LiteraLivre Vl. 5 - nº 27– mai/jun. de 2021
Joedyr Goçalves Bellas São Gonçalo/RJ
O rio do quintal da minha casa No quintal da nossa casa passava um rio
de uma bola de borracha para fazer
e
um gol insuperável, o gol dos gols,
minha
avó,
chamávamos
Voinha,
como
carinhosamente,
a
batizou
aquele
que
nunca
alguém
tivera
esse rio como lembranças.
sequer imaginado em fazer. E eu
Enquanto existir esse rio dentro de
fizera. Era a magia do rio. Voinha via
vocês,
se
sua aldeia sendo dizimada pela praga
acabado, virado pó, a casa demolida, o
dos gafanhotos ou pela praga da
quintal
cobiça humana, de querer sempre
mesmo
que
cimentado,
evaporado
para
tudo a
ir
tenha
água
morar
do em
rio uma
mais
um
pouquinho,
de
não
se
se
contentar, mas Voinha não chorava,
esperar, irá chover dentro de vocês e
dizia que tudo era parte do rio e não
suas
por
tinha como apagar as patas dos
lembranças que nenhum cupim é capaz
cavalos pisoteando hortas, arrozais,
de devorar, que nenhum tempo ousará
as meninas em choro escondendo a
apagar.
vergonha e suas vergonhas, em vão,
nuvem,
Os
um
dia,
almas
livros
quando
serão
estarão
menos
inundadas
empoeirados
em
alguma estante.
o poder do homem em destruir não tinha limite, mas Voinha conseguia enxergar uma figueira milenar, via a
E a gente se debruçava sobre o leito do
mãe dela lavando a roupa no rio esse
rio, quando Voinha escapulia para a sua
mesmo
aldeia lá de trás de todos os mundos,
debruçados e eu aproveitava e pedia
por trás de montanhas e morros, para
à benção aos meus tataravós, as
nos carregar pelas mãos já descarnadas,
roupas no quaradouro, os cacos de
pelas pernas cansadas, mas víamos os
telha, os pedaços de sabão, Diana
meninos correndo como eu corria atrás
correndo a lambuzar minha cara com
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rio
que
nós
estamos