LiteraLivre Vl. 5 - nº 27– mai/jun. de 2021
David Ehrlich Curitiba/PR
O Mesmo Havia bastante gente no parque. Com a bola de basquete embaixo do braço, Cruz olhava para o celular enquanto digitava uma mensagem carinhosa. Ao lado dele, sua irmã fazia careta, mas o jovem pouco se importou. Estava surpreso que tinha conseguido manter conversa por tanto tempo com a menina que conheceu no aplicativo de relacionamento, e amanhã seria o grande dia em que eles se conheceriam pessoalmente. Mas não hoje. Hoje era outro grande dia. Reconheceu Jedi à distância: apesar do parque cheio, não era difícil reconhecer um poste de mais de 2 metros de altura. Vendo-o de perto, porém, começou a se perguntar se aquele realmente era o mesmo Jedi com quem vinha jogando basquete há tanto tempo: estava extremamente pálido, e o jovem, que já era naturalmente magro, estava quase só osso. Se ele estava assim agora, Cruz não queria nem imaginar o estado no qual ele saiu do hospital após todo aquele tempo entubado na UTI. - Vai mesmo jogar? – Perguntou Cruz. - Nunca arreguei um jogo na minha vida, vou arregar agora? –
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Respondeu Jedi, com um leve tom ofendido na voz. Cruz encolheu os ombros e entregou a bola para sua irmã. Ela não desgrudava os olhos de Jedi. Cruz conseguia entender: jamais contaria para ela, mas a tinha ouvido chorar sozinha no banheiro quando veio a notícia de que Jedi fora internado. Os três se posicionaram no centro da quadra, e a irmã jogou a bola, começando a partida. Cruz pegou a bola, porém manteve-se afastado de Jedi, demorando-se para correr até a cesta. Queria ver se seu rival continuava o mesmo. Vinte e uma vezes eles se confrontaram naquela quadra. E vinte e uma vezes Jedi venceu. Não que Cruz fosse um mal jogador: ele foi o líder do time da sua escola, e agora na faculdade estava representando muito bem a atlética do seu curso. Mas Jedi era de outro nível. Poderia estar jogando profissionalmente. Se ele não jogava porque não queria ou porque não aparecia oportunidade, Cruz não sabia. Talvez sua irmã soubesse. Mas de uma forma ou de outra, Jedi era o único jogador de basquete que Cruz nunca havia conseguido vencer.