CAPA
A I N XE A Ç N AANCESTRALIDADE FESR TO DE
Por Ana Sniesko
UM MANIF
“D
e jeito nenhum!”. Quem ouve Pra que me chamas? não imagina que essa foi a resposta de Xênia França para o primeiro convite para integrar uma banda. A negação, assim como a que ela recebeu do mercado da moda quando de sua chegada a São Paulo, em 2004, deu o tom e abriu os caminhos da música para essa voz guiada pela raiz e pela ancestralidade. Com o primeiro choro em Candeias e os primeiros passos em Camaçari, a baiana viu o sonho de virar modelo estampado na banca de jornal. Era ali, em uma capa de revista, que ela desejava estar. “Aquele pulo, que já não faz mais sentido, me trouxe para cá. Ainda bem que não deu certo”. Era o caminho no espaço e no tempo para receber dos céus o motivo da sua estada na Terra. As melodias, que antes eram ouvidas apenas pelos mais chegados, passaram a ter um novo sentido. “Sequer cantava por hobby. Uns amigos estavam sempre na minha casa, alguém puxava um violão e eu cantava.” E as-
sim, com toda essa simplicidade, ela demorou a entender que a música era o seu caminho. Quando finalmente aceitou o convite para soltar a voz, na sua frente se abriu uma trilha que parecia óbvia. Estamos em 2008, quando ela colocou seu timbre em covers, mas a sementinha do projeto solo estava ali, sendo cultivada. Pouco depois, Emicida cruzou seu caminho e outro convite apareceu. Veio a primeira gravação em estúdio, uma participação na faixa Volúpia, do EP Sua Mina Ouve Meu Rep Também (2010). “Nos conhecemos no VMB e muita coisa começou a partir daí”, relembra. Foi um passo para o encontro com o Aláfia começar a nascer. Única mulher em uma banda de 12 pessoas, Xenia aproveitou o palco e o microfone para entoar a sua força e se encontrar diante do público.
UM ROMPIMENTO
Corta para 2016. “Eu reuni tudo o que me tocou musicalmente na vida e que eu não consegui colocar para fora no
Aláfia, por mais que eu estivesse dando tudo de mim ali”. Dessa maneira, se despediu de um coletivo para ser única. A produção do seu disco começou em outubro daquele ano, 2017 foi de mergulho em letras, melodias e acordes para, em novembro, ele vir ao mundo. “E estamos falando dele até hoje”, se diverte ao constatar. O que mudou nessa trajetória? “Tudo! Eu tenho total autonomia, total direção do meu trabalho musical. Queria me sentir mais possível, no sentido de fazer um projeto musical que saísse totalmente de dentro de mim, desse momento de transição, desse portal por que passei”, conta. Numa banda, muitas cabeças pensam sobre cada detalhe e o espaço nem sempre é justo com todos. “Em todo esse tempo que passei no Aláfia, eu era apenas intérprete, já que todo mundo ali era compositor. Eu estava me sentindo menos, com aquele monte de gigantes compondo, mostrando que é genial e eu parecia um coelho acuado na parede, sem coragem de me expressar”, relembra.
Fotos: Filipa Aurelio / Divulgação
Voz, atitude e muito trabalho para fazer uma música respeitada por sua força e cada uma das suas palavras