2, rue Desnouettes e o hóspede “clandestino” Depois da rue Thibouméry, aluguei uma chambre de bonne na rue Desnouettes, na Porte de Versailles, por meio de um anúncio da Aliança Francesa. Fomos morar lá, eu e o Marcius como “passageiro clandestino” (uma das regras para alugar aquele quarto era, ridiculamente, não permitir a presença de homens). A chambre de bonne ficava no oitavo andar. O elevador só ia até o sétimo, numa clara demonstração de que as empregadas domésticas, para as quais esse infame sistema tinha sido criado, eram proibidas de andar de elevador. Como a maioria dos franceses não empregava mais domésticas, esses quartos eram alugados a estudantes. Em geral, tinham somente uma pia. A toalete, no corredor, era coletiva. Tomávamos banhos de pia. De vez em quando, íamos à casa de amigos tomar uma chuveirada. Uma noite estávamos no quarto, eu, Marcius e Iuli, tomando vinho, conversando e ouvindo Bob Dylan quando a proprietária abriu a porta com sua chave, sem bater. Fez um escândalo porque eu estava com homens no quarto e me disse que eu deveria desocupá-lo em três dias. Passamos os próximos dias procurando um novo lugar para morar. Alugamos um quarto bem menor no Boulevard de la Bastille. Em troca, eu deveria buscar uma criança na escola e me ocupar dela todos os dias até às oito da noite. A menina, de quem eu estava encarregada de cuidar, era insuportável. Gritava o tempo todo, não obedecia, um inferno. O quarto era mínimo. Só tinha lugar para uma cama e a pia. 60