Opinião Miguel Vassalo C O U N T RY M A N AG E R A U TO R O L A
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Será o azul o novo verde?
s veículos 100% elétricos estão gradualmente a conquistar o seu espaço e prometem substituir, dentro de alguns anos, o motor de combustão interna, à medida que fazemos a transição para formas ecologicamente mais sustentáveis de transporte. No entanto, quando nos anos 90 a indústria automóvel intensificou a sua pesquisa para encontrar alternativas aos combustíveis fósseis, o hidrogénio foi também considerado como uma opção viável. E até hoje, ambas as linhas de investigação têm feito o seu caminho em paralelo. Na realidade, as duas tecnologias assentam na propulsão através de motores elétricos, mas enquanto o 100% elétrico é alimentado por baterias de iões de lítio, o outro utiliza pilhas de combustível para transformar hidrogénio em eletricidade. Além de ser o elemento mais abundante no universo, o potencial do hidrogénio como uma fonte de combustível limpa é inquestionável. Na verdade, até já está comercialmente disponível em vários países como o Japão, Estados Unidos e Europa, ainda que, com um nível de adoção muito baixo devido à atual limitada infraestrutura de abastecimento e elevado custo de aquisição. Em 1994, a Daimler apresentou um dos primeiros protótipos de um veículo comercial utilizando a pilha de combustível: O NECAR 1. Mas foi preciso esperar 20 anos para que o Toyota Mirai fizesse história, ao ser o primeiro veículo de passageiros de produção em série a utilizar esta tecnologia. Desde então, outros fabricantes se seguiram na exploração do seu potencial, como a Honda, Hyundai e as Chinesas SAIC e Grove. O hidrogénio tem, desde logo, duas grandes vantagens sobre os combustíveis fósseis para aplicações no âmbito da mobilidade. A energia
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libertada através da oxidação produz apenas água como resultado. E é infinitamente renovável, pelo menos enquanto o sol brilhar. Mas tem outras. Sem querer ser exaustivo, menciono apenas algumas: o veículo de passageiros típico equipado com célula de combustível tem tempos de abastecimento e níveis de autonomia comparáveis com os motores de combustão interna. Energeticamente é também mais eficiente do que o motor de combustão interna, ainda que, neste campo, esteja hoje ainda aquém dos 100% elétricos. Apesar disso, comparativamente com os 100% elétricos, esta tecnologia permite armazenar energia, para a mesma autonomia, em elementos mais leves e menos volumosos. No entanto, grandes desafios técnicos e infraestruturais se colocam. A produção de hidrogénio pode derivar de várias fontes primárias de energia (Carvão, Gás Natural, Biomassa, Solar, etc.), mas é um processo industrial complexo e dispendioso. A jusante, a construção de uma infraestrutura de distribuição completa e capilar para o fornecimento de hidrogénio é um investimento colossal e um enorme desafio logístico, do qual dependende uma ótica económica assente na procura, que facilmente esbarra no paradoxo do ovo e da galinha. Adicionalmente, o elevado custo de fabricação de um veículo a hidrogénio está principalmente relacionado com o custo dos materiais usados na produção da pilha de
combustível, nomeadamente os catalisadores e outros metais nobres utilizados como a platina. No presente, os 100% elétricos estão em vantagem, graças à sua mais elevada eficiência energética e, de alguma forma, por terem a capacidade de tirar partido da infraestrutura existente. Uma vantagem competitiva do ponto de vista de custos que fez desta a tecnologia escolhida para uma produção acelerada em massa, garantindo assim o cumprimento das crescentes restrições sobre as emissões de CO2 de uma forma mais rápida e fácil. Assim, é provável que nos próximos anos o hidrogénio se mantenha uma tecnologia de nicho nos veículos de passageiros, ainda que bastante mais prometedora, a curto prazo, para veículos comerciais e transporte marítimo e aéreo. Vai ser interessante seguir o duelo à medida que o avanço científico decorre em ambas as tecnologias. Continuar a estudar comparativamente o ciclo de necessidades energéticas, impacto ambiental e custos, desde a produção da energia até à reciclagem, passando pela cadeia de distribuição de combustível e produção automóvel, que hoje pendem a favor do 100% elétrico. Finalmente, não nos esqueçamos também que uma motivação subjacente para promoção do hidrogénio e produção da pilha de combustível é originada pela procura de independência do petróleo, nomeadamente no Japão, e não só necessariamente devido a questões de sustentabilidade ambiental. Portanto, o acesso à matéria-prima e a política industrial dos países influenciará decisivamente a agenda tecnológica do futuro.
Uma motivação subjacente para promoção do hidrogénio e produção da pilha de combustível é originada pela procura de independência do petróleo, nomeadamente no Japão, e não só necessariamente devido a questões de sustentabilidade ambiental