acabou por se fazer entrado na casa de D. Rita, com desgosto dos seus habitantes, que assim se viam esquecidos do anfitrião. Nóbrega, entretanto, dera ordens bastantes para que fossem todos servidos e agasalhados, como se ele estivesse presente. A ausência não lhe faria perder as loas dos amigos. Ao contrário, os servos podiam dar testemunho do que todos eles pensavam do “grande homem”. Tal era o nome que lhe aplicara o secretário particular, e pegou. Nóbrega sabia pouca ortografia, nenhuma sintaxe, lições úteis, decerto, mas que não valiam a moral, e a moral, diziam todos, acompanhando o secretário, era o seu principal e maior mérito. O fiel escriba acrescentava, que sendo preciso despir a camisa e dá-la a um mendigo, Nóbrega o faria, ainda que a camisa fosse bordada. Agora mesmo, este amor era, ao cabo, um movimento de caridade. Em pouco tempo, aquele gosto de relance passou a grande paixão, tão grande que ele não a pôde conter, e resolveu confessá-la. Hesitou se o faria à própria moça ou à dona da casa. Não tinha ânimo para uma nem outra. Uma carta supria tudo, mas a carta pedia língua, calor e respeito. Se, ao menos, o gesto de Flora lhe dissesse alguma coisa, ainda que pouca, vá; a carta seria então uma resposta. Mas não lhe dizia nada o gesto da moça. Era só cortês e gracioso; não ia além dessas duas expressões. D. Rita percebeu a inclinação de Nóbrega e achou que era a melhor solução da vida para a hóspede. Todas as incertezas, angústias e melancolias vinham acabar nos braços de um ricaço, estimado, respeitado, dentro de um palacete com uma carruagem às ordens... Ela mesma punha em relevo este prêmio grande da loteria de Espanha. Enfim, o secretário de Nóbrega redigiu com a melhor linguagem que possuía uma carta em que o capitalista pedia a D. Rita o favor de consultar a moça amada. — Não escreva palavrinhas doces, recomendou ele ao secretário. Gosto dessa moça com um sentimento de proteção, antes que outra coisa. Não é carta de namorado. Estilo grave... — Uma carta seca, concluiu o secretário. — Totalmente seca, não, emendou Nóbrega, uma carta lisonjeira, sem esquecer que não sou criança. Assim se cumpriu. Ia a cumprir-se demais; Nóbrega achou que o estilo podia ser um tanto ameno; não fazia mal pôr duas ou três palavras apropriadas ao objeto, beleza, coração, sentimento... Assim se cumpriu finalmente, e a carta foi levada ao seu destino. D. Rita ficou contentíssima. Justamente o que ela queria. Tinha o plano feito de concluir, por
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