LiteraLivre Vl. 6 - nº 32 – mar./abr. de 2022
Edih Longo São Paulo/SP
(IN)cidadania Cândido era puro como o nome. Chegou
peito. Olhou para o companheiro do
do interior com uma mala e o peito
lado que estava com as mãos presas
cheio de vontade de vencer na cidade
e um olhar de fera acuada. Olhou
grande. Seria uma história banal se
para a mulher do outro lado e ela,
descendo
apesar de ter um filete de sangue nos
ônibus
a
não
ladeira
do
tivesse
terminal
sido
de
roubado.
lábios
vermelhos
e
uma
mancha
Procurou um guarda que o mandou para
negra nos olhos, piscou para ele
a Delegacia mais próxima. Perdeu-se no
escandalosamente.
caminho e quando deu por si, estava
— Onde estou? Perguntou-lhe.
envolto em um corre-corre de gente que
— No esgoto do mundo, a
não acabava mais.
mulher respondeu.
Assustado, nem percebeu quando foi segurado pelo braço e jogado dentro
O
guarda
que
o
trouxera
aproximou-se.
de um carro parecendo uma gaiola.
— Onde estou? Perguntou-lhe.
Quanto mais explicava, menos o policial
— Em uma Delegacia.
acreditava nele, mandando-o calar a boca.
— Ah, graças a Deus, acabei vindo ao lugar certo. Eu gostaria de
— O que aconteceu? Perguntou.
fazer uma queixa: fui roubado.
O guarda deu-lhe um tapa no rosto, batendo fundo na sua dignidade. Finalmente,
chegaram
a
um
local
grande, com uma fila maior ainda de gente que estava esperando para ser atendida. Sentou-se no lugar indicado com as mãos trêmulas apertando o
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— Aqui a gente prende e não atende aos agitadores, camarada. — Agitador, eu?! Mas eu sou uma pessoa calma. Eu fui roubado. — Você estava numa passeata comunista e diz que foi roubado?