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Nosso compromisso, na qualidade de pessoas que refletem sobre — e se comprometem com — os direitos humanos, reside em “colocar frases” às práticas sociais de indivíduos e grupos que lutam cotidianamente para que esses “fatos” que ocorrem nos contextos concretos e materiais em que vivemos possam ser transformados em outros mais justos, equilibrados e igualitários. Por isso, a verdade é posta por aqueles que lutam pelos direitos. A nós compete o papel de colocar as frases. E esse é o único modo de ir complementando a teoria com a prática e com as dinâmicas sociais: chave do critério de verdade de toda reflexão intelectual (HERRERA FLORES, 2009, p. 25).
Num contexto de mundo de neoliberalismo global, em que o Brasil tem sentido nos últimos anos uma maior pressão do mercado com a recessão econômica, o impeachment midiatizado da primeira mulher eleita presidenta e a eleição de um governo com pauta ultraconservadora e ultraliberal, falar sobre direitos humanos olhando os agentes das lutas sociais e os processos culturais exige esse posicionamento político compromissado com o respeito às diversidades e a luta pela igualdade.
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Caixa de ferramentas: para pensar os direitos humanos
A investigação que pretendo fazer nesse trabalho, de verificação do samba como ferramenta de emancipação em direitos humanos, só é possível desde que se entenda direitos humanos como os processos de luta que buscam os meios necessários para uma vida digna, como ensina Herrera Flores: Os direitos humanos, mais que direitos “propriamente ditos”, são processos; ou seja, o resultado sempre provisório das lutas que os seres humanos colocam em prática para ter acesso aos bens necessários para a vida. Como vimos, os direitos humanos não devem confundir-se com os direitos positivados no âmbito nacional ou internacional. Uma constituição ou um tratado internacional não criam direitos humanos. Admitir que o direito cria direito significa cair na falácia do positivismo mais retrógrado que não sai de seu próprio círculo vicioso. Daí que, para nós, o problema não é de como um direito se transforma em direito humano, mas sim como um “direito humano” consegue se transformar em direito, ou seja, como consegue obter a garantia jurídica para sua melhor implantação e efetividade. Os direitos humanos são uma convenção cultural que utilizamos para introduzir uma tensão entre os direitos reconhecidos e as práticas sociais que buscam tanto seu reconhecimento positivado como outra forma de reconhecimento ou outro procedimento que garanta algo que é, ao mesmo tempo, exterior e interior a tais normas (HERRERA FLORES, 2009, p. 28, grifo no original).
Direitos humanos são um produto da reação cultural frente aos processos de luta pela dignidade humana. Dignidade humana aqui significa os bens materiais necessários para uma vida digna, quais sejam, “expressão, convicção religiosa, educação, moradia, trabalho, meio ambiente, cidadania, alimentação sadia, tempo para o lazer e formação, patrimônio histórico-