LiteraLivre Vl. 6 - nº 31 –Jan./Fev. de 2022
Clarice de Assis Rosa Ituiutaba/MG
Impotência Diante Da Morte Acostumara-se, desde muito novo, com o trabalho pesado. Com apenas cinco anos, seu pai levava-o à fazenda em que trabalhava como caseiro. Aprendeu que ter responsabilidade deve ser prioridade na vida de um homem, que brincadeiras com outras crianças era a última das opções. Nunca pôde fazer esta escolha. Não havia necessidade de permanecer na escola. “Basta ser alfabetizado” - assim pensava seu pai, complementando que a função do homem é ser o mantenedor da família, garantir proteção e força a ela, mesmo que para isso fosse necessário abrir mão dos seus sonhos, de suas horas de lazer. Viver em prol da família, esse era o real sentido da vida, na concepção do pai. Davi seguia a vida de acordo com as orientações recebidas desde a infância. Muitas vezes, via seus vizinhos brincarem na rua, jogarem bola e sentia vontade de interagir, de fazer parte do grupo, no entanto, logo vinha a culpa por ver a dificuldade que seu pai enfrentava diariamente para manter o sustento de casa. Sua mãe e suas irmãs faziam o serviço doméstico, cabia a ele e ao pai trabalhar arduamente para manter a família. Não seria justo perder tempo com diversões, quando conhecia
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a sua obrigação como homem, mesmo sendo ainda uma criança. Com quinze anos, já fazia praticamente sozinho todo o serviço da fazenda, satisfeito em poder facilitar o trabalho do pai, que já não tinha a mesma disposição de outrora. Acordava às quatro para tirar leite das vacas, alimentar os animais, apanhar as hortaliças, que logo seriam recolhidas para serem levadas à feira. Muitas vezes, cabia-lhe também a função de levar o filho do patrão até o ponto de ônibus para que pudesse pegar o ônibus escolar. Hoje, casado, recordava-se de sua infância, não sentia culpa por ter dedicado a sua vida ao trabalho, ao contrário, atribuia a sua força e coragem aos ensinamentos que tivera com o pai. Aprendera a ser homem. Marilda, sua esposa, sentia falta de ter um marido presente. Casou-se acreditando que dessa forma passaria mais tempo com ele, já que quando namoravam não tinham tantas oportunidades. Não o julgava, respeitava-o, nada lhe faltava, apenas se ressentia por esperá-lo ansiosamente à noite, e ele chegar exausto, já adormecendo.