O conhecimento da doutrina e o cumprimento das normas religiosas partem da experiência pessoal de salvação e de libertação trazida por Jesus ao homem, que leva à conversão.
4.5 A Conversão
Conversão significa mudança. Converter-se é mudar. Mudar de direção, de atitudes, de pensamento. Mudar de vida. E essa mudança completa é uma exigência do Reino de Deus (Mt 4, 17). Primeiro, acontece a transformação interior, realizada no homem pelo próprio Deus e voltada para Ele. Essa mudança chama-se metanoia, que é a mudança essencial de caráter e pensamento pela transformação espiritual. A partir desta, ocorrem as mudanças de vida, de atitudes, de obras. Este reino e esta salvação, palavras-chave da evangelização de Jesus Cristo, todos os homens os podem receber como graça e misericórdia; e no entanto, cada um dos homens deve conquistá-los pela força – os violentos apoderam-se dele, diz o Senhor (Lc 16, 16) – pelo trabalho e pelo sofrimento, por uma vida em conformidade com o Evangelho, pela renúncia e pela cruz, enfim pelo espírito das bem-aventuranças. Mas, antes de mais nada, cada um dos homens os conquistará mediante uma total transformação do seu interior que o Evangelho designa com a palavra ‘metanoia’, uma
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conversão radical, uma modificação profunda da maneira de ver e do coração (Mt 4, 17). (EN 10)
Conversão é mudança total. É deixar para trás, abandonar tudo o que é incompatível com Deus e com seu plano de amor. É abandonar o pecado e suas obras, os ídolos e suas exigências; é voltar-se totalmente para Deus. Uma conversão autêntica tem por dever a mudança da mentalidade individualista por outra que vá no sentido da solidariedade, que faça com que o homem, criado à imagem e semelhança de Deus, viva com e para os seus semelhantes. A conversão se dá num ciclo de três passos básicos: o reconhecimento do pecado, o arrependimento e a confissão dos pecados. Somente através da iluminação do Espírito Santo, o homem toma consciência do seu pecado. Não apenas traz em si um sentimento de culpa ou uma lista de pecados, mas busca voltar-se para Deus e recomeçar seu caminho. Caminho esse que começa com o arrependimento, a abominação do pecado, acrescidos de um firme propósito de não mais pecar. Romper com o pecado é o grande passo para uma vida de conversão. Após sentir a dor de ter pecado e arrepender-se de os ter cometido, o homem precisa confessar seus erros, renunciar a toda obra do Mal em sua vida, bem como a toda atitude moralmente má e que desvia seus passos do caminho reto que o Cristo traçou. Para que o reconhecimento do pecado e o arrependimento restaurem a união do homem com Deus e com o seu próximo, é necessário que o pecador, após confessar seus pecados e ser absolvido, repare seus prejuízos materiais e espirituais, ou seja, é necessária a restauração do homem total.
4.6 O Dom do Espírito Santo
Em sua humanidade, Jesus era pleno do Espírito Santo desde o primeiro momento da sua existência. Por ter sido concebido pelo poder do mesmo Espírito, Jesus se caracteriza como Filho de Deus e Messias. No momento do seu Batismo, quando o Espírito Santo vem sobre Ele, faz com que sua missão se torne pública, assumindo assim, perante os homens, seu messianismo. A Nova Aliança recebe caráter público. Jesus não recebe o Espírito Santo somente por força de sua investidura pública como Messias, mas O recebe também como dom pessoal que confere poder e autoridade em vista de sua obra messiânica. O Espírito Santo é derramado sobre Jesus porque Ele foi ungido para pregar a boa nova aos pobres (Lc 4, 18). Do mesmo modo que o Espírito de Deus pairava sobre a face das águas na Criação (Gn 1, 1), Ele paira sobre Jesus, certificando e ungindo sua missão salvífica em meio aos homens.
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E depois de ter cumprido a sua missão na cruz e na ressurreição, Jesus envia o Espírito Santo aos seus. Entre Jesus e o Espírito Santo há uma reciprocidade de relação. Jesus é o portador do Espírito Santo, pois o Pai “o ungiu com o Espírito Santo e com poder” (At 10, 38). Jesus é conduzido pelo Espírito; é pelo Espírito que o Pai o ressuscita dentre os mortos. Jesus envia o Espírito que recebeu, e é pelo poder desse Espírito Santo que o homem se torna cristão. “Quem não tem o Espírito de Cristo não pertence a ele” (Rm 8, 9). Todo corpo precisa não somente de uma cabeça, mas também de uma alma. O Espírito Santo é a alma do corpo cuja cabeça é Jesus. De fato, é Ele que derrama nas almas a caridade e a graça que nos mereceu o Senhor. [...] Por essa razão Ele é chamado Espírito que vivifica. (CTAM 144)
O sinal distintivo da iniciação cristã é a recepção do Espírito Santo. Por isso, é fundamental que não seja administrado de qualquer maneira, sem qualquer conhecimento, pois receber o Espírito Santo é tornar-se cristão. Essa fase querigmática da evangelização deve ser feita no Espírito e voltada para a experiência que esse mesmo Espírito leva o catecúmeno a viver: Jesus Cristo vivo e ressuscitado.
4.7 A Comunidade Cristã
A Igreja, comunidade cristã, nasce do lado aberto de Cristo na cruz. Mais do que um artigo de fé, a Igreja pertence ao mistério de Deus e, dessa forma, ao mistério da salvação dos homens. Não se trata apenas de uma sociedade humana, organizada, juridicamente instituída, mas está no meio dos homens integrada ao conjunto das sociedades. Além disso, a Igreja é também é Corpo Místico de Cristo, do qual todos os homens são membros. E, sendo assim, o Espírito Santo é seu princípio vital. Desde os tempos dos Santos Padres, há uma expressão, atribuída a Santo Agostinho, que diz “tanto alguém possui o Espírito Santo quanto ama a Igreja”. A Igreja é o Templo do Espírito Santo. Ela torna o Reino de Deus visível no mundo. Ela leva o homem a Deus. Nela a vida cristã de fé, de oração e de união fraterna, acontece e se desenrola todos os dias. A Igreja se identifica na fé na Aliança de Deus com os homens, selada definitivamente em Jesus Cristo, que se uniu indissoluvelmente à Igreja como a uma esposa e se tornou um só corpo com ela. Se a Eucaristia edifica a Igreja, e a Igreja faz a Eucaristia, como antes recordei, consequentemente há entre ambas uma conexão estreitíssima, permitindo-nos aplicar ao mistério eucarístico os atributos que dizemos da Igreja quando professamos, no Símbolo Niceno-Constantinopolitano, que é ‘una, santa, católica e apostólica’. Também, a Eucaristia é una e católica; e é santa, antes, é o Santíssimo Sacramento. (EdE 26)
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A Igreja é una. Jesus fundou uma só Igreja (Mt 16, 18) e rezou para que todos os seus discípulos fossem um, como Ele e o Pai são um. Unidade essa refletida e vivida na única Igreja de Cristo. E para que esta unidade fosse possível e visível, estabeleceu Pedro como fundamento dessa Igreja, como seu representante. Por isso, afirma-se sem erro que fora da sucessão de Pedro, da sucessão apostólica, não há como firmar a unidade. A Igreja é santa. E isso não quer dizer que seja perfeita. Enquanto peregrinar pela Terra, não terá atingido a perfeição de Cristo, bem como nem seus membros ou estruturas. Isto significa que ela necessita constantemente de renovação e conversão, o que não diminui sua característica essencial de santidade. É santa no objetivo, é santa nos meios. Busca levar os homens à santidade, pois “esta é a vontade de Deus: a vossa santificação” (1Ts 4, 3). A Igreja é católica. Não está limitada a um povo, cultura, nação. Abrange o mundo inteiro, todos os povos, raças, épocas, classes e idades. Não elimina nenhuma característica nacional, cultural ou ideológica, mas respeita as diferenças. Não fica na superfície, mas mergulha numa linha mais profunda do homem em si, renascido pelo Batismo. Ser católica é ser universal, tanto quanto à verdade, tanto quanto ao espaço e ao tempo. A universalidade da Igreja significa abertura e empenho de todos os cristãos no sentido de fazer chegar a todos os homens a mensagem salvífica de Cristo. A Igreja é missionária por essência. A Igreja é apostólica. Tem sua raiz e autenticidade num critério indiscutível e inabalável. Não está à disposição de qualquer vento de doutrina (Ef 4, 14), nem segue a homens. Mas tem seu ponto de referência inalterável: a Fé dos Apóstolos. E isso não a limita apenas aos Apóstolos, mas está aberta a toda herança que o próprio Cristo confiou aos seus para o bem dessa mesma Igreja. Herança essa transmitida de geração em geração.
5. A Catequese Criado à Imagem e Semelhança de Deus (Gn 1, 27), por amor e para o amor, o homem, em resposta a esse amor, virou as costas para o seu Criador e pecou, afastando-se do Senhor (Gn 3, 6). Mas Deus, em seu infinito amor, enviou seu Filho para salvar a humanidade pecadora (Jo 3, 16). Ao homem pecador, basta invocar o Nome do Senhor e aderir a seu plano de salvação (Rm 8, 9-13), converter-se de seus maus caminhos (Mt 4, 17) e abrir-se à ação do Espírito Santo de Deus (At 2, 1-6). Assim, imbuído do amor do Pai, da presença eucarística de Jesus e do poder e fortaleza do Espírito Santo, esse homem restaurado e convertido ao Senhor, vive na e para a Igreja, achando nela sua base, sustento e razão missionária (At 4, 32-33). O querigma é sucedido pela catequese. Não se pode amar a quem não se conhece. O conhecimento é parte integrante da relação amante-amado, uma vez que conhecer traz maior intimidade e vontade de estar mais perto. Por isso, após a fase querigmática, é fundamental que a obra iniciada tenha sequência com uma catequese bem-feita e embasada. E essa base é encontrada, principalmente, no Catecismo da Igreja Católica. Sobre tal, afirma a Exortação Apostólica Catechesi Tradendae: A especificidade da catequese, distinta do primeiro anúncio do Evangelho que suscitou a conversão, visa o duplo objetivo de fazer amadurecer a fé inicial e de educar o verdadeiro discípulo de Cristo, mediante um conhecimento mais aprofundado e mais sistemático da Pessoa e da mensagem de Nosso Senhor Jesus Cristo. (CT 19)
O Catecismo reúne todas as premissas da fé da Igreja e da Doutrina Católica, testemunhadas ou iluminadas pela Sagrada Escritura, pela tradição apostólica e pelo Magistério da Igreja. É um instrumento seguro para o ensino da fé e deve ser oferecido a todos aqueles que desejam aprofundar o conhecimento das riquezas inexauríveis da salvação (Jo 8,32). A catequese, após a experiência querigmática do encontro com a pessoa de Jesus, deve ser pautada nos ensinamentos do Catecismo. A Constituição Apostólica Fidei Depositum, de São João Paulo II, papa, apresenta de forma clara e objetiva o propósito e a função que o Catecismo deve exercer: Um catecismo deve apresentar, com fidelidade e de modo orgânico, o ensinamento da Sagrada Escritura, da Tradição viva na Igreja e do Magistério autêntico, bem como a herança espiritual dos Padres, dos Santos e das Santas da Igreja, para permitir conhecer melhor o mistério cristão e reavivar a fé do povo de Deus. Deve ter em conta as explicitações da doutrina que, no decurso dos tempos, o Espírito Santo sugeriu à Igreja. É também necessário que ajude a iluminar, com a luz da fé, as novas situações e os problemas que ainda não tinham surgido no passado. O Catecismo incluirá, portanto, coisas novas e velhas (Mt 13,52), porque a fé é sempre a mesma e simultaneamente é fonte de luzes sempre novas. (FD 2)
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Da mesma forma que catequizar antes de evangelizar querigmaticamente é um erro, não fazê-lo de forma eficaz após a evangelização e conversão do catecúmeno seria incorrer em equívoco semelhante, como dar apenas leite materno a um adulto. Cada fase da vida biológica tem seu alimento próprio. Cada fase da vida espiritual, também. E é necessário que se trate cada fase de acordo com suas necessidades. Inclusive no método a ser usado, pois para falar aos jovens é necessário um método próprio, assim como aos adultos, outro. E ambos diferentes daquele usado para falar a crianças. Em suma, método, didática e conteúdo – apesar deste ser imutável – devem ser adaptados aos ouvidos do ouvinte, do catecúmeno.
5.1 A Profissão de Fé
Uma expressão privilegiada da herança viva, que os mesmos Pastores recebem o encargo de guardar, encontra-se no Credo, ou, mais concretamente, nos Símbolos que, em momentos cruciais, coligiram em afortunadas sínteses a fé da Igreja. No decurso de séculos, um elemento importante da catequese era precisamente a ‘traditio Symboli’ (ou transmissão do resumo dos pontos principais da fé), seguida da transmissão (‘traditio’) da Oração dominical. Em nossos dias, este rito expressivo foi reintroduzido na cerimônia da iniciação dos catecúmenos. (CT 28)
O homem foi criado por Deus e só em Deus encontra sua felicidade (Sl 15, 11). E Deus, no homem, incutiu desejo de Si; criou o homem livre e por amor; para amar o criou. E o homem só vive plenamente sua liberdade quando reconhece e se entrega ao seu Criador, que o criou à sua imagem e semelhança. Deduz-se e experimenta-se, também, que o homem e o mundo não têm o primeiro princípio nem seu fim último em si mesmos. Como criações, encontram perfeição apenas no que é perfeito, Deus. Logo, o homem só alcança a plenitude do seu ser quando se aproxima do Perfeito e o mundo só contribui para essa aproximação quando vivido e usufruído de maneira que gere frutos e meios para a aproximação da Origem de todas as coisas. Por suas próprias forças, o homem não é capaz de nada. Conforme ensina São Paulo, “trazemos, porém, este tesouro em vasos de argila, para que esse incomparável poder seja de Deus e não de nós” (2Cor 4, 7). O Espírito Santo é quem faz tudo em todos. De maneira análoga, foi Ele quem fez e continua fazendo a obra durante toda a peregrinação terrestre da Igreja através dos fiéis batizados. O Espírito conduz os fiéis ao encontro com a Verdade, Cristo. Na transmissão do Evangelho, observa-se uma ação direta de Deus através do homem. Essa transmissão se dá de duas maneiras: oralmente ou por escrito. A Tradição Apostólica é um grande tesouro construído por Deus através da sua Igreja. A Sagrada Escritura e a Tradição são parte do patrimônio sagrado da Fé: “Timóteo, guarda o depósito, evita o palavreado vão e ímpio,
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e as contradições de uma falsa ciência, pois alguns, professando-a, se desviaram da fé” (1Tm 6, 20). Aos Bispos, em comunhão o sucessor de Pedro, Bispo de Roma, foi confiada a missão de elaborar e preservar toda a doutrina da Igreja, seja na interpretação das Escrituras, seja nas definições dogmáticas. E esses são os três pilares da Fé Católica. Obedecer significa ouvir atentamente. Obedecer à Igreja é ouvir e praticar as suas determinações e viver segundo a doutrina e demais ensinamentos transmitidos por ela, sabendo que quem conduz o Corpo no mundo é a Cabeça, o Cristo, que está em comunhão com o Pai e o Espírito Santo. Mesmo que presente em tantas línguas, culturas, povos e nações, a Igreja professa uma única Fé, um credo comum a todos. Deus é para toda a Igreja um só Deus, em três pessoas: Pai e Filho e Espírito Santo. No centro da Igreja está Deus e é esse Centro que a catequese feita pela Igreja tem por objetivo atingir, e para o qual, através da celebração dos sacramentos e pela pregação da palavra de Deus, o povo é conduzido. Jesus Cristo é o centro da catequese. A catequese, o eco do anúncio, só existe para conduzir ao Senhor. O Filho de Deus se fez carne e habitou entre os homens (Jo 1, 14), afim de trazer e dar vida em abundância (Jo 10, 10), dar a conhecer o que aprendeu do Pai (Jo 15, 15) e revelar a sua face (Jo 14, 9), dando testemunho e anunciando que o Reino de Deus chegou (Lc 17, 2021), como o servo obediente (Fl 2, 8) e humilhado, a ovelha muda a sofrer nas mãos dos tosquiadores, sem abrir a boca (Is 53, 7), pelos pecados da humanidade, vencendo o pecado e a morte, ressuscitando ao terceiro dia (1Cor 15, 3-4). Assim, sepultou consigo os pecados dos homens afim de fazê-los ressurgir com Ele para uma vida nova, libertos do jugo do pecado (Rm 6, 2-7). Morto e ressuscitado, o Filho de Deus se torna o Senhor dos vivos e dos mortos (Rm 14, 9). De modo efetivo, a Trindade atua na Igreja através do Espírito Santo, em toda ação boa no homem (1Cor 12, 3). Enquanto esperam a plenitude dos tempos, em que o Senhor como juiz virá para julgar os vivos e mortos, os homens devem viver cientes de que o dia do Senhor chegará como um ladrão (2Pd 3, 10); dia em que se aguarda o cumprimento da promessa, obedecendo o que Ele ordenou (At 1, 7-8), vislumbrando os novos céus e a nova terra (2Pd 3, 13).
5.2 A Celebração do Mistério de Cristo O dia do Senhor – como foi definido o domingo, desde os tempos apostólicos –, mereceu sempre, na história da Igreja, uma consideração privilegiada devido à sua
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estreita conexão com o próprio núcleo do mistério cristão. O domingo, com efeito, recorda, no ritmo semanal do tempo, o dia da ressurreição de Cristo. É a Páscoa da semana, na qual se celebra a vitória de Cristo sobre o pecado e a morte, o cumprimento nele da primeira criação e o início da ‘nova criação’ (cf. 2Cor 5, 17). É o dia da evocação adorante e grata do primeiro dia do mundo e, ao mesmo tempo, da prefiguração, vivida na esperança, do ‘último dia’, quando Cristo vier na glória (cf. At 1,11; 1Ts 4, 13-17) e renovar todas as coisas (cf. Ap 21, 5). (DD 1)
O conjunto de práticas oracionais, ritos, celebrações sacramentais, com seus gestos e fórmulas, meios e fins é chamado Liturgia. A Liturgia é o meio pelo qual a Igreja celebra o mistério do Deus que quer curar e libertar, salvar e conduzir, ensinar e transformar o seu povo. É o que acontece quando o povo de Deus toma parte na obra do Criador. É o ápice de toda a ação da Igreja; na Liturgia é que os homens tomam parte na obra de Deus e agem em nome de Cristo. Pelos seus méritos e poder, no Espírito Santo, o próprio Senhor se faz presente no mistério Eucarístico e se dá como alimento ao seu povo, sendo Ele mesmo sua fonte de força e motivação. Deus é o primeiro princípio e o fim último de toda ação litúrgica (SC 10). Através das ações litúrgicas são manifestados os sinais da aliança entre Deus e os homens. A Igreja dispõe de tempos específicos durante o chamado ano civil no ano litúrgico (ou seja, o nome dado ao período de tempo em que a Igreja, guiada por Deus, organiza as celebrações litúrgicas da vida do Cristo e as celebrações dos seus santos). Os tempos litúrgicos são: Advento, Natal, Quaresma, Páscoa e Tempo Comum. Tendo o Cristo como o centro da Liturgia, a Igreja organiza as grandes solenidades, os acontecimentos mais importantes, dentre todos da história da salvação, nesses Tempos. O Advento e a Quaresma são os períodos em que a Igreja entra em grandes momentos de reflexão e penitência, afim de se preparar para os acontecimentos que os sucedem: ao Advento, o Natal do Senhor, e à Quaresma, o Tríduo Pascal seguido do Domingo dos Domingos, a Páscoa. Do nascer ao morrer, a vida na Igreja é uma Liturgia. Muitos são os ritos e muitas são as formas de as celebrar. Cada rito com sua forma, conforme determina o Magistério. A Sacrosanctum Concilium ratifica isso: Em todas as celebrações litúrgicas, ministro e fiéis, no desempenho de sua função, façam somente aquilo e tudo aquilo que convém à natureza da ação, de acordo com as normas litúrgicas. (SC 28)
Nenhum homem que não tenha recebido o Sacramento da Ordem no grau devido tem autorização de celebrar a Eucaristia, nem o fiel de fazer a fração do Pão no lugar do ministro ordenado; cada qual ponha-se no seu lugar e, no seu lugar, faça tudo o que lhe compete. E isso vale para todas as celebrações litúrgicas. A todos, porém, compete a obediência. Não existe lei contra a obediência perfeita, vivida pelo Cristo.
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Para a santificação do povo de Deus, a Igreja instituiu sinais que remetem aos sacramentos e conferem uma graça específica. Os sacramentais variam de medalhas a atos que remetem ao sagrado. Os crucifixos são os sacramentais mais claros de serem exemplificados. Longe de ser superstição, os sacramentais são objetos bentos através dos quais o Senhor pode se aproveitar, pela ação do Espírito Santo, para manifestar a sua graça e poder: Bastava, por exemplo, que sobre os enfermos se aplicassem lenços e aventais que houvessem tocado seu corpo: afastavam-se deles as doenças, e os espíritos maus saíam. (At 19, 12)
Exorcismos, curas, livramentos… os dons de Deus são distribuídos conforme lhe apraz (1Cor 12, 11).
5.3 A Vida em Cristo
Deseja-se acentuar, antes de mais nada, que no centro da catequese nós encontramos essencialmente uma Pessoa: é a Pessoa de Jesus de Nazaré, ‘Filho único do Pai, cheio de graça e de verdade’ (Jo 1, 14), que sofreu e morreu por nós, e que agora, ressuscitado, vive conosco para sempre. É este mesmo Jesus que é ‘o Caminho, a Verdade e a Vida’ (Jo 14, 6); e a vida cristã consiste em seguir a Cristo, ‘sequela Christi’. O objeto essencial e primordial da catequese, pois, para empregar uma expressão que São Paulo gosta de usar e que é frequente também na teologia contemporânea, é ‘o Mistério de Cristo’. Catequizar é levar alguém, de certa maneira, a perscrutar este Mistério em todas as suas dimensões. [...] Neste sentido, a finalidade definitiva da catequese é a de fazer com que alguém se ponha, não apenas em contato, mas em comunhão, em intimidade com Jesus Cristo: somente Ele pode levar ao amor do Pai no Espírito e fazer-nos participar na vida da Santíssima Trindade. (CT 5)
Mortos para o pecado e vivos para Deus, os cristãos, através do Batismo, passam a fazer parte do Corpo que é a Igreja, logo são membros desse Corpo. Enquanto membros, têm sua responsabilidade de viver segundo aquilo que é. Em vista disso, o cristão deve moldar sua vida segundo os valores do Evangelho e a Doutrina da Mãe Igreja. O homem é imagem e semelhança de Deus (Gn 1, 26), é dotado de liberdade, é um ser livre. A liberdade é uma força de crescimento em Deus, que é verdade. Logo, a liberdade só chega à plenitude se está orientada para Deus, que é bom. Quando a liberdade não está orientada para Deus, o homem entra num estado de abuso da liberdade. Sendo ‘uso’ a aplicação de algo segundo a sua natureza, sua função própria, o ser livre do homem quando não está voltado à sua origem, Deus, configura um mau uso daquilo que o Senhor o concede. O homem foi criado por Deus e para Deus. A liberdade confere ao homem o direito de negar a Deus e não cumprir com a missão que é imposta a todo homem,
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sem exceção: a vocação à santidade. O bem, porém, é um dever que se impõe ao homem, porque é na prática do bem e na busca do Criador que o homem exerce plenamente a sua liberdade. Os sentimentos ou afeições que existem no homem não são boas nem más, não possuem valor moral. Contudo, são boas quando são ferramentas usadas pelo homem para fazer o bem, e más quando o contrário. Sendo o pecado a renúncia a Deus e amor de si mesmo, quando praticado e movido pelas paixões, essas são más. Quando, porém, as paixões contribuem para que o homem renuncie a si mesmo em favor de Deus, do próximo (servir a Deus no outro), são boas. A prática do bem, o agir por Cristo, em Cristo e com Cristo, buscar entender e atender às inspirações do Espírito Santo faz do homem um ser virtuoso. O modo de ser, ou seja, o conjunto de hábitos que fazem parte do homem são bons ou ruins se contribuem ou não para sua santificação. Como um ser livre, o homem pode escolher por adquirir, alimentar ou extirpar do seu ser hábitos, fazer escolhas. Os hábitos, quando bons, são chamados virtudes. As virtudes são disposições práticas que amadurecem o homem na prática do bem, na busca pela santidade, vocação primeira do mesmo. Quando maus, os hábitos são chamados vícios. As virtudes são, na prática, uma docilidade ao Espírito Santo; enquanto os vícios são práticas de resistência a ação do mesmo Deus. Sendo o pecado uma negação de Deus, tem suas consequências. O homem procede de Deus e o pecado fere a natureza do homem, porque Deus é Bom (Lc 18, 19), caminho, verdade, vida (Jo 14, 6) e humilde servo (Fl 2, 6-7); e o homem não o é, mas deve buscar Aquele que é. Como o pecado é essencialmente uma renúncia a Deus, reflete numa renúncia à essência do homem, que é o Criador. Existem muitos modos de pecar e duas espécies de pecados: o pecado venial e o pecado mortal. O pecado mortal é todo e qualquer pecado em matéria grave contra um dos Dez Mandamentos. Enquanto o venial, são faltas leves, mas que não deixam de ser faltas. O pecado é um ato pessoal e consciente. Para um ato ser pecado, o homem deve ter o conhecimento de tal, deve haver a matéria e estar presente a liberalidade, ou seja, querer fazêlo. O pecado é o ato de negar a salvação de Deus e sucumbir aos vícios, ou seja, resistir à ação do Espírito Santo, tornando-se livremente escravo da morte.
5.4 A Oração Cristã
Tão eficaz é a oração para santificar-nos, que os Santos repetem à porfia este adágio: ‘Sabe bem viver quem sabe bem orar.’ A oração, de fato, produz três maravilhosos efeitos: desapega-nos das criaturas, une-nos totalmente a Deus e transforma-nos progressivamente em Deus. (CTAM 517)
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A oração está no centro da vida cristã, na vida da Igreja. É através da oração que se tem um efetivo encontro com Deus, razão e sentido de todas as coisas. A oração é a elevação da alma, através da humildade, a Deus. A humildade de coração é a condição sem a qual a oração não acontece. Ela é o caminho certeiro de cumprir a vontade do Pai, manifestada no Filho, através da direção do Espírito Santo. O Filho humilhou-se, abaixou-se até a morte de cruz (Fl 2, 8) para cumprir a vontade do Pai. ‘A oração, quer saibamos ou não, é o encontro entre a sede de Deus e a nossa. Deus tem sede de que nós tenhamos sede dele’ (CCE 2560). O encontro com Deus que se dá através da oração acontece no lugar onde são tomadas as decisões, ou seja, no coração. Somente em Deus o homem encontra o que dá sentido à sua vida, isto é, a Verdade. Porque Deus é a Verdade. O Espírito Santo é quem conduz a oração da Igreja, seja através da Liturgia, na celebração dos sacramentos, seja na oração particular dos fiéis, porque o homem não sabe rezar como convém (Rm 8, 26-28), mas o Espírito é que o socorre nas suas incapacidades. O próprio Senhor advertiu acerca da necessidade de rezar e vigiar afim de manter o espírito pronto (Mt 26, 41). São Paulo adverte a rezar em todo momento (1Ts 5, 17), ou seja, em estar a todo momento na presença de Deus, ser dócil ao Espírito Santo; logo, ser virtuoso na prática do bom hábito de rezar, de estar aberto ao Senhor. Os frutos da oração são tanto visíveis como invisíveis, e dependem do querer do Senhor, que distribui seus dons conforme sua vontade (1Cor 12, 11). Na oração, o cristão é fortalecido e amadurecido no conhecimento de Deus e para o testemunho de Cristo. A Oração do Senhor, o Pai-nosso é a compilação de todo o Evangelho. A oração do Senhor é a que fazemos, com Cristo, em comunhão com toda a Igreja. Ao Pai, Cristo não se dirige como seu Pai, mas como Pai comum de todo o seu Corpo, a Igreja. A oração contém sete pedidos e eles remetem à essência da missão redentora de Deus Filho entre os homens e são apresentadas como um manual de santidade. Um singelo fragmento da obra de Adolphe Tanquerey apresenta um belíssimo resumo da Oração do Senhor: Entre as preces que rezamos em particular ou em público, não há mais bela que o PaiNosso, que o próprio Senhor nos ensinou. Em seu início, encontramos uma introdução cativante, que nos lança na presença de Deus e estimula nossa confiança: Pai nosso que estais no céu. O primeiro passo a ser dado quando oramos, é aproximar-nos de Deus. Ora, a palavra Pai põe-nos imediatamente na presença daquele que é Pai por excelência, Pai do Verbo, por geração, e nosso Pai, por adoção. Portanto, deparamonos como o Deus da SS. Trindade, que nos envolve com o mesmo amor com que envolveu o próprio Filho. Como esse Pai está nos céus, ou seja, é onipotente, é o manancial de todas as graças, sentimo-nos movidos a invocá-lo com absoluta confiança filial, haja vista que somos da família de Deus, todos irmãos, filhos de Deus (Pai nosso). [...] Oração sublime, posto que nela tudo refere-se à glória de Deus e, no entanto, tão simples e ao alcance de todos, pois, enquanto glorificamos a Deus,
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pedimos tudo o que para nós há de mais útil. Por isso os Santos, Padres e Doutores, compraziam-se em comentá-lo, e o Catecismo do Concílio de Trento dela nos dá uma explicação longa e muito sólida. (CTAM 515-516)
6. Conclusão Deus, em sua infinita misericórdia, mesmo diante do pecado do homem, não desiste da humanidade (Ef, 2, 4s). Na plenitude dos tempos, enviou seu Filho único (Jo 3, 16), Jesus Cristo, para salvar o homem e trazê-lo novamente para junto de Si. Para perpetuar sua presença no mundo, deixa a sua Igreja (Mt 16, 18) como seu sinal perene, seu sacramento. E, na Igreja, através do Espírito Santo, age nos fiéis pelos Sacramentos, instituídos segundo a sua vontade e os seus desígnios de salvação. Os Sacramentos são sinais sensíveis da graça de Deus (CCE 1084), que agem no seu povo, santificando-o e chamando-o à missão. Cada Sacramento da Igreja tem sua função específica, e perpassam toda a vida do homem, do nascer até o seu ocaso. O Batismo é a porta de entrada na Igreja, o nascimento para a vida de Deus. De criatura, o homem torna-se filho de Deus e herdeiro do Reino. A Confirmação unge esse filho para também ser soldado de Cristo e evangelizador. A Eucaristia é o alimento da jornada, o Pão Vivo descido dos céus (Jo 6, 51), que sustenta e fortalece. Ordem e Matrimônio trazem a perspectiva da missionariedade da Igreja, uma vez que são para a santificação do outro, levando, assim, à santificação pessoal. Por ser de natureza pecadora, o homem pecou e peca, e Deus sempre vem em seu auxílio e socorro. O Sacramento da Reconciliação refaz os laços de amizade entre Deus e o homem que foram rompidos pelo pecado, reabilitando a Graça Santificante. E já no termo de sua vida, quando a doença e a senilidade chegam, o Senhor alivia os sofrimentos humanos com a Unção dos Enfermos. Como um dos focos centrais desse trabalho, os Sacramentos da Iniciação Cristã formam um grupo fundamental na vida de santificação do homem. Aquele que era apenas uma criatura, agora torna-se filho de Deus, herdeiro dos céus, além de ser feito também, pelo Batismo, rei, profeta e sacerdote. O pecado original é lavado definitivamente da alma humana e a Graça Santificante encontra seu lugar de repouso. O Espírito Santo, amor que procede do Pai e do Filho, agora é o doce hóspede da alma e do coração do homem. Hóspede que não apenas habita, mas que fortalece e capacita esse homem na Confirmação para sua vocação primeira, a santidade, e para sua missão fundamental, ser um apóstolo de Cristo, um evangelizador, um novo Cristo. A Eucaristia é mais que um alimento para o sustento do homem. É a presença real e absoluta de Jesus Cristo na sua Igreja, como Ele prometeu na sua Palavra (Mt 28, 20). É Deus que se dá em comida e bebida para o homem, que ao receber o Corpo e Sangue, Alma e
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Divindade de Cristo, se faz um com Ele e penetra no seio da Santíssima Trindade. É da Eucaristia, o Sacramento dos Sacramentos, que não apenas recebe-se a graça, mas também o Autor de toda graça, Jesus. Como fonte e cume de toda a vida da Igreja (SC 10), a Eucaristia o pretende ser também para o homem pecador. Cristo se dá à humanidade para que a humanidade se santifique nele. A grande missão da Igreja – da qual Cristo é a Cabeça – é evangelizar. Ele mandou que seus apóstolos fossem e pregassem o Evangelho (Mc 16, 15), testemunhassem sua salvação até os confins do mundo (At 1, 8). Anunciar a Boa Nova do reino de Deus (Lc 4, 43) é um dever se impõe não apenas à Igreja, mas a todos os seus fiéis, que, fortalecidos e enviados pelos Sacramentos, devem-no cumprir oportuna e inoportunamente (2Tm 4, 2). A Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi ratifica o mandato do Senhor à sua Igreja: A Igreja sabe-o bem, ela tem a consciência viva de que a palavra do Salvador – ‘Eu devo anunciar a Boa Nova do reino de Deus’ (Lc 4, 43) – se lhe aplica com toda a verdade. Assim, ela acrescenta de bom grado com São Paulo: ‘Não tenho, de fato, de que gloriar-me se eu anuncio o Evangelho; é um dever este que me incumbe, e ai de mim, se eu não pregasse’ (1Cor 9, 16). Foi com alegria e reconforto que nós ouvimos, no final da grande assembleia de outubro de 1974, estas luminosas palavras: ‘Nós queremos confirmar, uma vez mais ainda, que a tarefa de evangelizar todos os homens constitui a missão essencial da Igreja’; tarefa e missão, que as amplas e profundas mudanças da sociedade atual tornam ainda mais urgentes. Evangelizar constitui, de fato, a graça e a vocação própria da Igreja, a sua mais profunda identidade. Ela existe para evangelizar, ou seja, para pregar e ensinar, ser o canal do dom da graça, reconciliar os pecadores com Deus e perpetuar o sacrifício de Cristo na santa missa, que é o memorial da sua morte e gloriosa ressurreição. (EN 14)
Para essa evangelização ser mais eficiente e eficaz, a Igreja utiliza-se do querigma, do primeiro anúncio, para atingir o coração humano, ferido pelo pecado, distante da graça de Deus. Apresenta o amor incondicional do Pai que, mesmo diante da negativa do homem, que peca e se afasta do seu Criador, vem até a humanidade caída e dá seu Filho como Senhor e Salvador. Cabe ao homem crer em Jesus Cristo, transformar sua vida, sua mentalidade, seu caminho. Essa metanoia – conversão total –, abre o coração humano para que o Espírito Santo, Dom de Deus, possa agir e fazer uma obra completamente nova (Is 43, 19), trazendo o homem, agora redimido, para o seio da Igreja, de onde ele poderá tirar toda fonte de vida e santidade necessárias à sua santificação e salvação. A seguir do primeiro anúncio, da evangelização inicial, após tocar o coração do homem e trazê-lo para mais perto de Deus, inicia-se a segunda etapa da evangelização: a catequese. Funciona como um eco do querigma e apresenta todas as verdades de Fé necessárias para que o fiel se aproxime mais ainda do Senhor e possa amá-Lo de forma cada vez menos imperfeita. Não se ama o que não se conhece, pois o amor supõe intimidade e mútuo conhecimento (1Jo 4,
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8). A função básica da catequese não é formar teólogos ou doutores, mas apresentar um Deus que, além de amar, quer o bem máximo para o homem, a sua salvação. Deseja-se acentuar, antes de mais nada, que no centro da catequese nós encontramos essencialmente uma Pessoa: é a Pessoa de Jesus de Nazaré, ‘Filho único do Pai, cheio de graça e de verdade’ (Jo 1, 14), que sofreu e morreu por nós, e que agora, ressuscitado, vive conosco para sempre. É este mesmo Jesus que é ‘o Caminho, a Verdade e a Vida’ (Jo 14, 6); e a vida cristã consiste em seguir a Cristo, ‘sequela Christi’. O objeto essencial e primordial da catequese, pois, para empregar uma expressão que São Paulo gosta de usar e que é frequente também na teologia contemporânea, é ‘o Mistério de Cristo’. Catequizar é levar alguém, de certa maneira, a perscrutar este Mistério em todas as suas dimensões: ‘expor à luz, diante de todos, qual seja a disposição divina, o Mistério... Compreender, como todos os santos, qual seja a largura, o comprimento, a altura e a profundidade... conhecer a caridade de Cristo, que ultrapassa qualquer conhecimento... (e entrar em) toda a Plenitude de Deus’ (Ef 3, 9.18s). Quer dizer: é procurar desvendar na Pessoa de Cristo todo o desígnio eterno de Deus que nela se realiza. É procurar compreender o significado dos gestos e das palavras de Cristo e dos sinais por Ele realizados, porquanto eles ocultam e revelam ao mesmo tempo o seu Mistério. Neste sentido, a finalidade definitiva da catequese é a de fazer com que alguém se ponha, não apenas em contato, mas em comunhão, em intimidade com Jesus Cristo: somente Ele pode levar ao amor do Pai no Espírito e fazer-nos participar na vida da Santíssima Trindade. (CT 5)
Na perspectiva querigmático-catequética de jovens e adultos, há que se buscar uma fidelidade ao que a Igreja propõe. Cumprir cada etapa não como uma obrigação, sem preocupação com o tempo de cada uma, mas cumpri-las de forma que tenham bom êxito. O querigma tem que atingir o mais profundo do coração e da alma do catecúmeno, fazendo com que tenha uma verdadeira experiência de conversão ao Senhor, para, então, passar à segunda etapa, da catequese. Não há como se fazer um bom eco sem uma boa emissão inicial. Não há como se fazer uma catequese profunda sem uma conversão inicial verdadeira. Essa missão não deve ser limitada apenas aos catequistas, mas a todo o povo de Deus, que tem por chamado primeiro a santidade; santidade essa que só será alcançada e vivida em sua plenitude, se o mandato do Senhor de ir e evangelizar também for cumprido. Voz e eco, querigma e catequese, santidade e evangelização: aspectos da mesma e única vida de Deus.
Referências
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