O ESGAR DO CRÂNIO NU: a construção da imagem do corpo em Hilda Hilst e Iberê Camargo

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Como na pintura Monturo que quer dizer lugar onde se depositam dejeções, lixo, ou imundícies; lixeira; monte de lixo, de imundícies, de coisas sujas ou imprestáveis; lixeira, estrumeira, busilhão, volutabro, montureira, montão de coisas vis ou repugnantes, no quadro (fig. 80), pode-­‐se ver um amontoado de coisas, signos, setas, carretéis, o autorretrato de Iberê, cruzes, ou seja, esta tela representa a memória do pintor. O lugar imundo e abjeto onde ele, com as mãos, foi resgatar seu passado que não volta mais. Lá, Iberê Camargo pôde recordar-­‐se de seus brinquedos, seus amores, lá na memória do corpo-­‐lixo, do corpo abjeto. 3.3. CONCLUSÃO: IN PROGRESS A imagem do corpo nas pinturas de Iberê Camargo, realizadas no período entre 1980 e 1994, o ano de sua morte, apresenta-­‐se de forma grotesca, onde seus personagens revelam uma corporeidade fragmentada, imersos em uma atmosfera angustiante e pesada. Seus corpos também revelam um erotismo grotesco em que predominam o baixo corporal, a frontalidade de suas genitálias e o sexo animal sem romantismo. A escatologia também envolve a construção da imagética corporal do pintor, quando elementos abjetos, como a matéria fecal, são incorporados em suas telas, desenhos e textos. Todo o seu trabalho, pictural e literário, é de cunho autobiográfico. Iberê só pinta o que está ao alcance dos olhos ou o que habita sua memória. Figuras, coisas e espaço pictórico interagem em síntese para ascender a perplexidade do homem no mundo. O prazer dos sentidos gerados pelo traço nervoso, mas infalível domina com maestria a dinâmica da transfiguração: capta a fugacidade e fixa o peso da carne que vive na angústia de nossa finitude. Ao evidenciar com semelhante grau de virtuosismo a miséria, a violência, a tragédia, a demência do presente, Camargo, em seus últimos trabalhos, parece que os faz para se salvar. Fora isso, qualquer especulação, qualquer opinião ociosa ou pretensiosa, qualquer definição rigorosa, não seriam suficientes perante a grandeza


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5.1.7 Vídeo

11min
pages 292-301

Conclusão

5min
pages 302-304

Referências

17min
pages 305-318

5.1.6. Livro de artista

6min
pages 284-291

5.1.5. Animação

2min
pages 281-283

5.1.4. Fotografias

4min
pages 274-280

5.1.3. Gravuras

7min
pages 269-273

5.1.2. Desenhos

5min
pages 263-268

Cap. 5. O corpo intersemiótico

7min
pages 246-252

4.2.Um esgar mais que imperfeito

1min
pages 244-245

4.1. O corpo político

20min
pages 229-243

Cap.4. Hilda Hilst e Iberê Camargo: o esgar do crânio nu

46min
pages 199-228

3.2. Pinturas de 1980 1994: Corpos densos

58min
pages 150-196

3.3. Conclusão: In progress

1min
pages 197-198

3.1. Da crítica

12min
pages 141-149

2.8. Inconclusões

5min
pages 138-140

2.6. O Unicórnio : o corpo bestial

20min
pages 124-134

2.7. Floema : o corpo na mesa de dissecação

5min
pages 135-137

2.3. Fluxo : o corpo grotesco

48min
pages 72-97

2.5. Lázaro : o corpo reencarnado

28min
pages 108-123

2.4. Osmo : decifra meu corpo ou eu te devoro

21min
pages 98-107

2.2. Fluxo floema: a imagem do corpo estranho

13min
pages 64-71

2.2. O corpo grotesco

11min
pages 44-50

2.3. O corpo abjeto

14min
pages 51-58

Introdução

21min
pages 19-30

Cap.1 A construção da imagem do corpo

19min
pages 31-43
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