MURILLO LINO - São Paulo, SP NA FILA DO ÔNIBUS Como todos os dias de minha rotina de paulistano médio, eu estava em uma imensa fila, esperando um ônibus no terminal próximo à minha casa. A fila era para o segundo ônibus, para melhorar minha situação. 90% das pessoas estava mexendo no celular e os outros 10% ou estavam sem bateria ou foram roubados na semana anterior. Uma pessoa em situação de rua pedia por alguns trocados na fila do ônibus. Quase ninguém se prestava a pelo menos ouvir a fala do sujeito - e nem preciso comentar sobre os que desviavam o olhar com nojo. Não sei por que raios comecei a pensar em minha breve trajetória na poesia. Desde a infância, a vontade de escrever é parte essencial de mim. Embora o esboço de uma humilde carreira no ramo só tenha acontecido na vida adulta, sempre tive de lidar com os palpiteiros de plantão. Pessoas que por muitas vezes nunca ou raramente haviam aberto um livro. Pelo menos, não além de tarefas obrigatórias. No entanto, opiniões sobre textos imaginários e dicas tornaram-se rotineiras. Nos primeiros sinais de gosto pela poesia, surgiram, quase como uma resposta, falas como: “a poesia está nas alegrias da vida”; “a poesia está nas dádivas e presentes de Deus”; “só existe poesia onde existe amor”. Não digo que essas falas sejam mentirosas ou inválidas, pelo contrário, acredito que exista algo de verdade nelas, mas nunca consegui sentir-me conectado a elas. Nunca me pareceram apresentar sentido completo e, para bem da verdade, só me serviram para atrasar a manifestação artística da poesia. Quantas dessas pessoas, na fila, tiveram que adiar seus sonhos? Foi só no início da vida adulta, em ocasião de um evento traumático, que minha vida mudou de caminhos e tomou a estrada da escrita. E, então, perdi toda a esperança de encontrar a poesia nas “alegrias da vida”. É bem verdade que eu não sentia muitas alegrias - a depressão é mesmo um saco - porém, não saiam textos nem sobre as alegrias dos outros. Eu só conseguia escrever sobre tristezas e isso fez sentido para mim por um bom tempo. Até que não fez mais. Em algum ponto de minha história literária, que não necessariamente foi um momento ou uma época específica, aquele sentimento de incompletude em relação ao lugar da poesia voltou. A tristeza não era mais suficiente. Onde estaria a poesia? Qual seria o lado poético da vida? Como meus primeiros passos no mercado literário já haviam sido dados, decidi fazer essas perguntas aos meus colegas escritores. As respostas não me surpreenderam: “a poesia é feita de dor”; “quando estou para baixo é que saem os melhores textos”; “nunca consigo escrever em dias alegres. Agora, quando estou triste, ou irritada, escrever é uma necessidade”. Frustrei-me e não esperava mais resposta alguma para a questão. Foi então, ainda na fila, que uma situação aparentemente aleatória me trouxe a tal resposta. Uma epifania, talvez. revelou um novo significado que mostrou-se completo e 144