ALL EM REVISTA, Vol. 8, No. 4 - OUTUBRO A DEZEMBRO 2021

Page 228

O ANVERSO VISÍVEL NO AVESSO ABSTRATO E POÉTICO DE RAFAEL OLIVEIRA FERNANDO BRAGA in ‘Conversas Vadias’, antologia de textos do autor. Ilustração: capa do livro de Rafael Oliveira, 'O Avesso abstrato das coisas', ora comentado.

Um dos bons livros que li no clamor destes dias difíceis, foi ‘O Avesso abstrato das coisas’, do jovem poeta e brilhante médico Rafael Oliveira. Insaturável por pensar ter perdido algo de seu, no veio do poema, o que não é infrequente que o ache, vez que essa coisa é trazida dentro de si, em paráfrase ao que diz o notável mexicano Octávio Paz, prêmio Nobel de literatura de 1990, Rafael Oliveira, no domínio crescente dessa síntese, neste ‘O Avesso abstrato das coisas’, formata o livro como se fora um código de doenças, onde cada uma das enfermidades descritas, é diagnosticada com perfeição fisiológica, análoga à sua correspondente na simbologia poética. Vou ao encontro do poeta Rafael Oliveira em sua oficina de verbos, ou em seu consultório-ambulatorial, e encontro também o doutor Rafael Oliveira, que numa mais que necessária e providencial ‘Anamnese’, fazme entender, como se num canto de um mais-que-perfeito, o que talvez alguém lh’o dissera há pouco, ou eu mesmo, nem sei: “vivia como um adjetivo velho / morava ao lado de uns parênteses / guardava sempre umas reticências no bolso / delirava comum interjeição na madrugada/ queixava de dores em todas as partes/ esperava partir no barco da lua sem solidão.” E atônito, e atarantado diante daquelas palavras sintomáticas, mas saudáveis, não aguentei o ímpeto e lhe disse que um dos problemas de minha consulta era o meu peso, e precisava de ‘exercício poético’, apesar de minha alma ser leve na magia de suas sombras, e extensa como nos poema de Fernando Pessoa, para o poeta Rafael aconselhar-me: “ estica a ponta do dedo até tocar/ a menina que apanhava horizontes perdidos nos olhos.” E continuamos a consulta: O que faço para a ‘esteatose’, vez que tu sabes que não fico sem o vinho, porque sem o vinho serei órfão de minhas verdades e até de minhas vergonhas, como diria a nossa querida Cora Coralina; o poeta Rafael coçou a cabeça e como um bom abstêmio me disse: ”mal me quer a vida/ bem me quer a vodka /viver sem rumo leva a nada.” [Só que o poeta errou no gênero da bebida]. O ilustre professor de literatura, José Neres, meu ilustre confrade na Academia Maranhense de Letras, diz ao poeta Rafael Oliveira, nas orelhas deste ‘Avesso abstrato das coisas’ que “[...] é impossível não se emocionar com a leveza com que você trabalha os sintomas de males como o Parkinson e o Alzheimer. Cada uma de suas escolhas lexicais foram feitas sob medida para ensinar, emocionar e despertar em cada leitor uma incômoda sensação de estar sentindo na pele os diversos problemas aos quais estão expostos pelo simples motivo de estarmos vivos.” E só para lembrar o que José Neres afirma, ouçamos o poeta a diagnosticar em versos, esses achaques neurológicos. O Parkinson: “a palavra treme no papel / piora noutro verso/ ilegível poema”. E o Alzheimer: “esquecer a virgula depois da manhã/ a tarde perde o sentido/ o pôr do sol não cabe na memória.” Lá pelas páginas tantas peço-lhe conselhos pra estabilizar a ‘pressão alta’, já que vivo a brincar de ‘preto fugido’ com ela, e Rafael, o médico, responde pelo Rafael, o poeta: “ver o pôr do sol numa tarde qualquer/ evitar nuvens insubordinadas dentro dos olhos/ tomar uma cápsula de lua ao dormir.”


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook

Articles inside

THOMÉ THEMISTOCLES MADEIRA JÚNIOR

34min
pages 265-296

FERNANDO BRAGA

4min
pages 263-264

DEZ POETAS O SIMBOLISMO E O POETA MARANHÃO SOBRINHO

26min
pages 249-262

FERNANDO BRAGA

8min
pages 246-248

RAIMUNDO FONTENELE

10min
pages 242-245

FERNANDO BAGA

9min
pages 238-241

EDMILSON SANCHES

7min
pages 233-237

RAFAELA PEREIRA

4min
pages 230-232

FERNANDO BRAGA

3min
pages 228-229

FERNANDO BRAGA

5min
pages 222-225

MANOEL SANTOS NETO

4min
pages 226-227

JOÃO BATISTA DO LAGO

2min
page 221

GRACILENE PINTO - Grace Do Maranhão

3min
pages 218-220

PAULO RODRIGUES

6min
pages 210-211

FERNANDO BRAGA

4min
pages 216-217

ARLINDO TADEU HAGEN

12min
pages 212-215

MHARIO LINCOLN

2min
pages 208-209

H O N O R Á R I O S / C O R R E S P O N D E N T E S / C O L A B O R A D O R E S

0
page 195

O ARREPENDIMENTO

3min
page 191

CADEIRA 38 – JOSÉ NERES

11min
pages 185-189

CADEIRA 37 – JADIR LESSA

2min
page 184

A INIMIGA FIEL

0
pages 182-183

CONVOCAÇAO PARA O ALÉM

3min
pages 180-181

CADEIRA 26 – JOÃOZINHO RIBEIRO

3min
pages 161-162

CADEIRA 22 – ANTONIO AÍLTON

6min
pages 157-160

PRIMEIROS REGISTROS DA POESIA NA IMPRENSA DO MARANHÃO – DÉCADA DE 1820

9min
pages 146-156

MARANHÃO NO PREMIO JABUTI

14min
pages 135-145

O CURITIBANO FREDERICK CHARLES TATE OU O TENENTE RUI E OS POLONESES - RICARDO BÜRGEL

20min
pages 114-126

GUAXENDUBA: uma 'BATALHA' ou SIMPLES ESCARAMUÇA?

4min
pages 131-134

CADEIRA 21 – LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

0
pages 112-113

AS MEMÓRIAS DE UM VISIONÁRIO

2min
page 101

O SINAL DE BLUMBERG

1min
page 100

ROMPENDO O SILÊNCIO!!!- JEAN -PIERRE ALVIM FERREIRA

4min
pages 96-98

FLOR DE VERÃO

2min
page 99

DISCURSO DE RECEPÇÃO DO ACADÊMICO DANIEL BLUME POR SONIA ALMEIDA

18min
pages 81-91

Ah! QUANTAS LEMBRANÇAS

14min
pages 102-111

PINHEIRO E O SEU CENTRO CULTURAL

4min
pages 92-93

PAVOR E SANGUE NA NOITE EM TERESÓPOLIS

2min
pages 94-95

A VIDA É EFÊMERA, O AMOR, JAMAIS

5min
pages 66-67

CASA VAZIA FIM DE TARDE

10min
pages 49-59

FELIS

5min
pages 29-36

NA RESERVA

4min
pages 62-63

QUEBRANDO O PRECONCEITO

3min
pages 64-65

CAJARI, ALEGRA-TE

12min
pages 68-80

CERIMÔNIA DE OUTORGA: MEDALHA DO MÉRITO “LAURA ROSA” - SAUDAÇÃO

2min
pages 42-46

POEMA IN(ACABADO

4min
pages 47-48
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.