LiteraLivre Vl. 6 - nº 32 – mar./abr. de 2022
Bruno Antonio Picoli Chapecó/SC
Memória escolar 1992, classe do pré-escolar da professora Cleusa. Eram duas turmas no Colégio Estadual Gomes Carneiro: os da “Tia Cleusa” e os da “Tia Neiva”. Eventualmente as turmas eram reunidas e nessas ocasiões o desconforto tinha até cheiro, algo como casca de ovo misturado com cola tenaz. No espaço contíguo a sala fazíamos o recreio. Era um terreno acidentando, um barranco inclinado o bastante para não ser possível ficar parado muito tempo mas que permitia uso por aquelas crianças que não podiam desfrutar das quadras esportivas logo acima, tomadas pelos maiores que praticavam um futebol criativo em que tudo podia ser bola. No recreio não monitorado a brincadeira consistia num desenho complexo em que cada turma formava um reino, com rei, generais e todo o resto. O objetivo era capturar os membros da outra casa real. Eu, é claro, era um soldadinho. O “nosso” rei era sempre o mesmo menino, até um dia que ele cansou da brincadeira. Como todos queriam ser rei e não chegamos a nenhum consenso decidimos revezar no cargo: cada dia seria um rei diferente, para que fosse justo. A coisa parecia promissora. Um dia o Rei regressou, queria brincar de novo, e, lógico, na condição de rei. Foi aclamado pelos demais. Menos por mim, aquele era o meu dia de ser o rei. “Tia” Cleusa tinha um método próprio de avaliar as atividades de seus alunos: simpáticos carimbos que mantinha sobre sua mesa e pomposamente afagava na almofada. As figuras dos carimbos eram simples, bonecos palitos que portavam em seus finos braços figuras: o quadrado para um trabalho regular, o triângulo para um bom e uma estrela de cinco pontas para um ótimo. Naquele dia entreguei meu desenho à profe Cleusa. Ela o mediu com os olhos, me fitou, deteve-se novamente sobre o papel. Abriu a gaveta e de lá retirou um carimbo. Senti um frio que começou nos meus calcanhares e instantaneamente se apoderou de minha coluna. Ela, mantendo o ritual
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