LiteraLivre Vl. 5 - nº 27– mai/jun. de 2021
Fábio Daflon Vitória/ES
Judô Justo naquele dia começara o horário de verão, talvez por isso o atraso de Evaristo. Trabalhávamos no mesmo hospital há um ano, nossos filhos tinham a mesma idade. Por contingências profissionais mudara para Campo Grande, Zona Oeste do Rio de Janeiro, a fim de ficar perto do Hospital onde possuía cotas. Éramos sócios. Adiantar uma hora do relógio e ainda aturar atraso é dose. Antes morava em Copacabana, ainda frequentava o Leme Tênis Clube. O combinado era pegar uma piscina e depois almoçar por lá. Mas Evaristo só chegou depois das dez horas. Está tarde, disse, sem desculpar-se, Copacabana fica muito longe, que tal se nós formos para Barra de Guaratiba? Olhei para minha mulher. Ela estava impaciente. Está bem, vamos logo, então. Pode ser no meu carro? Pode. Marieta sentou atrás com as crianças. Evaristo ligou o ar e pôs som na caixa. Relaxamos. O trânsito ajudou, chegamos rápido. Está vendo lá embaixo é a Prainha. Lugar lindo. Faixa estreita de areia entre dois rochedos. Escadaria para descer do bar até a praia. Bom serviço de garçom. Pedimos duas caipirinhas e patinhas de caranguejo. Marieta, coca light. Guaraná para as crianças. Fascinada pelo mar, Julieta não me deixou beber a caipira inteira. Comi só duas patinhas. Pai, vamos para praia? Já, já, espera um pouco. Comi mais uma patinha. Felipe não quis descer comigo, preferiu ficar com o pai. Evaristo se divorciara da mulher, o guri andava apegado. A Prainha é mar aberto. Apenas uns gatos pingados estavam na areia. Caminhei pela areia fofa. Senti piso duro e úmido sob meus pés. Hesitei em seguir em frente. O mar a uns dez metros. O mar sempre me intrigou, seja como metáfora do desejo seja pelas suas nuances de violência e cor. Julieta se agachara. Percebi a língua d´água agigantar a tempo de gritar, Ju corra para meu colo! Lutara judô pela equipe da faculdade nos jogos universitários, mas já não praticava há mais de 10 anos. Acolhi minha garota ao colo. Ela agarrou-se ao meu pescoço. Virei de costas e abri as pernas, com leve flexão dos joelhos. Os gatos pingados debandaram com medo de água fria. Marieta trocava olhar comigo. A língua d’água lambeu nossos corpos até o pescoço. Foi lá na frente e voltou tirando areia debaixo dos meus pés. Cavou um buraco. Saí do mar com areia nos tornozelos. Fôramos salvos pela base do judô. Subi até o bar do rochedo, bebi o resto da caipirinha e disse Evaristo vamos para casa.
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