QUID IAM AGUNT PUERI? POR QUE AGIRAM ASSIM, MENINOS? Eugênio José Guilherme de Aragão* É de obscura proveniência medieval o provérbio "sunt pueri pueri – pueri puerilia tractant". A aparente tautologia poderia ser traduzida por "sois meninos, seus meninos! e meninos fazem meninices!". Outra frase, esta de Virgílio, que, neste dramático momento nacional me vem à mente é "quid legitis flores et humi nascentia fraga, frigidus, O puer fugite hinc, latet anguis in herba" (Éclogas III 93), com o sentido de - fujam, meninos pastores que colhem flores e morangos ao solo, (pois) a serpente se esconde debaixo da relva. Ao tempo em que Moro se festeja com falsa modéstia em sua mais que previsível sentença condenatória contra Lula, propaga-se que os norte-americanos realizam manobras militares na Amazônia com os exércitos do Brasil, da Colômbia e do Peru, a tríplice aliança subcontinental da reação ao progresso, à altivez e à independência dos povos latino-americanos. Moro, o embevecido juiz que gasta quase uma centena de páginas na sentença para se justificar e atacar a defesa que legitimamente apontou para sua suspeição ao longo de todo o processo, se comporta como o menino com suas meninices. E a serpente que o colocou lá onde está nos vigia para dar o bote final. No rastro dessa toada, já destruiu estratégicos ativos nacionais, como a indústria da construção civil e o setor pecuário. Tudo em nome de um fetichista combate seletivo à corrupção que virou fixação coletiva. Não fosse tão trágica no momento que o Brasil do golpe vive, a sentença de Moro seria uma piada, de tão tosca. Mal instaurada a instância, ninguém tinha dúvida que o brioso magistrado pretendia construir seu currículo com a condenação do ex-presidente, ao passo que socializava abertamente com a oposição mais feroz aos governos do PT das últimas duas décadas. A foto do juiz em bem-humorada confraternização com Aécio Neves, às costas de Temer, é muito eloquente. Está ali, Moro, com toda a simpatia que contrasta com a agressividade no trato coma defesa de Lula. Um juiz no speak easy com um político de quinta categoria, acusado, com indícios mui robustos, de desvio de recursos públicos, de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. O interlocutor risonho não é ninguém menos do que o derrotado candidato a presidente da república, que, por não assimilar sua derrota, jogou a democracia brasileira na sua pior crise desde a reinstalação do governo civil em 1985. Mas Moro mostra com suas gargalhadas que aprova integralmente o golpe dado pelas instituições deformadas do país. É visível sua ternura para com aquele que foi o estopim da derrocada dos governos populares de que Lula foi seu maior protagonista. À sentença. Li e reli relatório e qual não foi minha surpresa ao não detectar em nenhum de seus parágrafos enumerados com meticulosidade burocrática qualquer referência às testemunhas da defesa. Já a indicação dos testemunhos de acusação mereceu cuidadosa indexação. Vou para a fundamentação. Páginas mais páginas de autodefesa do brioso juiz de piso. Ao réu, palavras de ressentimento por ter exercido em toda extensão possível seu direito de defesa. Digo "possível" porque os defensores tiveram *
Advogado. Ex-Ministro da Justiça. COMENTÁRIOS A UMA SENTENÇA ANUNCIADA: O PROCESO LULA 128