LiteraLivre Vl. 5 - nº 26 – Mar./Abr. de 2021
vez. Aquele elástico tinha chegado ao fim dos seus dias e Letícia não sabia como contornar aquela situação tão desesperadora. Saíra do banheiro para o pátio desnorteada. As colegas haviam notado sua preocupação. Jamais contaria para elas. Pensou ao encontrá-las —Fazer o quê, como sair dessa enrascada? Perguntava-se Letícia completamente alheia às partes de conversas despreocupadas que ouvia. — Como vou sair daqui sem calcinha! Será que as pessoas vão perceber algo estranho em mim? Letícia pensava e se perguntava quando estava no banheiro sozinha com seu dilema. Lembrou-se da decisão que tomou de enrolar a calcinha em um papel e jogá-la no lixo, na esperança de que nunca, jamais fosse encontrada por alguém —, e se todos perceberem que estou sem minhas roupas íntimas? Continuava a pensar com a testa franzida em preocupação Para ela, era como se o olhar das pessoas pudesse penetrar através da farda e ela se tornasse transparente aos seus olhos. — Descoberta. Aqueles foram os piores momentos da sua vida. As colegas continuavam tagarelando e tentando incluí-la na conversa. — Vamos Letícia. Fala alguma coisa. Você está muito calada hoje, e você não é assim. —Vamos passear no centro da cidade depois da aula? Perguntavam eufóricas já visualizando os prazeres da aventura.
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— Não sei, vamos ver. Vou pensar. Respondia evasivamente. Sabia muito bem que não as acompanharia naquela farra. Pelo menos não “naquele dia”. Um som estridente se fez ouvir. Pernas corriam por todos os lados. Salas se enchiam novamente. — Quem perdeu essa calcinha? — Ai meu Deus — Letícia voltou a si. Estava tão imersa em pensamentos que achou que tinha ouvido a voz de alguém. Estava com os nervos à flor da pele. Sentia-se péssima. Era só a sirene tocando. Acabara o intervalo. A volta para casa não saía de sua cabeça. Com atravessar aquela ponte com aquele vento. Como passar por ali, quando se estava como ela, sem as roupas de baixo. A volta para casa não saía de sua cabeça. Era sempre um sufoco atravessar aquela maldita ponte. Passar por ali, sobretudo, quando se estava como ela; sem as roupas de baixo. - “E se eu não conseguir segurar os livros e a saia ao mesmo tempo; e se o vento me deixar nua, em plena ponte? O que será de mim? Que vergonha, meu Deus!”. Estes pensamentos tomaram conta da mente de Letícia durante todo o resto das aulas naquele fatídico dia. Mais um toque estridente. — A aula acabou. E agora? suspira profundamente.
Letícia
Despede-se das colegas. Claro que não aceitou o convite de ir com elas para o centro da cidade. — Olhar vitrines! —