LiteraLivre Vl. 6 - nº 34 – Jul./Ago. de 2022
Sonia Re Rocha Rodrigues Santos/SP
Uma mulher na sombra A senhora Alzira faleceu de repente,
um banho, comer algo. Você vai
depois de 30 anos de um casamento, se
primeiro, eu fico com sua mãe.
não feliz, harmonioso.
— A madrinha me acompanha?
Sua filha Nadir, sentada ao lado do
Ela observou a troca de olhares entre
caixão, enxugou discretamente os olhos
eles.
com um lencinho de papel e olhou ao
— Claro, vamos.
redor de si. Viu as costas do pai e a mão
Enquanto se encaminhavam para o
da madrinha no braço dele, e logo atrás
carro, Nadir ia recordando o pouco
da
tempo que passara em companhia
mão,
uns
olhos
atentos.
Bem
atentos e brilhantes. O pai, reparou ela,
dessa
retribuía o gesto.
notícias apenas em duas ocasiões:
Pouca gente havia no velório. Nadir, o
em seus aniversários e nas vésperas
pai, a madrinha e alguns vizinhos que já
de Natal.
tratavam de se despedir.
Nos
— Voltaremos para a cerimônia. Aliás, a
enviava um presente, sempre caro,
cremação é bem mais bonita. A senhora
grande, algo que o pai sabia que ela
não acha?
queria muito. Nos natais, enquanto a
— Acho triste.
mãe recebia os visitantes, o pai saía
— Ah, claro. Queira desculpar...
com ela para algumas visitas de
A madrinha agora aproximou-se, olhos
praxe
baixos, afastada do pai, e propôs que
parentes
saíssem para um lanche.
visitavam a madrinha.
- Deixando o cadáver sozinho? Nunca.
Um dia mudaram de cidade, mas as
— Filha, ainda faltam algumas horas,
visitas natalinas continuaram, pois o
melhor ir para casa, descansar, tomar
pai
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madrinha,
aniversários
ia
a
de
da
alguns
a
tinha
afilhada
amigos,
distantes.
visitar
quem
Por
família,
ela
clientes, último,
e,
de