LiteraLivre Vl. 5 - nº 28 – jul./Ago. de 2021
Patrícia Machado Brasília/DF
O homem do saco existe sim! Meus pais sempre me asseveravam da existência do homem do saco. Algumas de minhas amigas diziam já tê-lo visto. Desde pequena, no entanto, eu era incrédula, nem a história do papai Noel me convencia. O horror provocado pela história do homem do saco, contada repetidas vezes, era oportuno aos adultos. Bastava uma malcriação ou um resmungo para que a figura do homem sujo e malvado fosse invocada, como uma espécie de vingador dos pais ofendidos. Uma ameaça sutil, ou nem tão sutil assim. Mais rebelde que minhas irmãs eu chegava mesmo a desafiá-lo, tentando no fundo afrontar as ameaças paternas: “que venha, que tente me pegar”. Devo confessar, todavia, que essa valentia provinha menos da minha coragem do que do fato de eu ter sido sempre uma menina boazinha, ou pelo menos até a adolescência, o que me tirava imediatamente das possíveis presas do homem do saco: os desobedientes, os preguiçosos, os resmungões, os não estudiosos... Uma noite meu pai ficou sem seus cigarros, estava cansado, delegou a mim e minha irmã a tarefa de ir buscá-los. Saímos queixosas noite afora, bar a dentro. Eu tinha seis anos. Embora envergonhas na presença de tantos homens bêbados e exaltados, avistamos um que nos chamou a atenção, destacava-se pelo tamanho e a natureza grotesca. Curvada, a criatura buscava no chão tocos de cigarro e nas mesas restos de bebida. Ele era enorme, feio, braços desproporcionalmente delgados e nas costas um gigantesco saco sujo. Minha irmã me olhou e, sem que uma palavra fosse pronunciada, reconheci em seu rosto o mesmo pavor pelo qual havia sido tomada. “Ele não vai nos machucar”, pensei já tentando descobrir ao meu redor se os boêmios apesar da embriaguez também podiam notar o estranho. O que me assustou. Era como se nem o homem nem nós existíssemos, como se
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