Edição Outubro 480

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Cadeia em Pauta

Visipec em fase de teste Programa cruza dados de GTAs, CAR e Prodes para monitorar fornecedores

Fazendas acima de 100 hectares respondem 90% das ocorrências de desmatadamento na Amazônia; olhar, agora, é para quem faz cria e recria.

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A ideia não é sair bloqueando os fornecedores, e, sim, conversar e tentar regularizar a situação” Francisco Beduschi Neto, especialista da ONG National Wildlife Federation

Tatiana Souto

m sistema que cruza dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR) com informações das Guias de Trânsito Animal (GTAs) e imagens do Prodes/Inpe – que monitora o desmatamento na Amazônia – deve permitir, em breve, que se consiga mapear um elo sensível da cadeia pecuária bovina: o dos fornecedores indiretos. Ou seja, aqueles pecuaristas que trabalham somente com cria ou recria e fornecem animais para as fazendas de engorda, estas consideradas “fornecedoras diretas”, por entregarem o boi terminado para abate no frigorífico. O sistema está sendo desenvolvido pela ONG norte-americana National Wildlife Federation (NWF), em parceria com a Universidade de Wisconsin-Madison, também dos Estados Unidos, e consegue mapear a intrincada teia das fazendas pecuárias que trabalham com cria e recria e todas as suas variantes. Em seguida, os resultados são repassados para uma ferramenta – batizada de Visipec – com a qual as indústrias conseguem sobrepor as propriedades dos “indiretos” a dados de desmatamento do Prodes, para verificar, enfim, se seus fornecedores diretos se conectam de alguma forma com indiretos que tenham passivos ambientais, como desmatamento ilegal. Miner va está testando Os testes, por enquanto localizados na Amazônia, nos Estados de Rondônia, Pará e Mato Grosso, têm sido feitos pela NWF em conjunto com Wisconsin. Recentemente, a Minerva Foods revelou estar utilizando o Visipec, também como teste, para tentar garantir que

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os bois que abate não tenham passado, em nenhum momento da vida, por propriedades irregulares. O agrônomo Francisco Beduschi Neto, especialista em agronegócio sustentável da NWF, conta que a ideia de desenvolver um sistema capaz de cruzar todos esses dados surgiu no Grupo de Trabalho dos Fornecedores Indiretos (GTFI), coordenado pela NWF juntamente com a ONG brasileira Amigos da Terra. Além das ONGs, o GTFI (gtfi.org.br) congrega representantes de toda a cadeia da carne. “Dada a necessidade de monitorar os indiretos na Amazônia – já que os pecuaristas ‘diretos’ os frigoríficos rastreiam desde 2009 –, e tentar prevenir ilegalidades, o grupo se formou”, descreve. Ele garante que todos os dados utilizados estão em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), recentemente aprovada no País. E que as GTAs – que são documentos obrigatórios no transporte de animais vivos – também têm a privacidade preservada. “Wisconsin consegue achar quem são os indiretos por meio da GTA, porém sem identificá-los. Nem a universidade nem a NWF liberam essas informações para o mercado”, garante ele, acrescentando ainda que “tudo o que o Visipec faz (e da forma como que faz )está dentro da lei”. Assinala, também, que apenas frigoríficos têm acesso ao Visipec. “A ferramenta foi desenvolvida para que os frigoríficos pudessem cumprir compromissos assumidos em Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) assinados com o Ministério Público Federal”, explica. Ele informa que o período de captura dos dados de desmatamento será de agosto de 2019 a julho de 2020, cujo relatório, do Prodes, será publicado no fim deste ano. Conversa de parceiro Outra regra estipulada pelos membros do GTFI é que, se houver apenas um fornecedor indireto com alguma irregularidade, a compra pode prosseguir. Já se houver vários indiretos irregulares, a ideia, segundo Beduschi Neto, é chamar o fornecedor direto para conversar a respeito de quem ele está comprando gado magro. “Se for mais de um, o frigorífico conversa, avisa seu fornecedor que o mercado não aceita mais irregularidades e tal”, exemplifica, acrescentando que a abordagem deve ser em tom de parceria entre o produtor rural e o frigorífico. “A ideia não é sair bloqueando os fornecedores logo de cara, senão isso inviabiliza a cadeia produtiva, e sim conversar e tentar regularizar a situação.” Mais uma regra importante do sistema é que apenas fazendas “indiretas” acima de 100 hectares vão ser monitoradas. “Isso porque, pelos nossos levantamentos, embora elas componham metade dos fornecedores indiretos, respondem por cerca de 90% das ocorrências do Prodes”, informa o especialista da NWF. n


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