Vulnerabilidade e o uso de drogas

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Observa-se que as teorias ora focam questões macrossociais (status socioeconômico, heterogeneidade étnica, desigualdade de renda, etc.), ora questões relacionadas às relações interpessoais (família, vizinhança, pares, etc.), ora questões relacionadas ao desenvolvimento psicológico. Gronde et al.10 comentam que a agressão violenta, como todas as formas de comportamento, se desenvolve tanto sob condições ambientais e psicológicas como também genéticas, apesar do modelo biológico ter sido recorrentemente negligenciado pelos estudiosos da área. Entretanto, sabe-se que há uma inter-relação entre esses fatores, assim, considera-se o modelo ecológico mais abrangente e mais condizente com a ideia de criminalidade de que se trata neste trabalho. Vulnerabilidade, criminalidade e homicídios As drogas podem ser estímulos mediadores de comportamentos sociais violentos. Seja pelos efeitos diretamente relacionados ao sistema nervoso, seja pelas consequências do comércio ilegal, contextos com drogas aumentam significativamente a probabilidade de ocorrências de eventos violentos. Cabe ressaltar que “a relação drogas-violência é muito complexa, podendo ter suas origens em fatores como personalidade, antecedentes familiares de dependência, fatores genéticos, características de temperamento, relacionamento familiar fragilizado, transtornos de personalidade e todas as circunstâncias sociais que predisporiam ao crime e à dependência química”5. Outros estudos relacionam aos homicídios a existência de mercados de drogas ilícitas, de demanda por bebidas alcoólicas e por armas de fogo. Esses estudos indicam que, por volta da década de 90, houve significativo crescimento no número de homicídios ocasionados pelo consumo de drogas ilícitas. Concomitantemente, houve aumento na demanda por armas, já que o mercado de drogas necessita da violência para garantir seus contratos. Constatou-se, por fim, que o aumento da demanda por armas e drogas era seguido nos anos seguintes pelo aumento expressivo no número de homicídios11. Esses autores trataram de outros temas como desigualdade social e taxas de efetivo policial, os quais não serão aqui abordados por não serem objeto deste trabalho. Ainda sobre homicídios no Brasil, o Mapa da Violência12 indicou que as vítimas mais comuns de mortes por armas de fogo são do sexo masculino, representando 94% na população total e 95% entre os jovens. Quando se trata exclusivamente de homicídios e considerando a cor da pele, têm-se quase três vezes mais homicídios de negros (28,5 homicídios por 100 mil habitantes) do que brancos (11,8 homicídios por 100 mil habitantes). Cabe ressaltar que esse estudo agrupou pretos e pardos na categoria negro. Os instrumentos letais que ocasionam tantas mortes são, em grande parte, provenientes do tráfico de armas, conforme já mencionado, que caminha emparelhado com o de drogas. De comum nesses contextos tem-se novamente o jovem negro. Em um trabalho de 2005 denominado Cabeça de Porco13, que reuniu o rapper MV Bill, seu produtor Celso Athayde e o antropólogo e cientista político Luiz Eduardo Soares, emergiu a compilação de vários elementos que levam a uma reflexão bem apurada do universo da criminalidade, dessa vez sob o olhar do jovem, especialmente o jovem negro. Observe-se o trecho a seguir: “Um jovem pobre e negro caminhando pelas ruas de uma grande cidade brasileira é um ser socialmente invisível. Como já deve estar bastante claro a essa altura, há muitos modos de ser invisível e várias razões para sê-lo. No caso desse nosso personagem, a invisibilidade decorre principalmente do preconceito ou da indiferença. Uma das formas mais eficientes de tornar

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