O DESRESPEITO AO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA E A RUPTURA DO PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE JUDICIAL Flavio Crocce Caetano∗ A ninguém é dado desconhecer que, em qualquer relação processual, em todos os âmbitos jurídicos possíveis, como cível, eleitoral, trabalhista, criminal, ou qualquer outro, a solução estatal através da jurisdição observará necessariamente princípios fundamentais, tais como bilateralidade de audiência, igualdade entre as partes e, sobretudo, a imparcialidade do julgador. Assim é em nosso ordenamento jurídico constitucional-processual, como também o é na maioria dos sistemas jurídicos processuais do mundo e no sistema internacional de proteção aos direitos humanos, como se depreende, por exemplo, das regras estabelecidas no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos,144 ratificado por 169 países:145 Artigo 14 1. Todas as pessoas são iguais perante os tribunais e as cortes de justiça. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida publicamente e com devidas garantias por um tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei, na apuração de qualquer acusação de caráter penal formulada contra ela ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil. (...) O art. 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (UDHR),146 anteriormente ao Pacto, também já previa que “Todos têm direito em completa igualdade a um processo justo e público por um tribunal independente e imparcial, na determinação de seus direitos e obrigações e de qualquer acusação penal contra si.” No âmbito regional, O art. 8, §1, da Convenção Americana de Direitos Humanos (ACHR) de 1969 prevê, dentre outras coisas, que “Toda pessoa tem direito a um processo com as devidas garantias e com uma razoável duração julgado por um tribunal competente, independente e imparcial, previamente estabelecido pela lei, na busca de provas em causa de natureza penal ou para determinação de seus direitos e obrigações de natureza, civil, trabalhista, fiscal ou qualquer outra natureza.” Em suma, em uma relação jurídico-processual não há e não pode haver qualquer relação de supremacia entre aquele que julga, o que acusa e o que defende. Todos desempenham funções igualmente essenciais à Justiça, porém com papéis absolutamente distintos e que devem ser respeitados em sua inteireza.
Advogado, Professor de Direitos Humanos da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Secretário Nacional de Reforma do Judiciário (2012 a 2015). 144 Adotado pela XXI Sessão da Assembleia-Geral das Nações Unidas, em 16 de dezembro de 1966; aprovado pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo n° 226, de 12 de dezembro de 1991; o promulgado pelo Decreto n 592, de 6 de julho de 1992. 145 Cf. consulta ao website da Organização das Nações Unidas na data de 23 de julho de 2017. Disponível em https://treaties.un.org/Pages/ViewDetails.aspx?src=IND&mtdsg_no=IV-4&chapter=4&clang=_en. 146 Proclamada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. ∗
145 COMENTÁRIOS A UMA SENTENÇA ANUNCIADA: O PROCESO LULA