Prosa Quente
Guerra ao empirismo O veterinário José Zambrano defende a “ciência com pés no campo” e a adoção de protocolos sanitários personalizados para melhorar a saúde geral dos rebanhos
C Cerca de 90%-95% dos problemas sanitários nas fazendas são consequência de mal manejo. Nas fazendas de cria, um ponto crítico é o tratamento do umbigo”
om 12 anos de experiência na área de saúde animal, o veterinário José Azael Zambrano Uribe, 35 anos, é um defensor do planejamento para a prevenção de episódios sanitários. Está sempre com os pés no campo, mas a cabeça focada na ciência. “Precisamos nos manter longe do empirismo, ainda forte no Brasil. Tem gente que diz tratar verminose com o mesmo vermífugo de 12 anos atrás. Será que funciona?”, exemplifica. Nascido em Lara, no noroeste da Venezuela, ele se formou em 2008, pela Universidad Centroccidental Lisandro Alvarado (Ucla) e estagiou, como parte do curso, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Em 2011, voltou ao Brasil para fazer mestrado sobre clostridioses na mesma instituição de ensino e emendou um doutorado em tristeza parasitária bovina, concluído em 2018. “Sempre quis entender o porquê das coisas”, diz.
Renato – Como é feito seu trabalho e o de sua equipe quando chegam na fazenda? O que procuram investigar? Zambrano – Normalmente, nossa equipe, composta por mim e
os veterinários Rafael Perez, Bruno Guimarães e João Diniz Thalyson Teodoro, é chamada nas fazendas por três motivos: atendimento de surtos, diagnóstico sanitário e acompanhamento regular. No primeiro caso, investigamos as causas do surto e tomamos medidas para debelá-lo. No segundo, avaliamos todos os dados de morbidade, número de casos clínicos e mortalidade na propriedade, quantos animais estão sendo desmamados adequadamente, rodamos a propriedade toda, avaliamos os fatores de risco, como está a conservação dos alimentos, a dieta dos animais, o manejo e apresentamos um diagnóstico, indicando possíveis estratégias de controle sanitário. No terceiro caso, além desse trabalho, fazemos
12 DBO setembro 2020
A experiência acadêmica embasou sua trajetória profissional. “As pessoas veem o veterinário sanitarista como aquele cara que chega na fazenda, diagnostica um animal, indica um tratamento e vai embora. Faz a cirurgia de um boi e vai embora. Mas sanidade é muito mais do que isso. No Brasil aprendi o conceito de medicina de produção, que permite entender como a nutrição, a reprodução, o manejo interferem na saúde do rebanho. É nisso que acredito”, relata Zambrano. A oportunidade de colocar suas ideias em prática surgiu em 2017. “Eu ainda estava fazendo meu doutorado e atendia uma propriedade cliente da Rehagro Consuloria, de Lavras, MG. Um dia, o Clóvis Corrêa [um dos fundadores da empresa] foi visitar essa propriedade e eu falei a ele o que pensava sobre esse novo papel do veterinário. Ele me disse que era justamente o que a Rehagro fazia: aplicar conhecimento dentro das fazendas”, recorda Zambrano. Apesar da sintonia de conceitos, o consultoria mineira não dispunha de uma equipe específica de saúde animal, área na qual Zambrano almejava atuar. “Pouco tempo depois apresentei a eles a proposta realizar esse trabalho e compraram a ideia”. No início, o veterinário venezuelano tocou a empreitada sozinho; hoje, é coordenador de sanidade da empresa, comandando uma equipe de cinco profissionais e seis estagiários, que atuam nos Estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Tocantins e, mais recentemente, Bahia. Nesta entrevista concedida ao repórter Renato Villela, Zambrano fala sobre o problemas que encontra nas fazendas, novos desafios sanitários e a importância dos protocolos personalizados, que às vezes demandam uma verdadeira investigação epidemiológica para assegurar a saúde do rebanho. Confira! acompanhamento periódico, duas vezes por ano ou até mensal, com foco principalmente no treinamento de pessoas. Renato – Quais problemas você costuma encontrar nesses diagnósticos? Pode citar os três mais importantes? Zambrano – Isso muda um pouco, em função da categoria
animal, mas, antes de falar dos desafios, queria ressaltar que 90%-95% das doenças ou problemas sanitários nas fazendas são consequência de mal manejo. Nas fazendas de cria, um ponto muito crítico é o tratamento do umbigo. Por incrível que pareça, temos relatos de propriedades onde as onfalites são responsáveis por 40% das mortes pré-desmama. Depois vem a rejeição dos bezerros pelas mães, principalmente novilhas (isso faz com que não sejam bem colostrados) e as diarreias. Na recria, os principais problemas são as vermino-