LiteraLivre Vl. 6 - nº 34 – Jul./Ago. de 2022
Roberto Schima Itanhaém/SP
Gonjiro Gonjiro preparava-se para sair com sua mãe. Havia alívio em seu olhar. Livre do medo. Deles. Miyazuru Shimada, a mãe, pretendia comprar alguns peixes, algas desidratadas e arroz, não obstante o racionamento do pós-guerra. - Vamos? - indagara ao filho de sete anos. - Eba! - respondera a criança. A mãe franzira o cenho. Tal euforia não era uma atitude comum da parte dele. Habitualmente, seu semblante era melancólico, e não seria ela quem iria culpa-lo. Dada a sua natureza retraída, Gonjiro não tinha amigos de sua idade, fosse pela vizinhança ou na escola. Exceto quando ia à escola, evitava sair para além dos limites do quintal a fim de não se deparar com estranhos. Preferia o isolamento do seu pequeno mundo no quarto ou na sala, onde ficava lendo mangás, desenhando monstros num bloco de papel ou escutando histórias de fantasmas junto ao rádio. Outros garotos achavam-no esquisito, maluco a bem da verdade, quando dele se lembravam.
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Em verdade, Miyazuru até preferia que Gonjiro fosse assim. Ao menos, sabia exatamente onde o menino se encontrava, ao contrário de outras mães cujos filhos rebeldes perambulavam pelas ruas do vilarejo, a fim de roubar alguma coisa. A II Guerra Mundial arruinara o Japão e, conforme era de praxe, a população pagava um preço bastante alto pela prepotência e ambições de sua elite abastada, fosse ela civil ou militar. As atrocidades que seus soldados cometeram na China, Coréia, Filipinas e outros países não seriam esquecidas tão cedo, talvez nunca. Quem poderia culpá-los? Quanto ao próprio Gonjiro, sua ansiedade por sair, contrariando a sua natureza, tinha uma razão: Os monstros. Sim, ao menos por algumas horas, ficaria longe das criaturas apavorantes. Nutria uma relação e temor e afeição por eles que não sabia explicar. Temor por razões óbvias, afinal, eram monstros. Afeição porque, bem ou mal, nunca lhe feriram realmente, e representavam a única companhia além de sua mãe - com a qual