Monumento e Acidente | TFG FAUUSP 2021

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26. Barthes, R. (2004), p. 58 27. Ibid., p. 61

28. Id., (2007), p. 12

a rigor, se pode admirar a performance (isto é, o domínio do código narrativo) mas nunca o ‘gênio’”26. Este é, acredito, o primeiro grau de autonomia da arquitetura enquanto texto. Nós a encontramos nas ideias de autor e de autoria: termos que, aliás, podem ser substituídos desde já por aquilo que Barthes, na crítica literária, chamou de escritor, ou escritura, pois “o escritor moderno [em oposição ao autor] nasce ao mesmo tempo que seu texto; não é, de forma alguma, dotado de um ser que precedesse ou excedesse a sua escritura, não é em nada o sujeito de que seu livro fosse o predicado; outro tempo não há se não o da enunciação, e todo texto é escrito eternamente aqui e agora”27. Isto é, este primeiro grau de autonomia nos diz que no texto está contido o desígnio de uma autoridade imanente (em oposição à transcendência da “linguagem”), uma determinação a praesenti que não tem origem se não nela mesma, pois ela é o próprio ato da enunciação, da escritura. Dito isso, penso haver, ainda, um segundo grau de autonomia do texto; um que acabamos de sugerir implicitamente, e que decorre inevitavelmente do primeiro. Como vimos, este último postula a autonomia da mediação (escritura) dos signos do texto em oposição à sua origem (sistema). Dissemos, assim, que a mediação dos signos confere ao texto uma certa autonomia com relação ao seu sistema de determinações, justamente porque essa mediação, ou interlocução, da linguagem se realiza sempre externamente (não confundir com “independentemente”) a ela – ou seja, nas contingências do próprio espaço social da comunicação. Além do mais, dissemos que essa mediação acontece no que chamamos de autor ou escritor, que para Barthes não é apenas um “mantenedor de uma função ou o servidor de uma arte, mas o sujeito de uma prática”28. A nossa segunda observação, por outro lado, diz respeito ao lugar concreto da comunicação, ao próprio espaço pelo qual percorrem os signos. É que há na ideia de comunicação algo além do simples deslocamento ou mediação de significado, além mesmo da dimensão “intersubjetiva” que descrevemos há pouco. Na verdade, como apontou Jacques Derrida, a comunicação implica um modo de existência do signo que escapa inteiramente à significação; uma dimensão que é inexprimível fora do evento concreto no qual o signo se consuma: ra, a palavra comunicação (...) abre um campo semântico que O precisamente não se limita à semântica, à semiótica, ainda menos à linguística. Pertence ao campo semântico da palavra comunicação o designar de movimentos não-semânticos. Aqui um recurso ao menos provisório à linguagem vulgar (...) ensina-nos que se pode, por exemplo, comunicar um movimento ou que um abalo, um choque, um deslocamento de força pode ser comunicado – entenda-se, propagado, transmitido. (...) O que se passa, então, o que é transmitido, comunicado, não são fenômenos de sentido ou de significação. Não se trata nesses casos nem de um conteúdo 33


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