JOYCE MARIA DOS REIS SANTANA - Feira De Santana, BA UMA SONATA NOTURNA A passos senis serena senhora batuca suave as pedras de concreto da nobre ladeira Oscar Carrascosa. Enquanto a Avenida Princesa Isabel observa o corpo frágil da mulher retirar do solo urbanos sons descompassados, contudo, graciosos, eu, que também amo as cores todas das sonoridades do mundo, tenho a alma assustada por um outro corpo, instrumento potente da família dos metais, um desafinado SUV. Tocando em tons distintos, timbres e intensidades opostas, os instrumentos chegam quase a chocar-se, desacelerando compassos, ralentando pulsações. A música assume um tom grave, quase tenebroso e ficam todos os timbres suspensos por uma pausa coordenada por fermata. O compasso seguinte é grotesco, imprevisível, abrupto. Disparam todos os músicos numa confusão de agudos e graves letrados por impropérios da escala menor. É que quando se perde harmonia e afinação no tocar, tateia-se aqui e ali em busca de um entendimento entre instrumentos, porém, a execução já pode estar comprometida. Perdeu-se a beleza do sereno batucar da marcha octogenária. Nem a Avenida Princesa Isabel se incomodou com o fim torto da melodia, nem tampouco a Maestrina Salvador disse palavra alguma, pois fora, há tempos, silenciada pelos demais instrumentos de sua orquestra litorânea. Quanto a mim, permaneço sensível à pluralidade sonora da descompassada capital.
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