LiteraLivre Vl. 4 - nº 23 – Set./Out. de 2020
Isabel Macedo T Rio De Janeiro/RJ
As Flores Vermelhas parte 1 A música suave tocava no quarto e espalhava melodia pelos cômodos da casa amarela com cortinas laranjas. O chá-verde esfriava na mesa branca da cozinha ao lado do jornal do dia. Algumas abelhas procuravam as flores recém-cortadas do jardim a fim de levarem o pólen para a colmeia. As janelas com dobradiças enferrujadas se balançavam para dentro e para fora com o vento da manhã. O sol pintava os lençóis embolados na cama. e um grito agudo e triste interrompeu o canto dos pássaros nos galhos das árvores. A jovem correu pelos cômodos e manchou o marrom dos tacos de madeira do chão com um vermelho intenso. As paredes se encolhiam para não serem vítimas da cor intrusa. Mas Sabrina não temia o olhar de repulsa da casa e só queria terminar o que havia começado com a jovem. Bela e nova e caída no azulejo branco do banheiro. Pelos pulsos escuros corriam rios que logo encontravam seu destino final: o ralo. o espelho tentou lhe mostrar uma última verdade, mas a jovem não tinha mais forças para se olhar. Sabrina sorriu ao ver o corpo aberto e exposto ali. Era vitória afinal. Sabrina sendo sempre tão perfeccionista, planejou o plano com detalhes e destreza. ela penteou os cabelos e bebeu água. regou as plantas e escreveu nas notas da geladeira que a manteiga havia acabado. Sabrina se ama o suficiente para ser fiel a ela mesma até o último suspiro. “creio eu ser esperta para não deixar rastros ou migalhas. as almofadas estão na poltrona errada e essa faca era pesada demais antes, mas durante foi leve como a folha daquela árvore no jardim. meus pés flutuavam enquanto eu a perseguia e a cortava.” “seria esse meu ato final? ou a ação mais marcante de minha vida? creio eu que o gato da vizinha não me pedirá mais afago no final da tarde. ou que mamãe não me dirá para cortar as unhas do pé quando nos vermos no fim do ano. ou que Gaia sorrirá para mim enquanto cozinha nosso jantar. que fiz eu? estraguei minha vida ou me coroei rainha desta terra? há pó embaixo da cama e tenho quase certeza que traças estão fazendo seu caminho para a estante com
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