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INTRODUÇÃO Sou criola/ Neguinha, mulata e muito mais, camará!/ Minha história/ É suada igual dança no ilê/ Ninguém vai me dizer o meu lugar Sou Zezé, sou Leci/ Mercedes Baptista, Ednanci/ Aída, Ciata/ Quelé, Mãe Beata e Aracy Pele preta nessa terra/ É bandeira de guerra porque vi/ Conceição ou Dandara/ Pra matar preconceito eu renasci. [Pra matar preconceito eu renasci, Manu da Cuíca e Raul DiCaprio]
As mulheres negras são as vozes, os corpos e as almas do Brasil. Foram elas que com seus trabalhos construíram nosso país educando novas gerações, mantendo famílias unidas, criando cultura, alimentando corpos e almas. Mesmo assim, dentro de uma lógica capitalista, branca e patriarcal, elas foram invisibilizadas, colocadas à margem na contação da história da produção de bens e saberes. As dores delas foram ignoradas e suas pautas postergadas. Hoje, no Rio de Janeiro, um grupo articulado de mulheres sambistas busca através do samba visibilizar esse protagonismo feminino negro e questionar o patriarcalismo que historicamente as subjuga. Pretendo, assim, analisar neste trabalho esse movimento de mulheres sambistas que vem priorizando uma agenda feminista na produção cultural do samba na cidade do Rio de Janeiro e verificar se esse samba, produzido, composto e cantado por essas mulheres, pode ser uma ferramenta de emancipação em direitos humanos a partir da perspectiva delas. A (in)visibilização da mulher negra no constante movimento de construção do samba carioca é marcada pelo patriarcalismo. Historicamente, enquanto as mulheres brancas foram excluídas do mercado de trabalho, restando-lhes o trabalho doméstico, não monetizado, do qual se aproveitaram os homens duplamente, as mulheres negras foram objetificadas sexualmente e tidas como mão de obra barata, trabalhando frequentemente para as mulheres brancas, além do trabalho de cuidado nas suas próprias casas. Com os movimentos feministas protagonizados pelas mulheres negras e socialistas, a partir das décadas de 1970 e 1980, a ausência dos debates de raça e classe dentro do próprio movimento feminista passa a ser questionada, junto com um movimento de descolonização do pensamento ocidental. A inclusão desses debates no movimento feminista traz à tona o racismo que segrega e oprime as mulheres negras, maioria na sociedade brasileira, questionando esse modelo de ser e estar no mundo de inspiração capitalista neoliberal. Por isso, busco também mostrar como a subjugação das mulheres, inclusive no samba, por intermédio do patriarcalismo, é a base da solidificação do neoliberalismo como modelo econômico global, ressaltando não só o debate de raça e gênero, mas também de classe. As mulheres, dentro de uma lógica colonial, são pequenos subtítulos dos livros e