LiteraLivre Vl. 6 - nº 31 –Jan./Fev. de 2022
Joedyr Gonçalves Bellas São Gonçalo/RJ
O Tiro Uma bala. Corre-corre. A mãe segura o menino pela mão, provavelmente, seu filho, e se põe em disparada seguindo a manada em pânico. Corre e não tem nem tempo de pensar. É só correr. É o que importa nesse momento em que se ouve o barulho de um tiro e a bala com a sua fatalidade de morte rompendo barreiras. Os meninos vão pra praia com suas bermudas de grife. As bermudas escorregam pela cintura abaixo e as bundas ficam à mostra. Joana amou de paixão o Carlos, Carlos tinha um revólver escondido no armário, não tão escondido assim, Joana sabia do revólver escondido no armário e sabia do ciúme de Carlos. Um ciúme doentio. De vasculhar mensagens no celular de Joana, de seguir pé-antepé os passos de Joana, de tentar afugentar os fantasmas dele e os fantasmas não arredarem pé do Carlos. A perspectiva de um tiro. Joana só pensava em pegar seu filho pelo braço, correr sem parar, mas Carlos sempre tinha um sorriso na cara. Debochado, maligno. Seu José era um velho desses velhos camaradas. Gostava de jogar sueca com seus parceiros velhos na mesa da praia de Icaraí. No calçadão. Os meninos de bermuda na grife com a bunda aparecendo, todos desencardidos, fazendo arruaça no quintal dos outros. Madamas de narizes tortos e carteiras vomitando dinheiro com medo dos meninos com bermuda na grife de bunda de fora. Os velhos não se importavam. Só se importavam com a mão das cartas, com a sorte do trunfo ser de copas e fechar uma cruz. As cruzes da cidade e seus cristos dependurados de cabeça pra baixo. A coroa de espinho e um tiro certeiro em cada testa. O buraco profundo das testas e Tomé não acreditava no que via. Minha avó vivia dizendo que sem amor não se consegue nem atravessar a rua. O bar estava lotado. Era uma conversa normal. Esses papos de botequim regados à cachaça e calabresa fria dançando no óleo. Alguém puxa um revólver ou diz que vai puxar. Ameaça. Com mulher dos outros não se mexe, não fala gracinhas nem insinua bobagens.
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