Consciência e Liberdade N.º 22 (2010)

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O Relativismo cultural: um perigo político Heinz Theisen*

A cultura dos contrários na Europa. A Europa é uma cultura de contrários, os quais se mantêm em equilíbrio através do jogo da reciprocidade estrutural. Em domínios de tensão como Religião e Política, Cristianismo e Luzes ou Estado e Mercado, a palavra “e” desempenha um papel determinante. Na Alemanha, por exemplo, a separação e a complementaridade da Igreja e do Estado coexistem desde o Jardim de Infância e a Escola. Este “e” europeu encontra raízes espirituais no Cristianismo. A expressão beneditina “Ora et Labora” (orar e trabalhar), com a sua reciprocidade entre o mundo interior e o exterior, espiritual e material, poderia ser considerada como a origem do Ocidente. A dialéctica cristã entre Deus e os homens, entre o amor a si próprio e o amor ao seu próximo, com o “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” lançou os fundamentos da diferenciação actual dos sistemas fundamentais da Religião, da Política, da Ciência, do Estado e da economia de mercado. Cada um deles segue a sua lógica própria mas deve igualmente completar os outros sistemas. 36

A liberdade de acção de que gozam estes diferentes sistemas apenas tornou possível a dinâmica das sociedades ocidentais. No ideal, a complementaridade destes contrários deveria conduzir a uma reciprocidade de motivações espirituais e materiais, entre moral e interesse e entre o bem pessoal e o bem comum. Mas as tensões e reciprocidades produtivas entre estes diferentes domínios estão sempre ameaçadas pela parcialidade totalitarista ou a dissolução relativista. Se se renuncia à tensão entre religião e valores esclarecidos, a cultura europeia falha. Onde as relações de força entre a religião e mundo são negadas, como no caso do relativismo, ou combatidas, como no totalitarismo, está em risco de se perder esse “e” e, com ele, a identidade da Europa. O relativismo e o totalitarismo têm em comum, como todos os extremismos, a rejeição da reciprocidade. A dissolução crescente das reciprocidades na Europa fez nascer o homem bem pensante que nega o pecado e a culpabilidade, e também, a responsabilidade do ser humano. Como ele considera quase todos os homens como vítimas da “descriminação”, renuncia à reciprocidade: isso explica a ausência


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