Monumento e Acidente | TFG FAUUSP 2021

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– “superestrutural”. Como observou Brian Larkin, em Promising Forms: the Political Aesthetics of Infrastructure (2018), 61. Brian Larkin, “Promising Forms: the Political Aesthetics of Infrastructure”, in: Nikhil Anand, Hannah Appel, Akhil Gupta (eds.), The Promise of Infrastructure (Durham: Duke University Press, 2018), p. 178

62. Keller Easterling, Extrastatecraft: The Power of Infrastructure Space (Nova Iorque: Verso, 2014), p. 10

s infraestruturas possuem uma afinidade eletiva com essa A concepção [materialista], na medida em que elas são frequentemente vistas como uma tecnologia primária sobre a qual a forma é construída. (...) Existe aqui uma relação linear. A infraestrutura é primária; a forma, secundária61

Além do mais, a condição urbana das grandes cidades contemporâneas parece cada vez mais desafiar a tradicional interpretação de um espaço infraestrutural distinto e subordinado a um espaço figural. O acúmulo infraestrutural (a variedade e a densidade das “camadas” infraestruturais que irrigam um sistema urbano, da fibra ótica ao transporte ferroviário) não apenas parece se intensificar em um ritmo muito superior ao da demografia dos “objetos arquitetônicos”, como a paisagem infraestrutural que resulta desse acúmulo cada vez mais se confunde com a paisagem “figurativa” da cidade: a infraestrutura se torna a forma urbana por excelência. Como muito se falou nas últimas décadas da crítica arquitetônica, dessa espécie de “reversão” hierárquica parece resultar, de um lado, uma progressiva homogeneização dos aspectos formais e expressivos das cidades (dado o caráter genérico e padronizado dos sistemas infraestruturais), e de outro, uma gradual destituição dos tradicionais agentes “discursivos” da produção urbana (sobretudo arquitetos e planejadores) de sua autoridade sobre a paisagem das cidades. Como escreveu Keller Easterling, o espaço infraestrutural contemporâneo se torna o mais novo “assassino” da arquitetura e do urbanismo: gora, não apenas edifícios e parques corporativos, mas cidades A globais inteiras são construídas de acordo com uma fórmula – uma tecnologia infraestrutural. Nós não construímos mais cidades acumulando obras-primas singulares de edificação. Ao invés, a fórmula mais prevalente [é a que] replica Shenzen ou Dubai em qualquer lugar do mundo com uma bateria de arranha-céus genéricos. (...) a infraestrutura não é, nesse caso, a subestrutura urbana, mas a estrutura urbana em si – os próprios parâmetros do urbanismo global62

Mas mesmo quando não falamos exatamente do fenômeno das cidades globais (onde a ideia de “espaço infraestrutural” sugere, acima de tudo, tendências de homogeneização e padronização), uma consideração profunda de qualquer fato “infraestrutural” requer uma reorientação crítica e um distanciamento das tradicionais oposições entre infraestrutura e arquitetura, fundo e figura, objetos técnicos e monumentos etc., que há muito tempo mediam a discussão sobre as cidades. Em outras palavras, é preciso operar, nos estudos urbanos, um exercício 147


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