Consciência e Liberdade N.º 22 (2010)

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O que é a verdade? Émile Poulat*

“Eu sou o caminho, a verdade e a vida”, afirmou Jesus. Palavra do Evangelho. A Igreja cristã tirou uma conclusão fundamental: Fora d’Ele, é o impasse, o erro e a morte, quer para os indivíduos, quer para a sociedade. O Reino de Deus – a Cidade de Deus – começa aqui em baixo com a Igreja e na Igreja. “O que é a verdade?” É a pergunta de Pilatos, dos filósofos e dos modernos. Ela era um absoluto sobre a qual não se transige. Ela cai no relativo, perante questão de opinião, de apreciação, de julgamento pessoal. Cada um tem a sua ideia, de acordo com as suas opiniões. A sociedade deve adaptar-se-lhe para aceitar esta diversidade. O primeiro dos direitos do Homem e a sua pedra angular em nome da liberdade de consciência. Problema terrível: como conciliá-la com o princípio da realidade na vida e com o princípio da ordem na sociedade? A resposta vem do Direito e da ciência. Os juristas dizem-no em latim: “Dura lex, sed lex”. A Lei é a lei. Não se pode senão submeter-se a ela, transgredi-la ou contentar-se com ela. Ela já não é a expressão de uma vontade superior, mas a da vontade geral, pelo menos a da maioria. Cada um permanece livre de pensar o que quiser, mas deve conformar a sua conduta exterior com ela. Neste ponto, permanecemos os fiéis herdeiros do Antigo Regime, apesar da grande mudança que se operou: a “liberdade religiosa” foi adquirida e já não é a religião que está no coração dos litígios… Quanto à ciência, ela restabeleceu os direitos da objectividade e fez tábua rasa de tudo o que não respondia aos seus critérios ou não entrava nas suas categorias. Ela não pode constatar o milagre senão nas condições do laboratório. A alma não se encontra na ponta do bisturi, nem Deus na ponta do telescópio ou, como dizia Gagarine, na órbita do Sputnik. Dessa forma nasceu o conflito entre a Ciência e a Fé. A verdade da Ciência pregou a partida à verdade da Fé. Alguns autores apelaram a uma teoria de “dupla verdade”. Outros esperaram a falência ou a bancarrota da Ciência, ou, ao contrário, o fim da Religião. Uma literatura abundante, polémica ou apologética, ocupa as prateleiras das bibliotecas. Uma equipa inter-disciplinar da Universidade suíça de Zurique esforçou-se para agrupar as posições tomadas pelos cientistas perante a Fé e pelos 24


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