Opinião Renato Carreira PA R T N E R D E LO I T T E
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Novas regras de tributação de automóveis usados importados*
á sabemos que os automóveis são uma fonte de receita tributária muito relevante para o Estado e apenas em situações muito particulares temos assistido a reduções da carga fiscal. Temos impostos para todos os gostos que incidem sobre a aquisição e utilização dos automóveis e a tendência é que, uma vez introduzidos, dificilmente são eliminados ou mesmo reduzidos. No entanto, há fatores externos que, em determinadas ocasiões, obrigam o Estado a ajustar em baixa o seu “apetite” pela cobrança de impostos. Foi isso mesmo que se verificou numa recente decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia, que concluiu que as regras do Imposto sobre Veículos (“ISV”) contrariam a legislação comunitária, ao imporem, ao registo em Portugal de carros usados transferidos de outro Estado-Membro da União Europeia, regras similares às aplicáveis ao registo de carros novos no nosso País. Assim, e depois de um processo relativamente longo de disputa judicial com a Comissão Europeia, o Estado português teve de aceitar rever aquelas regras. Esta revisão assume particular relevância, uma vez que mais de um terço dos carros que são anualmente matriculados em Portugal correspondem a viaturas usadas que já se encontravam em circulação noutros países. Para dar resposta à referida decisão judicial, o Governo incluiu na proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2021, recentemente apresentada na Assembleia da República, uma alteração ao Código do ISV onde propõe que a fórmula de cálculo do
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imposto incidente sobre veículos transferidos de outro Estado-Membro da União Europeia (e que aí estivessem matriculados) para Portugal seja alterada no sentido de contemplar uma desvalorização (“percentagens de redução”) relativa à componente ambiental, a qual se encontra indexada à idade do veículo em causa. Esta desvalorização apenas estava prevista para a componente cilindrada do imposto. A referida alteração agora proposta pode gerar uma redução do valor do ISV a pagar, no momento da legalização/matrícula destes veículos em Portugal, muito significativa, dependendo da idade do veículo e das emissões de CO2 do mesmo. Os quadros da página seguinte ilustram três exemplos práticos onde comparamos as atuais e as novas regras agora propostas pelo Governo.
O impacto das novas regras do ISV será tanto maior quanto mais antiga for a viatura transferida de outro Estado-Membro da União Europeia, maior for a cilindrada ou mais elevado for o teor de emissões de CO2
Importa salientar que os exemplos apresentados se referem apenas ao impacto da redução do ISV aplicável à transferência de carros usados de outro Estado-Membro da União Europeia, dado que as regras se mantêm inalteradas para as viaturas importadas de países terceiros. Ainda assim, tendo origem na União Europeia a grande maioria dos carros usados que são matriculados em Portugal, merece realce que as novas regras propostas podem, de acordo com os cálculos efetuados, representar um corte neste imposto superior a 60% em alguns casos. No exemplo apresentado referente a carros transferidos de gama média-baixa a gasóleo, o valor da poupança poderá variar entre os 17 e os 612 euros, representando este último valor uma redução do ISV na ordem dos 50%. Já no exemplo de um carro de gama média-alta a gasolina, o nível de poupança começa nos 24 euros e vai, tal como nos restantes cenários, aumentando conforme a antiguidade do carro, até atingir uma redução de ISV de 841 euros (o que permite reduzir em 40% o imposto a pagar). Mas a redução é mais expressiva no exemplo de um carro desportivo de luxo, em que a poupança varia entre 1.284 e 44.929 euros. Neste caso, a carga fiscal sofre uma redução, em comparação com a que se verifica atualmente, entre os 2% e os 66%. Podemos assim concluir que o impacto das novas regras do ISV será tanto maior quanto mais antiga for a viatura transferida de outro EstadoMembro da União Europeia, ou seja, nos carros mais recentes a redução do ISV a pagar, quando comparado com o imposto que é hoje devido, será menor, aumentando tal diferença à medida que o número de anos da viatura também aumenta. Ainda que esta alteração não provenha da vontade do Governo português e tenha por base preocupações de tratamento igual no espaço europeu, não deixa de contrastar com a atual tendência da crescente inclusão de objetivos ambientais na fiscalidade. (*) Transferidos de outro Estado-Membro da União Europeia