Revista PRÉMIO | Edição Junho 2022

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LEGADOS

VIDA E TRABALHOS DE MÁRIO ASSIS FERREIRA AO S 7 8 A N O S D E I DA D E M Á R I O A S S I S F E R R E I R A PA R E C E E M PA Z C O M A V I DA . S U S P E I TA - S E , AT É : G R ATO . E A V I DA D O E X- P R E S I D E N T E D O C O N S E L H O D E A D M I N I S T R AÇ ÃO DA E S TO R I L S O L É R I C A E I N T E N S A A VÁ R I O S N Í V E I S . D E S D E O S E U P E R C U R S O P E S S O A L AT É A O S E U T R A B A L H O C O M O A G E N T E C U LT U R A L E M N O M E D A E S T O R I L S O L M U I T O H Á Q U E C O N TA R . TA LV E Z U M D I A E M L I V R O , Q U E M S A B E ? E S TA C O N V E R S A E N TÃO É U M P R E FÁC I O Q U E S E M P R E S A B E R Á A P O U C O .

FOTOS GENTILMENTE CEDIDAS PELO ESTORIL SOL

NUNO MIGUEL GUEDES

Pego, para início de conversa, numa frase sua e que já a vi publicada em vários lugares: “Não acredito na sorte. O que existe é a ausência do azar”. Quer explicar? Quando digo que não acredito na sorte é porque penso que a vida não é uma rotina, qual somatório de dias ao sabor de um indulgente acaso a que geralmente chamamos sorte. E quando afirmo que só acredito na ausência de azar é porque essa ausência exige um “trabalho dos diabos”, um permanente esforço para alcançar um objectivo, um diligente empenho no cumprir de uma missão. Pois a vida é uma batalha que nos impõe o ensejo de afirmação, o propósito de Ser, a chancela com que, afinal, assinamos a tela que retrata a nossa vida. Da sua riquíssima vida lembro de um período mais difícil, talvez onde essa ausência de azar estivesse menos presente, que foi o de 1974. Disse que aprendeu muito com essa fase da sua vida. Um homem está sempre a aprender 42

e 1974 não foi excepção. Nesse dia, − melhor diria, nessa noite – de 25 de Abril, uma vez mais se demonstrou que a ausência de azar exige exemplo e, não raro, alguma contenção. Era jurista na Direcção Geral das Contribuições e Impostos e, em função de vários pareceres que escrevi e foram publicados na revista “Ciência e Técnica Fiscal”, o então Ministro das Finanças, Manuel Cotta Dias, convidou-me para seu Chefe de Gabinete, função que acumulei no Gabinete do Secretário de Estado do Orçamento, Victor Coelho. Por razões de independência política e convicção pessoal, recusei-me a ser formalmente nomeado para essas funções, o que determinou ter sido simplesmente requisitado para as exercer em comissão de serviço. Trabalhava até altas horas da madrugada e, cerca das 4 da manhã do dia 25 de Abril, fui dos primeiros a saber, através de um telefonema recebido do Rádio Clube Português,

que a revolução estava em curso. Telefonei ao então Ministro e dele recebi o pedido para me manter no Ministério das Finanças até que as tropas chegassem e a elas facultar o que me pedissem. Chegaram às 9 da manhã e foi ameno o ambiente em que lhes prestei todas as informações que me foram requeridas. Pelo facto de ser sobejamente conhecido no Ministério das Finanças e ser bem patente a minha independência política relativamente ao regime vigente, continuei a merecer um generalizado reconhecimento, a tal ponto que não apenas mantive as minhas funções de jurista naquele Ministério, como fui designado, conjuntamente com o então Presidente do Banco do Fomento, para organizar e lançar o primeiro empréstimo público da revolução, designado por “Títulos do Tesouro para a Reconstrução Nacional”. Tive “a ausência de azar” dessa emissão de dívida pública ter sido um êxito, pois esgotou-se no próprio dia do lançamento!


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