ORIANA FREIRE DE BARROS - Olinda, PE O CADERNO VERMELHO DE POESIA Logo nos primeiros anos da minha adolescência, lembro que eu adorava poesia e tanto fiz, que comecei a escrever pequenos versos num caderno que comprei só para registrar esses meus primeiros escritos. Gostava de ficar imaginando rimas para tudo o que me cercava, era uma espécie de treino para quando fosse colocar no papel. Acho que essa foi a minha primeira percepção que de tudo se faz poesia. Foi quando enxerguei também que isso está ao alcance de todos e, que cada um ao seu modo, pode exprimir seus sentimentos em versos. Foi nessa mesma época que conheci uma jovem muito humilde, mas extremamente romântica, que vivia a recitar suas rimas apaixonadas, eu me divertia com suas criações e creio que isso, de certa forma, foi uma inspiração para as primeiras páginas do meu caderno vermelho de poesia. A medida que o tempo foi passando percebi que, embora gostasse de poesia, ainda não seria esse o meu foco, porém não teria como deixar de ver e sentir que muitos instantes da vida parecem uma poesia pronta. E pude confirmar isso muitos anos depois, quando conheci um colega de trabalho e poeta popular, que transformava cada novo acontecimento, alegre ou triste, num conjunto de versos fabulosos que encantava a todos. Se eu achava que o sorriso de uma criança, um raiar do dia, um pôr de sol ou a magia da natureza eram pura poesia, vi muito mais do que isso, que cada gesto nosso e cada momento, quando captado pelo olhar sensível de um poeta, pode se transformar em pura poesia, pois assim é a vida. Às vezes queremos tanto dizer algo quando temos diante dos nossos olhos uma imagem que nos toca, que mexe com a nossa alma, buscamos palavras, mas não encontramos, então só sentimos. Penso que é aquele poema que estava ali pronto, mas não soubemos traduzir em palavras aquele momento ou aquela visão tão especial, em que uma poesia poderia delineá-los numa forma perfeita, dando vida àquele olhar e àquele sentimento que juntos seriam como uma flor que desabrocha quando chega a sua hora, nada mais adequado. E é por isso que até a lágrima que rola pela face, mesmo quando não é de alegria, muitas vezes move a mão do poeta, a dor também inspira o coração, pois é emoção que transborda e quando se materializada em palavras, pode transformar-se nos mais belos e tocantes versos que esses sentimentos podem produzir. Afinal o amor e a dor, seja como for, serão sempre cor, sabor, odor e tudo o mais que os sentimentos guardam e devolvem ao coração. Quando as lembranças são acionadas pelos sentidos, elas nada mais são que estrofes bem elaboradas combinando elementos que outrora fizeram parte de cenas da vida, cada quadro poderia ser um verso, assim como uma fotografia, que num espaço limitado sintetiza uma história, um momento, um sentimento. E assim é a vida.
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