O Caleidoscópio da Vida

Page 1

1


ÍNDICE • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • •

Introdução e Agradecimentos Análise da Sensibilidade Feminina Intuição A grande Batalha Acalanto A Dor do Desejo Incredulidade Liberdade Escolhas Nem Mais, Nem Menos O Medo como Guia Carta ao Vento Exílio Perdão Compreensão O Mito da Opressão A Magia do Encontro Almas Gêmeas Afabilidade e Doçura Purificação Comunicação Desencontro Por Que é Bom Estar Apaixonado Regresso Quando o Silêncio é Ensurdecedor Desalento Dar um Tempo Elo Perdido Despertar Faces Femininas É Sempre Primavera E Viva a Vida! Esperança e Paciência Tempo Felicidade Plenitude Ilusão Sombra Minha Integração O Caleidoscópio da Vida Maturidade Cuida de Mim Eu e o Outro Uma Segunda Chance Inverno

3 4 6 7 8 9 10 11 12 13 14 16 17 18 19 20 22 23 24 25 26 28 29 30 31 32 33 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 46 47 49 51 52 54 55 56 2


• • • • • • •

Primavera Amor Ainda sobre o Amor Noite Mágica Celebração A Teia Página em Branco

57 59 60 61 62 63 64

3


Introdução e Agradecimento

O ato de escrever é uma forma de conversar com as pessoas. Eric Nepomuceno Todos nós já tivemos momentos em que somos arremessados a um lugar acolhedor e sereno. Nele sentimos um bem estar indescritível, uma paz e lucidez completa. São rápidos momentos que deixam impressão permanente e forte. Por algum tempo, podemos vislumbrar nossa essência, força e sabedoria. Ao retornarmos, guardamos as impressões vividas, que, no momento oportuno, serão acessadas e teremos então discernimento para tomar uma decisão, exercer a compaixão ou, pacientemente, atravessar um momento difícil, ou enfrentar um desafio. São portais de acesso à alma, a revelar conhecimentos, ensinamentos e lições que nos ajudam na caminhada terrestre. Compartilhar impressões e sentimentos aflorados é a proposta deste livro. O Caleidoscópio da Vida é a expressão do transbordamento de inquietações, emoções e sensações, semelhantes às de tantas outras almas, que igualmente estão na jornada do viajante, na Mãe Gaia, e que nunca se satisfazem com as respostas, pois sabem que a vida é feita de perguntas. Agradeço ao Pai do Céu, à Mãe da Terra, aos Mestres, Guias, Ancestrais, Orixás, ao meu Anjo da Guarda, por estarem sempre presentes em minha vida. Agradeço às amigas Jussara Landim, Aparecida Gico e Helena Santos, por me encorajarem a realizar esta obra. À amiga e irmã Gerusa Leal, pela paciência de comentar os meus textos, e pela generosidade de me enviar tantos artigos e mensagens que me serviram de inspiração. Ao escritor Paulo Dantas, por ter me auxiliado nas questões práticas de edição e divulgação. Agradecimento especial à União Brasileira de Escritores, na pessoa de seu Presidente, Vital Correa, pelo acolhimento e disponibilidade oferecidos a uma calora, e pelo generoso prefácio. Dedico este livro a Gilmar Crisóstomo da Silva, por ter propiciado a abertura dos portais da afetividade que permitiram ativar minha criatividade; a meu pai, por ter me estimulado a apreciar a leitura.

4


Análise da Sensibilidade Feminina O Caleidoscópio da Vida, da escritora Virgínia Leal, que tenho a honra de apresentar ao leitor ou leitora, é um livro que, se fosse uma pessoa, estaria andando na beira de um fio de navalha, porque, de gênero difícil de classificar, facilmente pode-se dizer o que ele não é, mas os limites entre análise psicológica, existencial e crônica literária são exíguos. Não é meramente um livro de auto ajuda, não é um livro de ficção, nem de poesia. São crônicas ilustradas de poemas. Mas não crônicas comuns, cujo tema seja um assunto banal, transformado pelo cronista numa matéria cheia de ângulos esquisitos e bem humorados ou satíricos; seja uma notícia séria, quase decodificada e destroçada com as pinças da sátira e com os bisturis do humor ou alicates da mordacidade. As crônicas da escritora Virgínia Leal têm uma temática e um tratamento igualmente sérios, apenas usa o lirismo puro ou escondido em linguagem de rigor científico para expressar intimamente, de modo racional, o seu ponto de vista, a sua receita (não recado) de uma pessoa psicologicamente experiente e intuitivamente sensitiva, nunca de um âmbito confessional, mas generalizadamente, sem perder-se nas abstrações, sempre mantendo em rédeas curtas o controle estilístico, o urdume do desencadear do tema. Isso merece louvor, porque muitos naufragam completamente nesse mar encapelado e perigoso – nesse mare tenebroso – e Virgínia singra sã e salva, e já na outra margem, no fim do livro, acena vitoriosa. A linguagem conotativa, que enriquece um sistema de significação, numa estrutura de dois planos, o do significado e o do significante, ou plano do conteúdo e da expressão, essa linguagem, em voltagem máxima, está bem presente no texto gerado por Virgínia, o que implica um universo cultural em que a autora se move com lanheza e segurança. Sua formação de advogada e seu ofício consubstanciam essa capacidade, catalisada pela filosofia existencialista que detém, formal ou informalmente obtida, quem sabe nas fontes da própria vida, nas reflexões atiradas sobre os fatos, medindo suas consequências e causas? A riqueza interpretativa, a mesa repleta de significações que Virgínia prepara para deleite dos leitores que – como num self-service – escolhem o que mais lhe apetecem, ajuda ou se aplica – advém de uma curiosa e incisiva utilização magistral da linguagem, em sua potência conotativa, a única que permite extrair dos seus textos lições psicológicas, existenciais, pessoais. A matéria literária é cultural. Escritores como Virgínia Leal extraem do mundo elementos e com eles representam totalidades e constroem situações, que para sua decodificação exige um esforço inteligente e criativo do leitor. Ao mesmo tempo, ela ajuda, a quem lê, iniciar o processo de reconstrução do seu

5


universo psicológico e por extensão cultural. Isso é o objetivo máximo de qualquer escritor, especialmente os que adotam um gênero complexo, híbrido, como este: crônica psicológica acoplada à poesia. Vital Correa de Araújo Presidente da UBE

6


INTUIÇÃO Penso 99 vezes e nada descubro. Deixo de pensar, mergulho no silêncio e a verdade me é revelada. Albert Einstein Não há informação mais verdadeira e poderosa do que a intuição. Ela abre o canal de acesso à sabedoria interior e revela conhecimentos provenientes da alma, na vasta biblioteca da vida. A grande dificuldade em lidar com ela é assimilar o que está sendo transmitido da forma mais genuína possível. Precisamos que a mente traduza a percepção, e corremos o risco de impregnar a fonte com nossas crenças, ideias pré-concebidas e preconceitos. Queremos preencher as lacunas, que a percepção faça sentido segundo nosso entendimento do que é certo, correto, aceitável e tolerável. Aí deturpamos a mensagem, nos distanciando da verdade. Às vezes, a percepção vem clara, mas a rejeitamos ou a ignoramos por não ser a resposta que queremos. Acolher a intuição importa em não fazer nenhum julgamento do que nos é revelado, para que a cortina de fumaça sobre ela seja dissipada, e cada vez mais possamos ouvir com clareza o que está sendo transmitido. Para que isso ocorra, não devemos negar nossas sombras, tendências e inclinações, nossos medos, mas permitir amorosamente que se exponham, que venham à tona, para conhecê-los sem julgamento, pois só assim poderemos ver o que está oculto, e entender como eles nos afetam, pois nossas ações e reações, muitas vezes, são comandadas por eles. A intuição é um sinal de alarme, é a alma tentando nos mostrar algo que nosso ego desconhece, algo que precisamos entender, aceitar ou viver. Ela se manifesta da forma mais inesperada, normalmente quando estamos descontraídos. Quando não lhe damos ouvido, ou não a aceitamos ou não a entendemos, distanciamo-nos de nosso caminho espiritual, dificultamos o aprendizado, perdemos o equilíbrio e isso é refletido no campo emocional, no comportamento e na convivência com os outros. Confiar na intuição é estar em perfeita harmonia com nosso mestre interior, no Divino em nós, confiando em sua condução, por mais estranho, absurdo e assustador que, no primeiro momento, possa parecer. Deus só dá asas a quem sabe voar, e neste voo devemos conquistar a habilidade de transitarmos em nossa jornada com sabedoria, para que não percamos a oportunidade de ver do alto a beleza que a vida nos descortina.

7


A Grande Batalha O conflito aparentemente insuportável é uma prova de retidão de sua vida. Uma vida sem contradição interna ou é apenas meia vida ou é uma vida no Além, destinada apenas aos anjos. Mas Deus gosta mais dos seres humanos do que dos anjos. Jung Nas várias atividades cotidianas, procuramos estar sempre prontos para encontrar saídas e soluções em questões que exigem de nós discernimento. Quando os desafios estão no campo afetivo, entretanto, nem sempre nos sentimos habilitados para enfrentá-los. Não percebemos que a grande batalha é travada dentro de nós, quando a mente quer assumir o comando e dissociar-se da alma. Esquecemos que não somos o que pensamos, e ignoramos as mensagens do nosso Ser, que não aceita ser aprisionado. O ruído dos pensamentos interfere na expressão da alma, causa emoções perturbadoras e sinalizam o erro da conduta. Então, nos sentimos perdidos, confusos, angustiados. Como restaurar o equilíbrio, restabelecer o silêncio, para ouvir a voz interior? Quem já passou por essa experiência sabe do que estou falando. Por um instante, a iluminação chega, para logo em seguida ser afastada pelas trevas dos pensamentos descontrolados. Não queremos mergulhar na escuridão das sombras, por medo de não saber mais encontrar o caminho de volta à luz. Esquecemos que para chegar à luz precisamos atravessar o escuro. A desconexão com o Eu verdadeiro nos deixa à deriva, ao sabor de pensamentos e emoções contraditórias, que não se comunicam, não entram em harmonia, consomem toda energia e leva-nos à exaustão, tanto física quanto psicológica e emocional. Não há muito o que fazer, a não ser viver o processo e procurar toda a ajuda possível para atravessar a crise, em busca de clareza. Sermos amorosos com a experiência, com todas as partes que não queremos ver ou acolher. Exercitar o desapego das crenças que não mais nos servem e facilitar o seu processo de morte ou transmutação. O resto é tarefa do tempo, e a paciência nos dará a perseverança no Caminho, por saber que após a noite, por mais escura que seja, sempre haverá um novo dia.

8


Acalanto Nada a dizer, nada a fazer, nada a entender, Só resta o silêncio. Amargas lições, rasgando o peito, sem dor, só torpor: Coração gelado. Tudo está quieto, nada mais importa, enfim veio a resposta do que nunca perguntei. Duras revelações do que sempre neguei, e agora que sei, estou ausente de mim. Tivera eu a coragem de continuar a lutar, encontraria vantagem no ver, ouvir e calar.

9


A Dor do Desejo Se você quiser que as coisas venham até você, saia do meio do caminho e deixe que elas se aproximem. Velho provérbio Zen Desejo e dor caminham juntos. Quem deseja tem pressa, sofre pela espera, pela incerteza de alcançar o que quer. É apego, é obstinação. Quando queremos, concentramos toda energia para obter o desejado, e perdemos o discernimento. O medo de não ter o que ansiamos muitas vezes nos paralisa, nos desnorteia. Não sabemos como agir. Ele nos aprisiona, o corpo sofre, a alma anseia, suspira. Quando estamos próximos de alcançar, receamos não sermos merecedores daquilo que tanto planejamos. Tememos que tudo tenha sido um equívoco, que, ao obtê-lo, não o desejaremos mais. Por outro lado, enquanto desejamos, deixamos de viver. Nada mais tem prazer ou sabor, tudo se resume em alcançar o que ansiamos. Mais doloroso que o medo de não obter o que almejamos, é o temor de perde-lo após consegui-lo. Desejar importa no medo de perder. Querer é projetar nossa felicidade em algo fora, e aí esquecemos de nós mesmos. Não há prazer maior do que realizar um desejo, mas assim como tudo que nos torna dependentes, ao consegui-lo queremos mais e mais, com tanta intensidade e prazer que estamos sempre insatisfeitos. Premido pela busca de atingir nossas ambições, criamos situações, atraímos circunstâncias retardadoras de sua realização, pois assim podemos continuar alimentando a esperança e o sonho, enquanto sonho. Ir, conscientemente, em busca do que desejamos é um desafio; assumir as consequências, pagar o preço, prever os percalços, roer o osso, isso não queremos. E enquanto sonhamos, a vida passa, as oportunidades são perdidas, e continuamos vivendo a dor do desejo. E o que fazer para sair desse labirinto? Precisamos aceitar a possibilidade de não conseguir o que buscamos. Se confiamos na sabedoria da vida, não há por que se frustrar, certamente algo melhor nos espera. É preciso desejar sem apego, pôr em movimento a intenção e seguir o fluxo, percorrendo o caminho da flecha lançada, respeitando o ritmo dos passos. O desejo é o que nos move, o resto o tempo e a esperança se encarregam de realizar. Sem pressa.

10


Incredulidade Não acredito que não me queiras. O que foi feito dos beijos ardentes, do olhar doce e penetrante, das palavras cheias de emoção, da chama que ardia em teu corpo? É possível tudo ter evaporado, desaparecido, desintegrado? Rejeitas a cumplicidade, compreensão e aconchego? Onde ocultastes as lembranças, sentimentos e desejos? A nossa história, os bons momentos, o amor? Edificastes uma muralha que te separa de ti. Usas a tua força para fugir do que mais anseias. A quem queres castigar, punir? Não crês na felicidade por destino? Temes o que sempre sonhastes, destróis tua mais sublime edificação e crias sobre os escombros de teu coração. o que florescerá nas terras estéreis da desistência? Prefiro crer que estás adormecido, a aceitar a impossibilidade do sonho. Ver-te como um insano, a perder a esperança de cura. Não aceito que a mágoa corroa o carinho, o medo supere o amor o orgulho vença a ternura, que tudo foi um erro. Não acredito ... Não quero acreditar ... Creio que há por que lutar, acreditar, insistir. Que o amor é fonte da vida, e que um dia há de reviver em ti.

11


Liberdade Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém que não entenda. Cecília Meireles. Ela nem sempre está onde a buscamos. Usa disfarces, esconde-se, escapa, para que a procuremos. Às vezes, achamos que a encontramos, quando percebemos que o egoísmo usou sua máscara. Muitas vezes o desejo nos leva a vê-la onde só há inconsequência. Em outras, é o medo de experimentá-la que não nos deixa vê-la, mesmo quando esbarramos nela. Sabemos que somos livres, não porque nos sentimos bem e pensamos que estamos felizes. O caminho da liberdade pode causar desconforto, sofrimento e dor. A liberdade não nos traz nenhum estado de transe ou êxtase. Ela exige que estejamos muito presentes, verdadeiros e lúcidos. A liberdade, entretanto, não nos impede de sonhar. Não tolhe nossas aspirações e ideais. Mostra, entretanto, que o sonho, levado à sua realização, importa na responsabilidade de pagar o preço de sua conquista. Afasta as ilusões e mostra a verdade. Não há liberdade sem auto responsabilidade. Não sabe o que é liberdade quem nunca a buscou, quem jamais se deixou aprisionar. Ser livre é agir com a razão, a despeito do desejo que ilude. É o coração a seguir, quando a razão está guiada por preconceitos e medos. É ser coerente, é inclusive viver a incoerência para poder desmascará-la. Desapegar-se do desejo, do controle, dos resultados, tendo em mira um ideal maior; entender que nem sempre sabemos o que queremos e o que é melhor para nós; aceitar a ajuda e orientação; compreender a nossa conexão com o todo, seguir o fluxo da vida, tudo isso são facetas da liberdade. Invocá-la, para que abra as asas sobre nós e nos ensine a voar.

12


Escolhas O grande poder do ser humano está na sua capacidade de tomar decisões. Carlos Castañeda A vida é feita de escolhas. Escolhemos a alegria ou a tristeza, ofendermonos ou compreender, perdoar ou odiar, apreciar a chuva ou reclamar do dia nublado, chorar ou sorrir, viver ou morrer. A escolha consciente nos liberta, pois temos a verdade como escudo, a coragem como lança, o amor como guia, e a compreensão como bandeira. Qualquer escolha que façamos sempre atrairá um aprendizado. O importante não é acertar, mas optar por um caminho ou direção, tomar decisões, ter as rédeas do destino. A escolha consciente, entretanto, permite desenvolver o poder de discernimento e a capacidade de julgamento e percepção da realidade. Optar importa em respeitar a preferência do outro, deixar pessoas para trás, ser deixado a reboque, novas pessoas no caminho. A deliberação traz clareza do caminho escolhido, permite usufruir o melhor que ele pode ofertar, sem olhar para trás, sem lamentar o que teve que renunciar, e liberar o que não mais compartilha. Sabemos dos ônus e bônus. Quando não decidimos, a vida faz por nós, pois a omissão é também uma escolha. Fazer opções é saber que não estamos ao sabor dos ventos ou das circunstâncias, que podemos fazer nossa própria tempestade e também trazer a brisa suave do encanto de estar vivo, pleno, verdadeiro, inteiro e presente. Pois sabemos que, a cada dia, temos o poder de fazer outras escolhas e eleger novos critérios.

13


Nem mais nem menos Não me contento com menos, Quero tudo que a vida pode me dar. Não me fales de amores possíveis, a possibilidade é erva daninha frente ao sonho. Há alguém à minha espera, alguém que me deseja, para quem sou mais, sem, no entanto, achar-se menos. Alguém que não se contenta com menos, porque crê que merece mais. Alguém que não se ofusca com minha luz, porque tem luz própria. Que não se afasta ao ver o meu melhor, porque pode viver com o seu pior. Alguém que não tenho que ser menos, por receio de ameaçá-lo. Que me quer sempre mais, Que acredita que posso mais. Que acolha o meu menos, enquanto aprecia o meu mais. Alguém que se sinta livre para ser o seu melhor, sem abater-se com o seu pior. Com quem eu me sinta livre para ligar, só para ouvir sua voz, ou contar uma vitória, ou um momento ruim, sem receio de intimidá-lo. Alguém ao lado de quem sinta-me inspirada e queira inspirar a ampliação de horizontes e potencializar a luz, no mais e no menos. Nem mais, nem menos!

14


O medo como Guia Tentar e falhar é, pelo menos, aprender. Não chegar a tentar é sofrer a inestimável perda do que poderia ter sido. Geraldo Eustáquio. É triste constatar como não percebemos como somos guiados por padrões de comportamento que nos foram impostos e sequer questionamos. Será que uma relação, para ter esse nome, tem que ter o sentido de permanência? E se aquela pessoa veio na nossa vida apenas para um momento, para nos indicar o caminho em que encontraremos nossa Alma Gêmea? O que é a permanência diante da efemeridade da vida? Não há garantias de que nós vamos gostar de alguém, não vamos manter a relação só porque assumimos o compromisso de conhecê-lo. Podemos mudar de ideia. É preciso experimentar para saber o que se quer. Também não temos como saber se o outro vai gostar de nós, ou que sinta da mesma forma, na mesma intensidade. Medimos o interesse do outro pela frequência com que nos procura. De verdade, o tempo e a distância são instrumentos adequados para medir sentimentos? Não se pode assegurar que alguém nos ama, que se importa conosco, por estar sempre ao nosso lado. É possível confundir sentimento com controle ou dependência. Precisamos questionar se estamos sempre juntos de alguém porque queremos ou porque receamos deixá-l0 livre. Se há amor, precisamos soltar o outro para que escolha estar conosco porque deseja. É preciso refletir se estamos numa relação pelo compromisso assumido, pela rotina, pelo hábito, ou pelo medo de ficar só. Geralmente, o homem tem medo de se aproximar pela cobrança de permanência, ou pela exigência de constância da relação. A mulher, por sua vez, tem medo de entregar-se e depois ser abandonada, aí diz não para não sofrer. Por outro lado, devemos nos perguntar se estamos sendo verdadeiros nessas experiências. Não é honesto ficar numa relação por ser difícil encontrar alguém, porque dá trabalho construir um novo vínculo. Aí cai por terra os “sentimentos nobres” como argumento para justificar a flexibilidade, os ajustes, aceitações e tolerâncias femininas. Por medo, a mulher fica na relação sem questionar ou sai dela antes de começar. Nesse contexto viciado, tanto o homem quanto a mulher sofrem. O homem por estar sempre se desculpando, mentindo ou fugindo, por medo do compromisso; a mulher, por criar falsas expectativas. É claro que não se pode ignorar aqueles que estão equivocados na vida e não respeitam nem a si nem o outro. Toda relação, para sobreviver, precisa ser cultivada. Falo de pessoas bem intencionadas, que querem e estão em busca da felicidade, mas deixam que o medo guie suas vidas e decisões. E enquanto isso,

15


o amor se distancia, encolhe, atrofia. Até quando seremos guiados pelo medo? É preciso falar dos medos abertamente um para o outro e do que queremos, das expectativas. Para isso, temos que nos conhecer e estar dispostos a verdadeiramente conhecer o outro, só assim poderemos aproveitar as oportunidades que surgirem. A vida sempre trará desafios a ser enfrentados, não há uma resposta simples para questões tão complexas, pois, como foi dito no filme “Matrix”, “há uma diferença entre conhecer o caminho e percorrê-lo”.

16


Carta ao Vento Queria que tu soubesses o quanto te quero bem, que sinto muita saudade e alegras-me como ninguém E ao encerrar o dia não durmo sem me lembrar dos bons momentos vividos que não me permitem calar Queria que tu soubesses que percebo a tua dor, pois vejo o que escondes, receias perder-te no amor Que tuas suspeitas entendo pois o espelho quebrado torna a vida em fragmentos e o coração gelado Queria que tu soubesses do fundo do coração desejo estar contigo sem qualquer hesitação Mas por te entender não nego a minha dor tenho muito o que aprender no caminho do amor Queria que tu soubesses que nada há a esconder porque na arte de amar importa a dor acolher Se fórmula mágica há para criar o encontro será poder entrar no coração sem espanto Sentir o pulsar da vida no ritmo cadenciado inspira viver o momento único a ser desfrutado Porque o tempo é semente à espera de germinar a dádiva de estar presente no tempo de recriar

17


Exílio A minha identidade depende crucialmente das relações dialógicas com outros. Charles Taylor A vida é um fazer diário, sempre em construção. Estar no caminho é viver cada experiência, estar em sintonia com a vida, consciente de que os planos não são maquetas prontas, mas peças que se encaixam, a cada movimento criado ou reproduzido. É seguir as oscilações das ondas, no mar da vida. Para sermos arquitetos de nosso destino, precisamos ter consciência de que a simples existência afeta o fluxo da vida, ainda que escolhamos não agir. Muitas vezes, é a omissão a maior desencadeadora de eventos, principalmente quando esquecemos quem nós somos e o que queremos. Não sabemos o que o outro sente ou pensa, nem o que deseja ou oculta. Mas podemos ver, ouvir, observar, sentir, para diminuir a distância entre dois mundos. Pois sonhar, por sonhar, sem nada realizar, é viver como solitário espectador de si mesmo. É de si buscar o exílio .

18


Perdão Para lidar consigo mesmo, use a cabeça; para lidar com os outros, use o coração. Karl Rahner Quando procuramos nos conhecer, fica cada vez mais difícil não perdoar. Ou melhor, não é fácil encontrar motivo para alimentar mágoa. Quando entendemos nossos anseios e dúvidas, podemos entender as atitudes do outro. Como é possível ressentirmo-nos com alguém só porque não corresponde às nossas expectativas? Ou por que não queira as mesmas coisas que nós? Alimentamos falsas esperanças de que podemos curar a dor do outro. O que alguém faz, sente ou pensa é escolha e responsabilidade dele, são reações determinadas pela sua história de vida que desconhecemos. Sabemos que não somos o problema. Se procurarmos entender alguém, não nos sentiremos rejeitados. Mas nem por isso deixamos de viver o desolamento da realidade. É hora de avaliarmos atitudes, entrarmos em contato com sentimentos, respeitando a trajetória de cada um. Constatar que não somos tão importantes para alguém, como arrogantemente acreditávamos, pode ser um tiro certeiro em nossa vaidade. Mas nos libertar do contexto viciado, por nós criado, permite assumirmos as rédeas de nossas vidas e decidir com quem queremos compartilhá-la, pois só assim podemos compreender as escolhas alheias. É preciso seguir em frente, viver o luto, sentir a dor, perdoar nossos enganos e voltar a experimentar.

19


Compreensão Onde estás, doce visão Eu te percebo em cada manhã deslumbrada com o que não vejo, mas sinto. Tu não me pertences, pois és a própria vida em esplendor. Trazes a brisa da esperança, que refresca a alma. Em tuas fontes, purifico a mente e o coração. Raízes profundas edificam o amor em ascensão. Sinto o calor de tuas chamas Reveladoras, e me hipnotizas com tua dança que improvisa, desarma, desconforta, ampliando minha visão na escuridão.

20


O Mito da Opressão A compulsão oculta de ser desejado nos coloca sob uma espécie de feitiço que torna nosso comportamento confuso para os outros, e até mesmo para nós mesmos. Polly Yang Neste final de semana, assisti um filme interessante. É a história de um rapaz que se envolve com duas irmãs, enquanto namora a terceira. É interessante como a culpa é tratado no desenrolar da trama. A irmã mais nova faz de sua experiência um laboratório, um aprendizado para uma futura relação. A mais velha, casada, no dia do casamento da irmã, pergunta por que ele agia assim, e ele responde que percebe o que cada pessoa deseja, e que gosta de fazer as pessoas felizes. Não há culpa, pois julga fazer o bem. Já a noiva, que havia transado com o ex-namorado na véspera do casamento, fugiu da igreja, amargando o remorso. E o interessante, ao final da história, é que o noivo que a alcançou, pediu que não contasse nada, porque também tinha seus segredos e pretendia preservá-los. Na sequência, um outro filme conta a história de uma mulher que foi trocada por um homem, e continuou a amá-lo, e a lembrar os bons momentos compartilhados. Ela cuida dele até a sua morte. Se abstrairmos o conteúdo moral impregnado de valores culturais, portanto mutáveis, observaremos a mensagem dada de compreensão e amor. Estes dois filmes revelam que é possível lidar com os relacionamentos em nossas vidas, sem nos afogarmos no mar de tristezas e mágoas. Na maioria das vezes, ressentimo-nos porque não conseguimos obter o que queremos, por ter nossas expectativas frustradas e nos perdemos de nós mesmos e do outro. Em outras palavras, as crenças e ideias pré concebidas tolhem a visão, por estabelecermos um padrão rígido do que pode ser aceito, idealizamos a vida, e não usufruímos o que ela nos oferece. Então, num cenário que não nos agrada, tudo vira opressão, na ação ou na omissão. Se o companheiro liga demais, quer muito nossa atenção, é intenso, pede demais, é opressão. Não aprendemos a dar e receber limites. Se não nos liga, demora a nos procurar, só quer sexo, é opressão. Cada um tem seu ritmo e preferências, cabe a nós nos adaptar ou procurar alguém que se afine mais com nossa forma de ser. Se comenta com entusiasmo os seus projetos, não nos escuta, é opressão. Para ser ouvida é preciso aprender a ouvir. Se pergunta para aonde fomos, com quem estivemos, se vai sair, tudo isto é opressão. E quando não pergunta, é porque nos trata com indiferença, não se importa. Passamos tanto tempo distante de nós mesmas, que não conhecemos o que de verdade queremos, e o que queremos da relação. E quando não sabemos lidar com a forma de ser do parceiro, e tememos a rejeição, tudo permitimos e culpamos o outro por nos oprimir. A mulher saiu da posição de submissão, assumindo as rédeas da vida, com independência intelectual e financeira, mas continua vivendo emocionalmente o papel das mulheres oprimidas de outrora. Este paradoxo

21


confunde o homem, que a vê-la forte e decidida, tão exigente nos atributos que quer que ele tenha, mas tão frágil diante da paranoia da opressão. Precisamos reinventar a vida, livre de rótulos, sem ver maldade em tudo. Não é curioso a mulher ser capaz de ver a fragilidade masculina e não ver a sua própria? Sentir-se ameaçada a ponto de em tudo ver opressão? Viver assim não é bom para ninguém, é autodestrutivo, separatista e desagregador. Mas todas nós, uma hora ou outra, seja em maior ou menor proporção, acabamos por cair nessa armadilha. Não é dessa forma que honraremos as mulheres que nos antecederam e que lutaram para conquistarmos o que temos agora. Homem e mulher precisam se encontrar de um outro lugar, aceitar a humanidade em cada um, construir uma nova história. Precisamos sair das certezas e irmos em busca do desconhecido, procurando sermos felizes, livre de amarras auto impostas, de padrões que não nos servem mais, destruindo os mitos.

22


A magia do Encontro Mas há a vida que é para ser intensamente vivida, há o amor. Que tem quer vivido até a última gota. Sem nenhum medo. Não mata. Clarice Lispector Como é maravilhoso permitir-se, experimentar, viver, ousar, sentir, compreender. Mas não queremos assumir riscos. Esperamos que o outro esteja certo do que quer, do que sente por nós, quando também temos dúvida e receios. Atribuímos ao outro a responsabilidade pelas coisas não darem certo. Não vemos que boicotamos, criamos situações para que o encontro não aconteça. Não vemos os sinais de algo que não se encaixa. Todos veem, menos nós. Por achar difícil recomeçar, investimos em causas perdidas. O olhar atento revela sentimentos e reações, ajuda a mudar o rumo da vida e da relação, e permite sermos honestos conosco e com o outro. Somos atraídos por pessoas que ressoam com o nosso momento, seja ele de harmonia, ou não. É a lei de atração. Se estivermos atentos, aprenderemos lições e cresceremos como seres humanos. Mas se dermos vasão ao nosso lado sombrio, lamentaremos o equívoco e ficaremos a nos perguntar por que atraímos “a pessoa errada”, ou porque fracassamos. Viver é assumir a responsabilidade por nossas vidas, reconhecendo equívocos, nos perdoando, sem deixar de experimentar. Quando conseguimos mudar o rumo do caminho a tempo, colheremos bons frutos da convivência. Quando não for mais possível, estaremos mais amadurecidos para nova pessoa. Ao ampliar nossa capacidade de resistir e insistir, a despeito dos erros recíprocos, a relação cresce, a confiança aumenta, o sentimento se intensifica. Viver o momento, descompromissado de resultados, deixando-se sentir, atentos aos sinais, evita que os mecanismos de defesa sejam acionados inadequadamente, permite a interação de coração para coração. Amar é estar conectado com o ser amado, mesmo que sigamos caminhos diferentes. Deixemos que a magia do encontro aconteça.

23


Almas Gêmeas Uma alma inquieta, saciada das coisas do mundo buscava em sua alma um sentimento profundo. Olhava para as estrelas, em reduto solitário, procurando respostas questionando o imaginário Seu coração lhe dizia no infinito, em algum lugar alma idêntica havia também a se perguntar. E para ela enviou suas íntimas aspirações, plantando assim a semente que une dois corações. E pode então perceber, por rápidos momentos, a presença a lhe dizer, acolho seus sentimentos. E aquela alma inquieta nada mais quis perguntar, porque enfim encontrou sentido em viver e amar.

24


Afabilidade e Doçura Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim.” Chico Xavier Diz a sabedoria popular que “quem perde a calma, perde a razão”. Algumas vezes, no calor da emoção, nos excedemos, perdemos o foco da questão, e tomamos atitudes impulsivas. Esquecemos da bem aventurança que recomenda sermos mansos e pacíficos. Não se deve, entretanto, confundir afabilidade e doçura com a atitude decorrente do exercício das convenções sociais, de normas de etiqueta, que impõem o verniz da educação e dos bons hábitos, pois, mesmo sendo necessária para a boa convivência, podem ser recursos para ocultar as intenções inconfessáveis de manipulação e poder. Por outro lado, indulgência, tolerância, compaixão e paciência não são sinônimas de omissão. Os primeiros atributos falam da conduta respeitosa que devemos ter diante de um momento de destempero, de desequilíbrio. A última, ou seja, a omissão, é reprovável, porque importa em não fazer ou dizer aquilo que moralmente seria exigível. Muitas vezes, nos omitimos por covardia do enfrentamento, por medo de rejeição, valorizando em demasia o apreço do outro, em desrespeito à nossa dignidade, numa verdadeira violência ao nosso Ser Interior, em prejuízo da auto estima. É preciso sabedoria e experiência para manter o equilíbrio entre falar e calar. A afabilidade nasce do coração desprovido de orgulho e das suscetibilidades próprias do amor-próprio ferido. Importante percebermos que ninguém está isento de ceder a um momento de impaciência e irritação, e relevar atitudes desarmonizadas em favor da boa convivência é a atitude que se espera daqueles que nos amam. Entretanto, a falta de cuidado constante no trato com nossos entes queridos constrói um muro de mágoas e ressentimentos, destruindo o amor. Exercitar o desapego de interesses, convicções e ideias é um desafio. Aceitar que os outros também tenham suas necessidades, percepções, pontos de vista e desejos é uma arte. Conciliar propósitos, respeitar bens, ideias, lares e personalidade dos outros, a partir do respeito que temos a nós mesmos, estabelecendo fronteiras para preservação do nosso Ser Interior atrairá o comportamento doce e afável tão almejado.

25


Purificação Oh! Lua! Purifica-me a alma, leva contigo minhas dores, acolhe meus humores, e revela doces amores. Mostra as partem que mentem por não viverem o que sentem, unindo coração e mente no resgate do elo perdido. Acaricia meu ventre com a brisa impermanente, reconduzindo o meu ente aos sonhos adormecidos.

26


Comunicação O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranquila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: “Se eu fosse você ....” A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. E fala só é bonita quando ela nasce de duma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na escuta que ele termina. Rubem Alves Comunicar-se é uma arte que exige sutileza, habilidade e sensibilidade. É uma tarefa tão complexa que se tornou ciência. Para os animais não há qualquer dificuldade, quando um cachorro grunhe para o outro, deixa clara sua insatisfação e o motivo dela. Nós, humanos, temos um conjunto sofisticado de códigos de interação, que exige não apenas uma leitura, mas uma interpretação. Expressamo-nos pela linguagem corporal, pelo olhar, pelo movimento facial, pela palavra, pelo tom ou altura da voz, e até pelo silêncio. Nem sempre somos coerentes ao dar sinais de comunicação. Às vezes dizemos algo que não reflete o conjunto de outros sinais que emitimos. Quando não conseguimos entender o que estamos sentindo, isto é projetado na interação com o outro, deixando-o, muitas vezes, confuso. Outras vezes queremos ocultar o sentimento e a contradição é exposta. Comunicar-se tem por finalidade fazer-se entender. É uma arte que poucos conseguem desempenhar com destreza. Há pessoas muito habilidosas em perceber as expectativas alheias, e manipulam palavras para obtenção de efeitos e resultados planejados. Outras, despreparadas no exercício da expressão, sentem-se inadequadas e inseguras e recolhem-se na máscara protetora da indiferença ou da timidez. Há, ainda, aquelas que falam o que lhe vêm à cabeça, causando impactos e reações imprevisíveis nas pessoas. Grande parte dos conflitos é gerada pelo conhecido “ruído de comunicação”. Isto porque nesta arte não há elemento passivo, pois o receptor acolhe os sinais codificados e utiliza-se dos recursos de descodificação por ele conhecidos, de sorte que a mensagem é decifrada de forma singular. E nessa tradução entram valores, experiências de vida, traumas, esperanças e anseios, enfim, componentes subjetivos que interferem na clareza da comunicação. Não se sabe como o receptor vai acolher o que está sendo transmitido, a mesma mensagem dada pelo mesmo emissor pode ser lida de forma diversa por diferentes receptores. Não há garantias de que seremos compreendidos. Ao conhecermos uma pessoa, queremos entender suas características, personalidade e forma de ser. Sentimo-nos desconfortáveis diante de pessoas que não se mostram, porque não sabemos como nos relacionar com ela. Entretanto, é justamente a avaliação que fazemos do outro que cria desentendimentos, pois criamos falsas expectativas de como ele vai se comportar e de como devemos agir para sermos compreendidos. Perdemos, assim, a espontaneidade.

27


Há uma linha divisória tênue que dosa a comunicação saudável da destrutiva. Nem sempre expressar-se bem é falar demais, assim como o silêncio pode não ser omissão e ser interpretado como indiferença ou agressão. Neste exercício observa-se que a emoção, quando não educada, pode comprometer, corroer ou até destruir qualquer tentativa de entendimento. Agir movido pela emoção desequilibrada, pelo impulso, frequentemente acarreta supervalorização de uma situação ou episódio, que é visto a partir de uma outra experiência passada que foi desagradável. Por outro lado, há quem procure sempre agir raci0nalmente, esquecendo que o mental dissociado do sentimento pode trazer soluções estéreis para uma boa convivência, porque estão impregnadas de ideias pré concebidas inseridas na construção de nossa história de vida. Sermos coerentes e verdadeiros pode ser o primeiro passo para uma comunicação bem sucedida. Quando estamos em harmonia e integrados em todas os aspectos, transmitimos confiança para as pessoas, e o entendimento flui suavemente. É o conflito interno que nos desconecta de quem somos e, em decorrência, do outro. Quando padrões de comportamento e pensamento viciados se tornam conflitantes, não podemos perceber como vemos e reagimos às coisas e nem as divergências internas, mas se isolar não é uma boa solução. Em qualquer situação, é preciso deixar que a razão interaja com o coração, esse é um caminho promissor do entendimento tanto de si mesmo quanto do outro. Compaixão, paciência e amor são ingredientes de uma bem sucedida comunicação.

28


Desencontro Eu sou uma mulher, você me vê assim? Não sou a fêmea a satisfazer seus desejos, nem a companheira a atender seus apelos, não sou o que se espera de uma mãe, filha, irmã ou amiga. Antes de tudo sou gente, com angústias e medos, sonhos e pretensões, desejos e anseios. Eu sou um homem, você me vê assim? Não sou o que se espera do provedor. Não quero ser desejado pelo que prometo. Não existo para alimentar suas fantasias. Também tenho angústias e medos, sonhos e pretensões, desejos e anseios. Em que papeis deixamos de nos reconhecer? Em que espelho perdemos nossas almas? Em que torre predemos nosso coração? Que mordaça segura nossas vozes? Em que momento o elo se rompeu? Ainda que os grilhões que nos imobilizam tolham o discernimento, ainda que o véu da ignorância turve nossa visão, seja o que façamos ou digamos, não podemos esquecer que, antes de tudo, somos todos seres humanos na diversidade de gêneros.

29


Por que é Bom Estar Apaixonado? O valor das coisas não está no tempo em que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis. Fernando Pessoa. Quem já se apaixonou sabe como é a sensação. Você não dorme, come ou se concentra, só pensa no objeto da paixão, o tempo todo. A vida é vista por uma lente colorida , tudo é maravilhoso e nos deslumbra. Você rejuvenesce, fica mais bonita, mais atraente. Há quem diga que a paixão é uma ilusão. E daí? Se essa ilusão nos faz uma pessoa melhor? Na verdade, quando estamos apaixonados revelamos a criança interior, o lado criativo, ampliamos a percepção para o belo, para o prazer, ficamos generosos, inspirados. A questão é: por que não conseguimos estar nesse lugar quando não estamos apaixonados? Por que precisamos projetar o que temos de bom em algo fora de nós? Quem sabe não seja a vocação para o aprendizado da convivência? A paixão quase sempre importa num jogo de veladas expectativas. Muitas vezes damos pistas do que queremos, revelando, nas entrelinhas, que o outro será rejeitado se não corresponder à projeção que fazemos. E então cobramos intimidade, que o parceiro se revele para que possamos conhecê-lo, mas ambos sabemos que não é isso que queremos. Vê-lo como é traz sério risco à paixão, porque vê o outro em sua inteireza nos frustra, ficamos magoados, Des-iludidos. É possível aflorar a paixão e com ela aptidões e talentos que vemos no outro e que gostaríamos de ter. Talvez esse seja o conceito romântico de “se completar”. Procuramos fora o que não queremos buscar dentro. É um momento muito rico estar apaixonado, especialmente se consciente de que ele é apenas um reflexo nosso. Ao entendermos isso, não há motivo para ressentimentos e sim gratidão àquele que serviu de espelho, por ser nossa fonte de inspiração. A paixão pode até ser perene se nos mantivermos curiosos do outro. Talvez seja por isso que para alguns a paixão se transforma em amor. Aqueles que conseguem a sua inteireza a partir de sua projeção, sabem conviver com as diferenças. E amar o outro, apesar das afinidades. Quem sabe esta seja uma pista para entendermos o que seja “ser parte do todo”. Mesmo que não resulte em amor, a paixão é sempre a mola que nos impulsiona para a vida, e quem nunca de apaixonou, é como lagarta que nunca saiu do casulo.

30


Regresso E aí do nada tu chegas, menino travesso, a brincar com minhas meninas, que supunham haver-te cansado do folguedo. E ao rever-te, agora são mulheres, e oferecem colo ao teu olhar desamparado, enquanto tuas mãos buscam outras meninas, com forma de lua cheia. Não demoras, e saciado, viajas de volta ao teu mundo árido, escuro e mudo.

31


Quando o Silêncio é Ensurdecedor O melhor presente que podemos dar ao outro é nos revelarmos. Ensinamento budista A interrupção da comunicação pode causar desgaste num relacionamento. O silêncio numa convivência cotidiária pode gerar interpretações várias. Tentamos adivinhar o que ele representa, fazemos deduções, tiramos conclusões, queremos preencher as lacunas. Percebemos a ausência emocional dele pelos gestos, expressão facial, na energia emanada ou na falta dela. O silêncio pode ter vários motivos, e muitos não dizem respeito à relação. Pode ser preocupação com um problema, um estado de confusão interna, a necessidade de se distanciar de uma situação para ver com mais clareza. Mas se não é dito o motivo, isso pode causar ansiedade, insegurança e ressentimento de quem sente-se rejeitado. Este contexto se agrava quando a relação ainda está construindo suas bases, e não sabemos ao certo o que o outro sente por nós. Questionamos se ele foi afetado por algo que dissemos ou fizemos, e se não quer mais continuar na relação. Sabemos que o diálogo é sempre a chave de todo entendimento, mas nem sempre isso é percebido ou há motivação de assim proceder. O importante é não nos deixar abater ou cultivar mágoas. Convém evitar julgamento daquilo que não entendemos, precisamos de clareza para saber o que ocorre. Em qualquer situação, a paciência deve ser cultivada, pois o tempo sempre trará as respostas que precisamos.

32


Desalento Vida minha, que farei sem ti? O que será do amanhecer sem teu colo, o anoitecer sem teu calor? Como serão meus dias à espera de tua chegada? O que será de mim sem te tocar, te sentir, te ouvir? Sem teu sorriso, teu cheiro, tuas carícias? Estás em minhas entranhas, em meu ser, em minha mente. Dominas minhas vontades e meus mistérios. Levastes meu discernimento, Criastes um vendaval de emoções que me deixaram desolada, inquieta, prostrada, angustiada, desatinada, sem rumo, perdida. Quisera jamais ter te conhecido, receber tanta luz e depois ser jogada no inferno. Sentir o êxtase e ser levada ao mais árido deserto. Viver a plenitude e cair no vazio. Ver o pulsar da vida arrastado às profundezas da morte. Sentir o coração rasgando de tanta dor, explodindo de tristeza. Náufraga no de mar de emoções, a alma grita, chora, cala, lembra, revolta-se, clama, desalenta-se, implora, desespera-se, desfalece, desiste, morre.

33


Dar um Tempo A palavra de ordem deste século é parceria. Estamos trocando o amor da necessidade, pelo amor de desejo. Eu gosto e desejo a companhia, mas não preciso, o que é muito diferente. Flávio Gikovate Nas relações afetivas modernas, é comum ouvir a expressão “dar um tempo”. Quando não se sabe o que fazer diante de uma crise de convivência, se pede “um tempo”. Então o casal se afasta, presume-se que temporariamente, e para refletir sobre o que está incomodando, o que está errado na relação. Na verdade, não há uma definição clara do que é “dar um tempo”, nem parece que as pessoas que o propõe se preocupem em estabelecer como seria o comportamento de cada um nesse intervalo. O que é dar um tempo? É o afastamento físico? É manter a distância emocional? É evitar cobranças recíprocas? É ter tempo de sentir falta? Quem pede um tempo, de verdade, reflete sobre a crise ou apenas a deixa de stand by? Quanto é esse tempo? É possível dimensiona-lo? Quem aceita a trégua pode suportar a indefinição da medida desse tempo? O casal tem ideia do que pode ocorrer, que risco a relação corre? É simplesmente ficar em compasso de espera, ou é deixar cada um livre para ter novas experiências? É aceitar que pode surgir outra pessoa, mesmo que não se esteja procurando? Em sendo assim, não é melhor terminar a relação, por que a qualquer tempo é possível a retomada? E assim, não haveria a angústia da espera de quem tem que “dar um tempo”? Não se pode ignorar que toda convivência tem seus momentos de conflito, entretanto a abertura para o diálogo sempre permite que desentendimentos sejam resolvidos, dúvidas esclarecidas, erros corrigidos e mágoas perdoadas. Há casal que permanece junto enquanto não se resolve o conflito, outro concorda em não dormir brigado, cada um encontra um caminho para o entendimento, se o propósito é a união. Dar um tempo parece uma medida extrema e drástica que, ao invés de permitir clareza da situação diante do distanciamento do problema, na maioria das vezes é uma fuga do enfrentamento dos desafios que a convivência traz, causando assim mágoas, sentimento de rejeição e insegurança. Melhor seria fazermos como recomenda a poesia de Gilberto Gil: “o seu amor, ame-o e deixe-o livre para amar”. Assim inexistiria a cobrança de corresponder à expectativa recíproca do que se espera da relação, da fidelidade, exclusividade, do contato físico ou emocional. Amar pelo amor e não pelo que pode receber em troca. Amar o que o outro nos desperta, sensibiliza, pelo compartilhamento, pela troca, pela verdade e respeito. Se amar é querer bem, estaremos felizes se o amado está, ainda que longe de nós ou com outra pessoa, pois sabemos que não deixaremos de amar porque ele ou ela escolheu caminho diverso. O amor é nosso, está dentro de nós, não precisa ser correspondido para 34


existir. O amor maduro não deposita no outro esperanças de felicidade. E como fonte inesgotável que é, podemos sempre encontrar alguém que possa despertálo em nós. Mas, o que fazer com o desejo? Com a vontade de estar com o outro, sentir o seu cheiro, carícias, tocar sua pele? Será o desejo a causa de todo sofrimento, enquanto é manancial de prazer? Como educar nosso desejo? É possível querer sem apego? Viver a cada dia o fluxo da vida, consciente da ausência de certezas, da impermanência, do mutável? Adotar o “foi bom enquanto durou”? É preciso nutrirmos nossas necessidades e buscar dentro de nós a harmonia e paz de espírito. Assim, o desejo não será mais um tormento, despertará uma convivência sadia, transformar-se-á em fonte exclusiva de prazer. Enquanto não conseguirmos essa plenitude, exercitemos o perdão, tolerância e compaixão mútuas, e de nós mesmos, para que não precisemos recorrer a “dar um tempo”.

35


Elo Perdido Eu vi uma alma inquieta, Pleno de sonhos e talentos. Um espírito forte, Sem medo de se mostrar frágil. Um amante intenso, generoso em dar e receber. Um guerreiro valoroso na busca de si mesmo, incansável aprendiz. Por fração de segundos eu o vi ... Para perdê-lo na disputa de egos envolto em máscara de ferro, aprisionado ao passado. Há alguém agora que não conheço, distante, recolhido, inacessível. Mas a imagem dele não esqueci, refletida nas aspirações humanas. Posso senti-la, percebê-la e tocá-la. Pois o que vi é o que poderia vir a ser. É possível que o tempo o devolva, quando outra alma inquieta eu tenha mirado, e com ela me conectado ...

36


Despertar Ninguém sabe o que há dentro de si até ter que colocar para fora. Ernest Hemingway E então amanheci, com a sensação de uma longa viagem. Olho ao redor, por um momento não reconheci o meu quarto. Perdi a noção de tempo e espaço. Preguiçosamente me levanto, olho no espelho e não me reconheço. Face abatida revela experiências vividas. Quando criança, achava que as pessoas de minha idade tinha resposta para tudo. Enquanto degusto o café, percebo que o tempo parou. Observo a chuva fina, o céu nublado, chamando ao recolhimento. Respeito ao ciclo da vida. Não vou trabalhar hoje, é tempo de hibernar, de comer pipoca enquanto assisto um filme de amor. É tempo de aconchego, de ficar entre as cobertas, de mimar o corpo e a alma. Dentro de mim há outros planos, outros anseios, tão escondidos que nem eu mesma sei, mas pressinto. Viajo à dimensão dos sonhos, busco respostas. Ouço um sussurro, percebo a expressão. Fico quieta, entre as cobertas, ouvindo o barulho da chuva, tentando decifrar a mensagem. Percorro os domínios dos mistérios que me são revelados. Observo um pássaro que pousa, mas não se demora. Em retrospectiva, vejo os momentos raros em que fiz escolhas. As pessoas e situações vinham e iam e eu apenas as acolhia, aceitava convites e desafios. Nunca me perguntei o que realmente queria. Agora, flutuo nesse tempo fora do tempo, apenas existo. Tomo consciência de minha existência, alheia às pessoas, às realizações. Desfruto do momento.

37


Faces Femininas Traga-me um vaporoso véu, deixa-me solta em minha dança e meus braços te envolverão. Acolha-me a vulnerabilidade aceite-me os devaneios, nada fale, atento escute e me verá ardente de paixão. Alimente-me o espírito e o coração, curioso do meu corpo e do meu Ser, e revelarei mistérios profundos. Fale-me de suas lutas e vitórias, suas tristezas e fracassos, e eu lutarei ao seu lado. Terá, ao final da batalha, o alimento em meu ventre e o alento em meu colo. E se acaso nada houver a oferecer, penetrarei no seu vazio e embalarei a sua dor. Eu sou mãe que a todos acolhe, companheira e cúmplice, sou poder na mansidão. Guardiã da biblioteca viva, nauta das águas do coração, defensora da liberdade, assim eu sou. Sou múltipla, complexa, intensa, vibrante, multifacetada.

38


EU SOU MULHER

É Sempre Primavera

(homenagem à minha mãe, Severina Barbosa Leal) A idade não faz murchar, nem o hábito estancar sua infinita variedade ... Shakespeare, Antônio e Cleópatra. Quem dera pudesse chegar à tua idade, com toda a vitalidade e beleza que te acompanha. Pudesse eu continuar curiosa e empreendedora, ignorando os raros fios de cabelo branco que desafiam aparecer em tua cabeleira. Tivesse eu a tua capacidade de estar sempre atenta às necessidades dos que ama, compartilhando tuas alegrias e dores, sem deixar de cuidar e ti mesma. Quisera eu nunca me omitir diante dos desafios da vida, a despeito de críticas, censuras e insatisfações alheias. ama.

E, acima de tudo, ter o coração grandioso, que a todos acolhe, entende e

Porque tu és e sempre serás PRIMAVERA, a inspirar a todos que desfrutam de tua companhia. Abençoada sejas.

39


E Viva a Vida! A vida é aquilo que acontece enquanto você faz planos. John Lennon É sábado, acordo com ressaca da semana. Aceito o convite de uma amiga para um bloco de rua. Não me interesso por carnaval, mas em encontrar gente. O lugar é amistoso, gente do bairro, que se conhece, em família. Cantoras entoam antigas marchinhas, as pessoas se balançam gostosamente. Aqueles que viveram esse passado o revivem, uns com saudade, outros de forma vibrante. Uma senhora faz evoluções, cantando animadamente, convidando a sentir o alegre tempo por ela vivido. Outra revive a adolescência com seu jogo de sedução. Os mais jovens não zombam dela. Eu vejo, entendo e celebro. Alguns, principalmente as mulheres, procuram integração. Olham-se com cumplicidade, compartilhando o momento de alegria. A atmosfera é de prazer. O grupo de percussão inicia seu trabalho, concentrado, absorto no mundo dos tambores, conscientes do que fazem. Cada um, a seu modo, procura estar com gente, assim como eu. Todos buscando um momento efêmero de felicidade. A banda para, as pessoas querem mais. Uns ficam por ali, olhando-se, dividindo bem estar. Outros vão buscar outros blocos, e para mim já está de bom tamanho. Volto para cada saciada, agradecendo tudo que pude desfrutar.

E Viva a Vida!

40


Esperança e Paciência

Paciência é uma planta amarga que produz doces frutos. Charles Swindoll Esperança sem paciência é igual a semente sem solo fértil, é como colher a fruta antes de amadurecer. Paciência sem esperança nos torna apáticos, é apenas um exercício sem sentido. Enquanto a esperança nos mantém perseverantes, apesar dos obstáculos, a paciência permite que o tempo faça o seu trabalho. Esperança não é uma fantasia que alimentamos para ter motivo de acordar todas as manhãs. É a confiança no fluxo da vida, é um ato de fé. Paciência não é só esperar, porque implica em movimento em direção ao que desejamos. É permitirmos o amadurecimento das experiências, dia após dia. Esperança não é sonhar, ainda que o sonho seja o veículo do qual ela o combustível. É sabermos que o sonho é possível. A paciência possibilita a sinalização do caminho, a ampliação de horizontes, nos impulsiona. A esperança nos mantém motivados, apesar dos obstáculos. Esperança e paciência são importantes nos momentos de dificuldade, quando não temos mais força, perdemos o rumo ou estamos desnorteados. Porque seja o que for que estejamos passando, sabemos que vai passar. Ninguém fala delas quando o caminho se abre fácil e tudo flui com tranquilidade. Não, elas são invocadas sempre que precisamos lembrar de que nada é definitivo, permanente ou fixo. A paciência ajuda a nos manter firmes, ultrapassarmos dificuldades, vencermos desafios, e a esperança nos dará a coragem para prosseguir. Ter paciência com nossas dores, limitações, equívocos e erros abre as portas para a esperança de superá-los, em busca da alegria de viver. Esperança não é nos manter obstinadamente num propósito, mas permitir que as mudanças necessárias aconteçam, no acolhimento da paciência, confiando que a vida está sempre certa. Esperança com paciência é a fórmula mágica da plenitude, e sempre que quisermos e tivermos coragem de nelas mergulhar, encontraremos a pérola mais rara e rica que irá nos manter na nossa jornada, em busca da felicidade.

41


Tempo Tempo correndo, instantes vivendo Horas escoam, já foi o presente Semente tornou-se pó, unguento Dia que foge distante, ausente Hoje tem horas, minutos e agora? Saturno acorda aqueles que sonham Enquanto os desejos galopam Instantes lentos os dias somam

42


Felicidade A verdadeira felicidade é discreta por natureza e é inimiga da pompa e do barulho. Nasce, em primeiro lugar, de nossa capacidade de gozar de nossa própria companhia, e, depois, a companhia de uns poucos amigos selecionados. Joseph Addison Sabe aqueles dias em que acordamos com uma sensação de bem estar que gostaria que nunca acabasse? Em que não queremos fazer nem dizer nada, para não perder essa sensação? Sentimo-nos pleno, cheio de vida, e ao mesmo tempo vulnerável e sensível? Todos nós já tivemos essa experiência, nem que tenha sido por um instante. Num dia assim, a gente se percebe grandioso, com capacidade de entender tudo e todos, de perdoar, aceitar, acolher ... É um dia de simples contentamento, em que nos voltamos para contemplar a vida, a natureza, o mundo, as pessoas, a nós mesmos, com a lente do amor. Olharmo-nos no espelho é uma aventura. Não é mais um reflexo, mas a própria imagem. Por um momento, podemos capturar nossa alma, num flash de luz. Dormir não é só repousar, é viajar para uma dimensão maior, é encontrar quem amamos, é conectar-se com o todo. Acordar é trazer conosco não a lembrança, mas a sensação de momentos felizes. Fomos educados a exercitar nossa compreensão através da razão, e com isso, quantas oportunidades de prazer e bem estar perdemos, por querermos entender, ao invés de sentir, apreender e acolher o incomensurável. Nestes momentos, a necessidade é uma palavra vazia, estamos plenos. Todo desejo transforma-se em realização. Estamos nutridos, serenos, em paz, vislumbramos o que está além de nós, simplesmente sabemos. São experiências assim que alimentam a chama da esperança. Se podemos experimentar isso, ainda que por instantes, a felicidade é possível. São momentos como esse que nos encorajam a enfrentar as adversidades, por saber que há algo além do horizonte, algo belo, vibrante, intenso, profundo, amoroso, alegre, generoso, que nos impulsiona a prosseguir. Sabemos que, a cada avanço conquistado, estaremos mais próximos de simplesmente Ser.

43


Plenitude Saborear o néctar da vida nas cores, formas e luzes, na escuridão, no mundo, na solidão. Desfrutar do desejo, sem apego. Dispor o ouvido para escutar sons, vozes, o coração. O que não foi dito. Ter compaixão sempre no ouvir, olhar, observar. Muito no falar. Amar o amor fluindo de nossas entranhas. Aproveitar cada momento no êxtase da natureza, fiel à essência.

44


Ilusão Existem pessoas que vivem num mundo de sonhos e outros que encararam a realidade. E existem aqueles que lutam para fazer de um o outro. Douglas Everett Sempre escuto que a ilusão é um mal, uma fantasia destrutiva, porque nos tira da realidade. Sem negar essa afirmação, é importante nos questionar se podemos identificar o que é verdadeiro e o que não é. Há pessoas que acreditam que viver a realidade é estar em coerência com o que acredita, e a crença nada mais é do que valores e conceitos assimilados, e ensinamentos impostos. Jamais questionam o mundo em que vivem, e creem que o presente se resume às atividades cotidiárias de satisfação de necessidades básicas, sem cuidar de alimentar o espírito, o coração, a transcendência. Para essas pessoas, é assustador entregar-se a experiências que não sabem onde vai levá-las, então optam por corresponder ao que se espera delas. É importante observar que a fantasia aciona o mundo imaginário, sem o qual a arte não existiria e o poder criativo estaria enterrado. Seríamos condenados à morte emocional, não tivéssemos a capacidade de sonhar, pois o sonho realizado nos encoraja a enfrentar o que chamamos de realidade. Quantas invenções humanas partiram do imaginário que, para os incrédulos da ocasião, era mera ilusão? Deixar-se levar pela fantasia pode despertar aspirações profundas. É preciso perguntar-se se sabemos divisar a fronteira entre o sonho e a realidade. Quem consegue distinguir o que há de ilusão e o que é tangível num sonho? Algumas vezes, o que parece realidade não passa de fantasia, e o que aparenta ilusão é a mais cristalina verdade que desconhecemos. Apesar de ser um caminho de constantes riscos, onde não há garantias, mergulhar no imaginário pode nos conduzir a caminhos nunca trilhados, reveladores de nossa essência, ricos em cores, formas, luzes e sons. No regresso, é possível preservar o que de bom desfrutamos, as sensações, sentimentos e percepções. Nenhuma criança fica magoada, frustrada ou decepcionada ao voltar de uma fantasia. Ela penetra nesse mundo maravilhoso, e aproveita o que ele pode lhe dar. Não questiona se é real, simplesmente vive. Por que não podemos preservar essa forma de ser infantil, sabendo transitar entre o real e o imaginário, sem confundi-los, agradecidos pelo estímulo criativo e aplicá-lo em nossa vida? A criança, em sua simplicidade, sabe distinguir o mundo criado por ela daquele onde vive. O mal da ilusão reside na falta de consciência, pois usamos a ilusão para fugirmos da realidade, e chega uma hora que não sabemos distinguir uma coisa da outra. Mesmo aqueles que se julgam invulneráveis a fantasias saem da realidade sem perceberem, ao receberem estímulos e induções dos 45


mecanismos manipulativos de massa. A vida é um eterno despertar, estamos sempre procurando a verdade, a demonstrar que a ilusão está a nos espreitar, já que nossa percepção das coisas é limitada e pouco confiável. Ao adentrarmos conscientemente no imaginário, podemos tirar melhor proveito dessa dimensão, e distinguirmos com mais clareza o que não é real. Temos a ilusão de segurança, de controle, de constância em nossas vidas e evitamos experiências que nos transportem ao desconhecido, ao incerto, ao impermanente. Curiosamente esse tipo de experiência e a única verdade que podemos confiar. Não se trata de ser bom ou mal, tudo é presente de Deus, e devemos ser mestres de seu uso.

46


Sombra Minha Sobra minha, onde estás? Proteges-me da insolação e ofereces frescor e bem estar. Sem ti o que será de mim? Preciso de teu refúgio, a luz ofusca e desidrata sem tua gentil intervenção. Amenizes a nitidez da luz, e realças cores e contornos que a penumbra traz. És uma trégua, um respiro, em noite de lua cheia, refletindo as águas de meu Ser. A cortina que oferece uma réstia de luz a penetrar, e na intimidade do coração as estrelas venham me visitar. Voltes com a brisa da noite anunciando o alvorecer, pois tua ausência é um açoite nas fibras do meu ser.

47


Integração Aquele que busca a verdade, corre o risco sempre de encontra-la. Isabel Allende. A maioria dos seres humanos não sabe lidar com sua própria complexidade, sequer a conhece, e isso compromete seu bem estar. O homem contemporâneo vive ao sabor de várias correntes, oscilando seu comportamento em reação às situações. A mente conturbada, impregnada de crenças e preconceitos, não é capaz de guiar as emoções e instintos, nem consegue acessar a sabedoria contida na intuição. A supervalorização da intelectualidade sem aplicação favorece a entrega desenfreada aos prazeres, porque a ética e a moral foram distorcidas em troca de interesses seculares. Mesmo aqueles que valorizam a ética, reprimem suas necessidades instintivas, desencadeando distúrbios emocionais. Harmonizar todos esses aspectos é um desafio. A ausência de equilíbrio interior é particularmente refletida nos relacionamentos afetivos, gerando desencontros e conflitos. Muitas vezes, o corpo pede a vazão dos instintos, que deveria ser tratada como necessidade, mas são reprimidos por conta de tabus, preconceitos e dogmas, impedindo a experiência do prazer. Receamos reprovação, por confundirmos sensação com emoção, desejo com amor, por não sabermos harmonizá-los. Ou bloqueamos o prazer ou deixamos que ele nos domine, num total descontrole de nossa vontade. Por outro lado, não percebemos que estamos nos projetando no outro quando estamos apaixonados. Mas é na paixão que nos mostramos, estamos felizes. O apaixonado seduz homens, mulheres, crianças, animais, o mundo. Ele está de bem com a vida porque vive em êxtase. Ao não diferenciarmos desejo de amor, não temos uma relação verdadeira. Muitos se questionam se para amar é preciso admirar, se o amor impõe condições para sua existência, se conhecer os defeitos do outro ameaça o amor. Por outro lado, alguns, por motivos inconfessáveis, ficam com o parceiro ou parceira, mesmo não gostando que vê, pelo desejo, pela necessidade de permanência, para não ficar só ou por status. Há quem procure uma fórmula mágica para identificar o que de verdade sentem, e questionam por que a mente complica tanto. Não aprendemos a desenvolver a integração de todas as nossas partes, somos incoerentes com o que sentimos e pensamos. Muitas vezes, queremos dar uma nova chance, a nós e ao outro, à relação, mas não confiamos e tememos incompreensão, e aí o mental deturpa a verdade, ficamos em conflito e questionamos se estamos agindo certo. Fala-se em amor incondicional, sem apegos, mas como isso é possível se o desejo nos domina? Será que um dia superaremos o apego, a necessidade de exclusividade? É possível aceitar que quem amamos ame outras pessoas também?

48


Pode ser que a grande lição seja estar sempre em busca de respostas, a abertura para o aprendizado, permitindo que mente, intuição, emoção e sensação interajam e fluam livremente, cumprindo suas funções, conduzindo ações, de acordo com a situação. Corrigir o rumo de nossas vidas, quando, onde e como achar ser o melhor. Sem culpas, amando-se, amando as pessoas, a vida, vivendo. Experimentar, permitir-se, amar, desejar, entregar-se, integrar-se.

49


O Caleidoscópio da Vida No reflexo da imagem Não atino mensagem O encontro é uma miragem Pois em tal paragem Não posso me reconhecer Na noite de minha sanha Luto pela façanha De te tirar da entranha Sem contigo arrastar tamanha Parte do meu Ser No caleidoscópio da vida Somos pedaços de vidro Do mosaico do mundo Tu lutas bravamente Em mim envolto, qual serpente No fascínio da presa Pois no reduto da mente Não existe represa Na arte de observar Posso teu rosto tocar E ver do que necessitas Não são promessas vãs Mas doces verdades ditas No caleidoscópio da vida Somos pedaços de vidro Do mosaico do mundo Então não há mais por que Eu te expulsar do meu ser Pois podes nele viver Sem máscaras te envolver Ou nelas se esconder Ao perceber o momento Acolho no colo o rebento Que anseia enfim por alento por afago, compreensão pelos olhos, braços e mãos No caleidoscópio da vida Somos pedaços de vidro Do mosaico do mundo 50


E o vento espalha as cores Que transformam as dores Em arco-íris de amores Jardins repletos de flores No mar do silêncio profundo

51


Maturidade A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás. Mas só pode ser vivida olhando-se para a frente. Sorem Kierkgaard Todos nós queremos conseguir a maturidade, procuramos agir em coerência com aquilo que pensamos, a sabedoria sempre buscando. Mas, enquanto estamos trilhando o caminho da verdade, esquecemos que somos feitos de sucessivas experiências que nos deixam marcas, comportamentos condicionados, hábitos viciados, e gestos que mecanicamente repetimos, atos e falas tão exaustivamente reproduzidos em nosso cotidiano. Para compreender o que somos, precisamos voltar no tempo, e encontrar o elo que nos liga ao presente. Mas consultar nossas lembranças não é esquecer o presente, pois só no agora, no instante, podemos reinventar nossa história. Vigilantes, sim, tensos e preocupados, não. Precisamos estar atentos a cada movimento que criamos e suas consequências. Procuramos retidão e esquecemos a espontaneidade. Queremos seriedade, nos afastando da alegria. Buscamos sobriedade e negamos a autenticidade. Ficamos tão tensos em nossa luta, que perdemos leveza. A jornada da maturidade não importa em sacrifícios e renúncias, mas em abrirmos mão do que não mais nos serve. É um voo livre de conceitos, preconceitos, hábitos e condicionamentos. Um caminho que conduz à consciência de quem somos, e a nos aceitar por inteiros. Uma trajetória que permite entendermos que o que está fora é resultado do que está dentro e que poucos sabemos, que eternos aprendizes somos. A maturidade não tem idade, sexo, cultura ou classe social. Ela é fruto de uma vida bem vivida, de lições aprendidas, de desafios enfrentados, da coragem de experimentar, para que a criança em nós possa desabrochar.

52


Cuida de Mim

À criança que existe em todos nós Sou uma criança carente De carinho, sem pudor De afago e abraço quente Que só deseja o amor Criança rebelde eu sou Que não aceita um não E sem afago não vou Quero especial atenção Sou uma criança vibrante No sentir, viver e amar Por isso sempre falante Do que sinto transbordar Dengosa é essa criança Por muitos eu fui mimada Ao ver o sucesso do outro De inveja fico amuada Sou uma criança alegre Que gosta de fantasia Em busca de quem celebre Momentos de euforia Criança birrenta é meu jeito Não aceito desaforo Quando não esperneio Falo, grito, dou o troco Sou uma criança triste Quando não dão o que quero Ponho o dedo em riste Pelo momento não espero Criança curiosa e afoita Em busca de aventura A imaginação corre solta Disciplina é uma tortura Tão aberto seu coração Em todos ela acredita Sofre de incompreensão Cai sempre em armadilha

53


Essa criança por certo Precisa de educação Para que em retrocesso Não vida só de ilusão Pois o crescer pede O auxílio da temperança Para que em cada adulto Sobreviva uma criança

54


Eu e o Outro Não acredite em nada, não importa onde você tenha lido, ou quem tenha dito, a menos que isso esteja de acordo com a sua própria razão e o seu senso comum. Buddha (Siddharta Gautama) Tenho me questionado o quanto tenho do outro em mim impregnado e o que é de fato meu. O quanto penso, sinto e ajo por iniciativa própia ou pelo outro motivado. É curioso como assimilamos hábitos, gestos, vocabulário e manias numa convivência prolongada e íntima. A formação familiar, ética, religiosa e social exerce uma força poderosa sobre nós. Por esse motivo, procuro não incorporar qualquer informação sem questionar, ainda que esteja em coerência com minhas percepções, ainda que esteja sempre aberta a novos conhecimentos, aprendizados e experiências. Desvios psicológicos nos desviam do caminho do aprendizado pessoal, em busca de nós mesmos, e conduz à exaustiva caminhada em direção ao outro, de seu amor e aceitação. O medo de rejeição nos impede de arriscar sermos autênticos, de nos posicionarmos, de lutarmos pelo que acreditamos. Desenvolvemos, assim, um alto grau de tolerância a condutas desrespeitosas e insensíveis, no afã de que assim seremos amados. Um relacionamento feliz não se determina pela aparente alegria, bem estar ou paz, pois tudo isso pode ser indiferença ou acomodação. Uma união gratificante é aquela onde há espaço para o crescimento. Quando isso não ocorre, o relacionamento se torna insatisfatório, estagnado, e paralisa também o desenvolvimento pessoal. Isso não quer dizer que numa convivência plena não existam falhas e desentendimentos. Não se trata de encontro de anjos. Um relacionamento construtivo trabalha as imperfeições, constrói alternativas, realiza ajustes, favorece concessões mútuas. Acredito que o encontro afetivo só é válido enquanto possibilita que cada um se torne uma pessoa melhor. Estando ambos motivados a se superar individualmente e na convivência, a energia criativa se instala, contribuindo para enfrentar desafios e lidar com diferenças e limitações. O descompasso se instala quando apenas um continua investindo, enquanto o outro se acomoda. A interação importa em viver em comunhão, conhecendo-se, aceitando-se, respeitando-se reciprocamente, revelando-se mutuamente. O acolhimento que a troca produz leva ao auto desenvolvimento. Sem reciprocidade não é possível a continuidade de uma relação feliz, porque “uma andorinha só não faz verão.

55


Uma Segunda Chance Te dou o que sou, o que sinto de amor Ofereço-te a vida incontida e plena Estendo-te o braço, toco-te o ombro E em meio ao assombro foges Recusas a chama da vida Negas-me tempo, atenção Fechas teu coração, inerte Serras os dentes e as mãos E a vida se escoa vazia A dor ecoa, sentida Noites perdidas de insônia Não mais a espera do dia Quando soa a hora da partida Atônito não crês na revelação Lamentas aquilo que não viste Entre as frestas da solidão E apesar do coração sangrando Pulsando por não mais desfrutar Mesmo querendo voltar à vida Negas mais uma chance te dar

56


Inverno Estás disposto a ser suprimido, apagado, extinto, transformado em nada? Estás disposto a transformar-se em nada? Se não estiveres, nunca mudarás de fato. De Phoenix Há quem sinta que sua vida é um inverno. Alguns, porque não têm ninguém para lhes aquecer. Outros, por não sentir o seu próprio calor. A maioria, por não saber pedir ou receber carinho. A natureza somos nós. Quando ela chora, é hora de liberar emoções. É tempo de sentir, sem censura ou reprovação, sem controle. Momento de refletir sobre desejos, sonhos e aspirações. Tempo de recolhimento. O inverno lembra faxina. O céu purifica a atmosfera terrestre com suas águas cristalinas, lava as ruas, telhados, janelas, diminui a luminosidade, com suas nuvens densas, deixa a vida na penumbra, para que nossos olhos cansados possam mirar o sol em busca de respostas. Assim são as nossas águas internas, limpam os recônditos mais escondidos e profundos do ser. Nesses momentos, ter alguém especial em quem possamos confiar os mais íntimos sentimentos e pensamentos é uma dádiva. Ouvir e ser ouvido, dar e receber carinho, distribuir e acolher compreensão. E o que nos impede de desfrutar momentos assim tão gratificantes? Insegurança, medo, vaidade, orgulho, egoísmo. Não estamos habituados a mostrar vulnerabilidade, por receio de não sermos respeitados ou nos sentirmos rejeitados e magoados. O nosso compromisso não é com as exigências que nos fazemos, mas com nosso eu verdadeiro. Revelar sensibilidade é um ato de coragem, e é na vulnerabilidade que mora a força. É preciso honrar a verdade, desapegados de ideias e crenças. Mas como nem sempre a verdade está clara em nossas mentes e corações, até porque ela sempre será relativa, evitamos nos expor. Então por que não expressar a dúvida? A vida não tem seguro, não quer de nós certezas, e sim coragem para viver, e na trajetória, que aqueçamos e sejamos aquecidos, que acolhamos e sejamos acolhidos, fazendo da chuva uma amiga, da natureza uma cúmplice de nossos anseios.

57


Primavera A correr por entre as flores, eu criança quis viver, embalada vou crescer, entre formas, entre cores, em tamanhos, em odores. Na cadência a brisa era o dançar de uma pantera tudo canta a natureza Nos encantos da beleza vejo flor na primavera Ave nobre a me ensinar a magia a me invadir, bela flor que ali colhi, o seu pólen se espalhar. Um portal a atravessar entre nuvens me dissera deslumbrante tal esfera sua imagem realeza Nos encantos da beleza vejo flor na primavera Espumavam em golfadas a brilhar ideias tantas, em cascatas sãs tão santas deslizavam belas fadas. Todo amor feito em camadas veste o sol de toda era florescer a atmosfera é soltar feliz represa Nos encantos da beleza vejo flor na primavera. Ao retê-las evaporam Não se pode aprisionar pensamento a se formar, nas encostas livres moram. As sementes tudo exploram o cultivo o broto espera o labor que o homem dera tece um manto de surpresa Nos encantos da beleza vejo flor na primavera Movimento que seduz 58


o cenário é intrigante O trabalho itinerante faz a noite contra a luz O pequeno grão reluz Combate a sombra severa no luar que reverbera a esperança alva certeza Nos encantos da beleza vejo flor na primavera Bom destino é dado ao grão que nutrido aprende e cresce bem regado então floresce procurando comunhão Esta sorte esta canção novo emblema a Mãe fizera cada lágrima coopera girassol busca pureza Nos encantos da beleza vejo flor na primavera

59


Amor O amor se vive, não se traduz. Rejeita rótulos, não aceita regras. Não tem limites, nem forma ou lugar. Não usa disfarces, nem veste papéis. Ele simplesmente existe, está disponível em sua fonte inesgotável, à espera de quem venha dele beber, para nunca se saciar. Possamos nós, nos invernos da vida, disso lembrar.

60


Ainda sobre o Amor A fome de amor é muito mais difícil de remover do que fome por pão. Madre Tereza de Calcutá Alguns se arvoram em elaborar conceitos e exemplificar situações, como se o amor pudesse ser apreendido pela pobreza das palavras. Outros, mais prudentes, dissertam sobre o que não é amor ou amar. Outros emprestam tais termos na concepção holística do amor incondicional, para esconder nas supostas ações altruísticas sua incapacidade de vivenciar intimidade. Eu, por minha vez, digo que não sei o que é amor, mas estou a cada dia em busca dele. Enquanto não consigo apreendê-lo, procuro experimentá-lo em suas mais diversas versões. Nesta busca, deixo que os sentimentos aflorem e os vivo, na profundidade que sou capaz de sentir, e nestes momentos sou muito grata ao universo por poder compartilhar. Espero que um dia seja livre de censura o bastante para dar vazão aos sentimentos, sensações e pensamentos, permitindo assim me aproximar, cada vez mais, do tão falado amor.

61


Noite Mágica Noite mágica estrelada A teia do tempo trama Cruzar de olhares rentes Cabelos ao vento, clama Bocas de vinho ávidas O hálito quente seduz Fibras sentidas pressentem Deleite ao som de blues Rostos colados, penumbra Na bruma voa a imaginação Olhos fechados sondam O acelerado do coração Respiração ofegante Peitos vibrantes, sussurros Carícias frenéticas, gemidos Delírios, vertigens, tão puros Ecoam acordes agudos Asas de águia ao luar Nudez penetra, navega Riacho de néctar que há Calam as bocas rubras Os corpos suados falecem Ao instante entregues, plenos Alheios a tudo adormecem

62


Celebração Celebro a vida latente Na corrente da criação Expressão em movimento Momento de reflexão O transbordar da alegria Euforia da celebração Germinando sons e acordes Transformando em canção Festejo o leve despertar Da alma, a sensibilidade Nos bastidores da poesia Do imaginário à realidade O mundo de imagens e formas Que materializam a emoção Mãos hábeis, talentosas Emprestam olhos, dão visão Brindo ao palco da vida Com suas comédias insanas Que oferta papéis e cenas Em seus dramas e tramas Gênio que descortina Em suas facetas o amor A arte inspira e revela Em cada um o Criador

63


A Teia Para feliz se viver só uma coisa é preciso, parte da teia fazer, tecer, paciente o tecido.

64


Página em Branco Em frente ao computador, a tela em branco. As ideias me fogem, a percepção, não. Há algo a ser revelado, algo tão simples e belo, tão evidente e verdadeiro, que me fogem as ideias. Percebo que algo se move, se desloca, se despede. Novo ciclo de acontecimentos se inicia. A visão não é mais a mesma, não está clara, mas manifesta. Posso cheirar, sentir, tocar de tão manifesta. Qual página em branco, não posso expressar o que vejo. Há um silêncio que fala. Mas não por linguagem vulgar Fala por sinais de fumaça. Tambores anunciam a chegada do que sempre esteve presente, mas nunca foi percebido. Nada que possa ser traduzido Pela linguagem comum. É sutil e efêmero, é leve e pleno. Dias passam, ventos chegam, não são tempestades, mas brisas quentes. O que anuncia? Uma página em branco. Uma nova chance. Novos rumos, velhos inícios, novos fins. O cheiro é de mudança, o toque é de pétala, a vibração de carroça na estrada, sem pressa.

65


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook

Articles inside

Página em Branco

0
pages 64-65

Ainda sobre o Amor

0
page 60

Noite Mágica

0
page 61

Amor

0
page 59

Uma Segunda Chance

1min
page 55

Primavera

2min
pages 57-58

Inverno

0
page 56

Cuida de Mim

2min
pages 52-53

Maturidade

0
page 51

Tempo

1min
page 41

O Caleidoscópio da Vida

1min
pages 49-50

Integração

2min
pages 47-48

Sombra Minha

0
page 46

Ilusão

2min
pages 44-45

Felicidade

0
page 42

Plenitude

1min
page 43

Esperança e Paciência

1min
page 40

E Viva a Vida

0
page 39

É Sempre Primavera

0
page 38

Faces Femininas

1min
page 37

Despertar

0
page 36

Elo Perdido

0
page 35

Desalento

1min
page 32

Dar um Tempo

3min
pages 33-34

Quando o Silêncio é Ensurdecedor

0
page 31

Regresso

2min
page 30

Por Que é Bom Estar Apaixonado

0
page 29

Desencontro

1min
page 28

Comunicação

2min
pages 26-27

Almas Gêmeas

1min
page 23

Purificação

1min
page 25

O Mito da Opressão

2min
pages 20-21

A Magia do Encontro

0
page 22

Perdão

0
page 18

Compreensão

1min
page 19

Carta ao Vento

0
page 16

Incredulidade

1min
page 10

Liberdade

0
page 11

A grande Batalha

1min
page 7

Escolhas

1min
page 12

Análise da Sensibilidade Feminina

3min
pages 4-5

Nem Mais, Nem Menos

1min
page 13

O Medo como Guia

3min
pages 14-15

Acalanto

1min
page 8
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.