APRESENTAÇÃO “Comentários a uma sentença: o Caso Lula” é talvez o mais importante documento jurídico publicado no Brasil em décadas. A presente coletânea de artigos nasceu de um movimento espontâneo e bastante significativo de juristas brasileiros e estrangeiros que examinaram cuidadosamente a sentença proferida no âmbito do processo que tramitou na 13ª Vara Federal de Curitiba, no caso que ficou conhecido na mídia como o do “tríplex do Guarujá”. Para além do caráter inédito da condenação criminal de um ex-Presidente da República em circunstâncias políticas em tese não comparáveis às das ditaduras brasileiras do século passado, a sentença, que em larga medida era aguardada como desfecho não surpreendente deste processo criminal, provocou imediata reação entre os que a leram comprometidos unicamente com o propósito de tentar entender os motivos pelos quais Luiz Inácio Lula da Silva está sendo punido pela prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de ativos de origem ilícita. A certeza da condenação era fato. Admiradores e opositores do ex-presidente sabiam que não haveria outro veredito. A dúvida residia em conhecer as razões da condenação, exigência normativa da Constituição de 1988 que, pelas inevitáveis repercussões políticas do mencionado processo, mostraram o acerto do Constituinte de 1987-1988 ao elevar a fundamentação das decisões ao patamar de garantia constitucional do processo. Apenas recentemente, depois de vinte anos de intensa batalha jurídica protagonizada por Fernando Fernandes, por coincidência advogado de Paulo Tarciso Okamoto, que neste caso do “tríplex do Guarujá” figura como réu ao lado do ex-presidente Lula, logrou-se cumprir decisão do Supremo Tribunal Federal, dando a conhecer os áudios dos julgamentos que o Superior Tribunal Militar (STM) realizou durante a ditadura de 1964-1985. Os referidos julgamentos, tornados públicos agora, revelam as virtudes democráticas da publicidade do processo e da motivação das decisões. Frases do tipo “Eu vou tomar uma decisão revolucionária, deixando de lado a lei, porque pela lei não se pode condená-lo de maneira nenhuma”, ditas nos julgamentos, pelas mais altas autoridades judiciárias militares e civis, em um ambiente de segredo, hoje são conhecidas de todos os que se derem ao trabalho de ouvir os áudios daquelas sessões. A motivação das decisões e a publicidade dos julgamentos são as armas pacíficas do Estado de Direito contra arbítrios e abusos, além de proporcionarem aos tribunais a oportunidade de uma maior qualidade e eficiência na tarefa de corrigir sentenças consideradas injustas, malgrado proferidas com apoio em sincera crença de que o direito foi aplicado ao caso concreto. Ademais, o trabalho dos juízes, como expressão de atividade republicana regulada por um conjunto escrupuloso de regras jurídicas materiais e processuais, está sujeito a ser conhecido e avaliado não somente pelas partes destinatárias diretas da sentença. Cada pessoa, interessada na sorte de seu semelhante submetido a um processo criminal, dispõe de meios e recursos para promover uma verdadeira arqueologia das razões pelas quais alguém é condenado ou absolvido. COMENTÁRIOS A UMA SENTENÇA ANUNCIADA: O PROCESO LULA 10