LiteraLivre Vl. 5 - nº 27– mai/jun. de 2021
JAX
Joana-De-Barro Havia muitos dessa espécie no
Pobre
dessa
Joana-de-barro
arvoredo diante do edifício. Joões e
para quem nenhum poeta de peso
Joanas a ciscar por ali e a recolher o
perderá seu tempo em dedicar seus
barro com que constroem seus lares.
versos.
O
canto
surpreendentemente
possante, forte
para
Insignificante,
resta-lhe
o
perambular pela grama, remexendo
tamanho do corpo, chega a incomodar
folhas, catando barro e fugindo à
os moradores na hora da sesta ou em
eventual aproximação de estranhos.
outra ocasião que reclame silêncio.
Mesmo quando se arrisca a ficar
Fora disso, pouca atenção lhes é concedida. não
parada,
sem
fugir
de
pronto,
o
máximo que consegue é algum olhar
A penugem, de um bege fosco,
de
contribui
contudo, recebe olhares de desdém.
para
conferir
maior
destaque à sua presença. Mal serve pra dar pena. Joana
piedade.
No
mais
das
vezes,
Sofre calada, quase sempre. Se canta, mal revela a tristeza do seu
ressente-se,
porém,
da
indiferença com que é tratada.
viver pé-no-chão, entre folhas tão secas quanto ela.
Como todo ser, espera alguma
Faz de tudo para permanecer
consideração, sonha até com o amor.
fiel e não causar insatisfação ao
Qual! Quanta ilusão tola!
companheiro, cuja cantoria ilude a
Seu cérebro, atrofiado pela falta
ponto de transformá-lo em ídolo. Ela
de acesso à educação, assemelha-se ao
bem sabe, no entanto, que, se a
da maioria dos congêneres que alçam
situação
vôo incerto, sem estarem habilitados a
entregar a própria mãe. Aprisionar
subir na vida.
sua parceira em casa, então, constitui
aperta,
ele
é
capaz
de
tarefa fácil e típica para sua espécie.
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