SENTENÇA DE LULA E LAVA JATO À LUZ DO DIREITO INQUISITORIAL NO BRASIL NO SÉCULO XVIII Isabela de Andrade Pena Miranda Corby* Daniel Gonzaga Miranda** Nas oportunidades que tocamos na temática do Direito Inquisitorial160, quase sempre nos vem à imaginação cenas de fogueiras, punições em praças públicas da Europa Medieval e magistrados parciais que, como tentáculos da Igreja, investigam, inquirem, sentenciam e executam. Todo este imaginário nos leva a acreditar que o Direito construído pelas teias da Inquisição apresenta um arcabouço jurídico sem critérios previamente definidos e a sua aplicabilidade é decorrente de um querer da sanha punitivista da Igreja e Estado, conectados pelo regime do Padroado, o qual pode ser entendido como “uma combinação de direitos, privilégios e deveres concedidos pelo papado à Coroa portuguesa, patrona nas missões e instituições eclesiásticas católicoromanas”( Azzi, 1983, p. 155). Contudo, a nossa formação histórica-jurídica é deficitária em múltiplas searas – inclusive nesse campo dos institutos inquisitoriais. Isso implica por muitas vezes na reafirmação do cenário explicitado acima, o qual tem como horizonte um Tribunal do Santo Ofício Português e deixa de fora dos livros de Direito a presença da Inquisição no cotidiano da colônia Brasileira, atuante desde o primeiro visitador inquisitorial Heitor Furtado, entre 1591 e 1595, responsável por inspecionar Pernambuco, Itamaracá e Paraíba (MARCOCCI;PAIVA, 2013, P.118). A presença dos agentes inquisitoriais – notários, comissários e familiares – na colônia fora maciça em algumas capitanias, principalmente naquelas que auferiam mais lucros para a Coroa, como Minas Gerais. Sua atuação perdurou até o final do século XVIII, mesmo sem uma estrutura física de um Tribunal Inquisitorial nas terras brasileiras. Há um grupo notável de Historiadoras e Historiadores que vêm se dedicando há algumas décadas a descortinar esta história oficiosa, tais como Aldair Rodrigues, Anita Novinsk, Bruno Feitler, Laura de Mello Souza, Lina Groisntein, Luiz Mott, Neusa Fernandes, Patrícia Santos, Ronaldo Vainfas, Sônia Siqueira e Ylan de Mattos Por que trazer a perspectiva do Direito Inquisitorial para analisar brevemente a sentença de Lula e a turbulenta Operação Lava Jato? Porque a espetacularização da mídia hegemônica, somada às críticas de juristas sobre procedimentos eleitos nesta “cruzada da fé” pelo combate à corrupção, têm trazido debates que circundam o imaginário de institutos correlacionados ao Direito Inquisitorial, como por exemplo a postura (im)parcial do juiz Sérgio Moro e a força tarefa do Ministério Público Federal do Paraná, bem como a falta (ou não) de observância aos critérios legalmente previstos. *
Advogada na Assessoria Popular Maria Felipa, Mestra em Direito pela UFMG, Professora no Curso de Direito na Faculdade Promove em Belo Horizonte, Feminista e Militante Social. ** Graduado em História pela Universidade Federal de São João del Rei e militante das Brigadas Populares. 160 O Direito Inquisitorial explorado neste ensaio é o oriundo da Inquisição Ibérica, criado nos Reinos de Castela e Aragão e Portugal na virada do século XV para o XVI. Para maiores informações: MARCOCCI, Giuseppe. PAIVA, José. História da Inquisição Portuguesa (1536-1821). A Esfera dos Livros: Lisboa, 2013.
COMENTÁRIOS A UMA SENTENÇA ANUNCIADA: O PROCESO LULA 172