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Bento XVI evoca, neste discurso, um acontecimento histó rico que repercute o dilema com que vive um cristão envolvido na politica: saber se seguir os ditames da sua consciência, moldada pela sua opção religiosa, ou se adotar as decisões polít icas, mesmo que cont rárias à sua consciência. Tomás More (Inglaterra, 1478 - 1535) que é, desde 31 de outubro de 2000, por mot u próprio de João Paulo II,o patron o dos polít icos, optou por seguir a sua consciência, o que lhe valeu a condenação à morte . Este dilema real tem raízes prof undas na história da reflexão sob re esta dif iculdade de relação entre a polít ica, a ét ica e a religião. Já na Tragédia grega de Sófocles, Ant ígona, de que se fala no início desta unidade, se ret rata a história da protago nista que dec ide seguir a sua consciência e cumpr ir O seu dever religioso de enterrar o cadáver do seu irmão , apesar de ordem contrária do rei Creonte.
3.1. A ética como critério de leitura da qualidade da democracia Bento XVI constata, ainda, que a apreciação positiva do papel da democracia não pode fazer esquecer que ela se deve impor a si mesma um limite: o da anterioridade da ética. Não é a democracia que def ine o que é bem e o que é mal. Antes, cabe-lhe respeit ar que essa noção moral lhe é prévia. A este propósito , valerá a pena refletir sobre dois modelos de democ racia evocados por António Barbosa de Melo, no prefácio a um livro que se debruça sobre o tema discut ido nesta unidade letiva.
"O livro de Zagrebelsky [que foi presidente do Supremo Tribunal de Justiça Italiano], A crucifixão e democracia, tem por tema nuclear a ideia de democracia que o Autor designa como democracia crítica, contrapondo-a, nas palavras do próprio, tanto à democracia dogmática, como à democracia cética. A primeira, a democracia crítica , assenta no reconhecimento de que «todos os seres humanos e o povo no seu conjunto são necessariamente lim itados e falíveis». Assume-se como sistema polít ico imperfeit o ou, mais rigorosamente, como sistema que tira a sua força da imperfeição humana: o poder supremo do povo para orientar o governo da res publíca é Iímit ado, desde logo porque em cada uma das suas decisões vai supost a a possibilidade de ela ser melhor e de o melhor ser um objetivo a perseguir constantemente. t: um sistema que obriga a fazer e refazer continuamente as decisões públ icas em conson ânc ia com o curso das coisas . A democracia crítica postula, por outras palavra s, a permanente reversibilidade, revogabilidade e revisibi lidade das dec isões públicas. Não dá lugar a absolutizações. [...] Por isso mesmo, o poder político, no quadro da democracia críti ca, não pode arrogar-se competência para tomar decisõe s por natu reza irreversíveis ou de consequências irreversíveis (aplicação da pena de morte, destruição dos recursos amb ientais, limitados e não renováveis, etc .). Pelo contrário, as versões não crít icas da democracia , sejam elas céticas ou dogmáticas, segundo o Auto r, não reconhecem limites ao poder do povo: as dogmáticas, porque, acreditando os seus adeptos na verdade, a consideram consub stanciada no voto popular; as céticas, porque os seus cultores se confo rmam com a ignorância da verdade e desta ignorância deduzem que ao povo tudo é permitido." Me lo, Antó nio Barbosa de, prefácio a Zagre be lsky, Gust avo, 2004, A cruciti cocã c e a democra cia, 'renecrtas .
o autor deste prefác io. que foi presidente da Assemb leia da Repúb lica, ent re 1991 e 1995, evoca o pensamento de Gustavo Zagrebelsky para reco rdar três t ipos de democracia , sendo que dois deles são seme lhantes nas suas conseq uênc ias: • democracias céticas e dogmáticas. que presumem que não há limites para o exercício do poder do povo, adm it indo a sua competência para decidir. mesmo sobre o bem e o mal. • democracias c ríticas, que presumem a condição limita da do ser humano e que, por isso, auto limitam o poder de decisão do povo , acolhe ndo que não podem toma r-se dec isões que sejam irreversíveis, por se basearem no pressuposto de um pode r abso luto . que as demo cracias críticas não admit em.
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Politica. t.tica e Religião