O ESGAR DO CRÂNIO NU: a construção da imagem do corpo em Hilda Hilst e Iberê Camargo

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4.2 -­‐ UM ESGAR MAIS QUE IMPERFEITO Hilda Hilst e Iberê Camargo nunca se conheceram. Provavelmente nenhum dos dois nunca mencionou o trabalho, ou sequer o nome do outro. Viveram em cidades diferentes e em tempos diferentes. Entretanto, pude identificar várias correspondências entre seus procedimentos criativos e temas. O texto de Hilst, repleto de imagens, impregna-­‐se pelo pictural de Camargo e vice-­‐ versa. Ambos diluem-­‐se entre si em uma sutil emulsão, e sem remeterem às obras um do outro tecem relações in absentia, ou seja, alusões genéricas, indiretas, da escritora ao pintor e do pintor à escritora. São correspondências. Para tanto, convoca-­‐se a competência do leitor e do expectador, sua grade de associações culturais e artísticas, seu museu imaginário. (OLIVEIRA, 2012, p. 86) A construção da imagética do corpo dialoga em diversos momentos, principalmente com a morte. Ambos usam esse arquétipo do cadáver, cadere, caído, a imagem do corpo grotesco, velho e próximo à terra. A imagem da caveira também é elencada em diversos momentos como a imagem de um corpo eterno, a imagem da memória, tão prezada tanto à escritora quanto ao pintor. A imagem do corpo em Hilst e em Iberê também está vinculada não ao medo da morte, pois essa é certa, é rainha, chega a qualquer hora, mas está associada à angústia de viver, do corpo exposto a um existir doído e injusto. O medo também se reflete nesses corpos representados pela autora e pelo pintor, mas o medo da opressão e da violência vivida em tempos onde o homem subjuga o próprio homem. Com isso, tem-­‐se, nas duas obras, a imagem do grito, o grito de terror e de dor. Apresenta-­‐se também, diante de uma tragédia iminente, um corpo irônico, pessimista, capaz do mais horrível riso grotesco. Um corpo que apresenta-­‐se desprovido de carnes, com ossos e vísceras expostas. Um corpo fantasmagórico. Em Hilda Hilst e nas pinturas de Iberê Camargo, o corpo também é apresentado de forma metafórica, onde animais de reputação grotesca e abjeta como ratos, serpentes, sapos, cães sarnentos e famintos, são convocados para expressarem situações humanas. Até carcaças de carros abandonados em ferro-­‐velhos são


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5.1.7 Vídeo

11min
pages 292-301

Conclusão

5min
pages 302-304

Referências

17min
pages 305-318

5.1.6. Livro de artista

6min
pages 284-291

5.1.5. Animação

2min
pages 281-283

5.1.4. Fotografias

4min
pages 274-280

5.1.3. Gravuras

7min
pages 269-273

5.1.2. Desenhos

5min
pages 263-268

Cap. 5. O corpo intersemiótico

7min
pages 246-252

4.2.Um esgar mais que imperfeito

1min
pages 244-245

4.1. O corpo político

20min
pages 229-243

Cap.4. Hilda Hilst e Iberê Camargo: o esgar do crânio nu

46min
pages 199-228

3.2. Pinturas de 1980 1994: Corpos densos

58min
pages 150-196

3.3. Conclusão: In progress

1min
pages 197-198

3.1. Da crítica

12min
pages 141-149

2.8. Inconclusões

5min
pages 138-140

2.6. O Unicórnio : o corpo bestial

20min
pages 124-134

2.7. Floema : o corpo na mesa de dissecação

5min
pages 135-137

2.3. Fluxo : o corpo grotesco

48min
pages 72-97

2.5. Lázaro : o corpo reencarnado

28min
pages 108-123

2.4. Osmo : decifra meu corpo ou eu te devoro

21min
pages 98-107

2.2. Fluxo floema: a imagem do corpo estranho

13min
pages 64-71

2.2. O corpo grotesco

11min
pages 44-50

2.3. O corpo abjeto

14min
pages 51-58

Introdução

21min
pages 19-30

Cap.1 A construção da imagem do corpo

19min
pages 31-43
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