Cemitério dos Aflitos: contos de vida - romance histórico de Thais Matarazzo

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Thais Matarazzo

Cabocla

do

Pará

“O eco da primeira palavra fica sempre no coração.” Provérbio africano

M

aria do Pilar era da província do Pará. Tinha cabelos lisos, pele morena e baixa estatura. Chegou a São Paulo na companhia da família de Luiz Machado, proprietário de uma chácara para os lados do (atual) Cambuci. O acesso dava-se pelo Caminho do Mar e por lá passavam muitos tropeiros e viajantes. A casa que habitavam tinha as paredes caiadas de branco, mas estavam amarelas de velhas. O chão era de tábuas, estava encardido, foi poucas vezes raspado. A varrição era feita apenas uma vez por semana. O piso da cozinha era de terra batida e cheio de buracos, estava sempre enlameado. As “secretas” (espécie de penicos) ficavam do lado de fora do lar, atrás de umas trepadeiras. Duas escravizadas se revezavam no esvaziamento das tinas aonde eram depositados as “imundices” (urinas e excrementos) e outros refugos da casa. Tocar violão e cantar era o que melhor Maria do Pilar sabia fazer, além de tratar da sua sinhá. Gostava de apanhar flores e colocá-las nas tranças do cabelo. — Pilar, Pilar, Pilarrrrrrrrrrrr... - chamava a sua patroa a qualquer momento e exigia ser atendida imediatamente. Não era fácil a vida naquela chácara. 61


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