A INCONSTITUCIONALIDADE DO PROCESSO QUE CONDENA À PRISÃO LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA E O BRASIL Pedro Pulzatto Peruzzo* Tiago Resende Botelho** Condenar líderes políticos populares não é nenhuma novidade na história da humanidade. O ato estatal de sentenciar repleto de parcialidade e injustiça é mais recorrente do que se possa imaginar, afinal a tradição jurídica ocidental sempre se utilizou do direito para legitimar as formas estruturais de opressão ou, quando muito, para conceder migalhas aos oprimidos. Sabemos, também, que as figuras do juiz e do promotor estão muito mais ligadas à imagem simbólica da deusa Iustitita (que tem os olhos vendados) do que à da deusa grega Diké (que tem os olhos abertos). Além de admitir que a justiça desconsidera a necessidade de juízes e promotores viverem uma vida para além das regalias dos seus gabinetes e das suas bolsas-moradia, bolsa-isso, bolsa-aquilo, a venda nos olhos dificulta a compreensão de que entre homens e mulheres cultos e dotados do saber erudito também existem aqueles que transfiguram a lei e empurram vidas à indignidade. Assim, a revisitação ao passado é a forma mais viável para concluirmos que injustiças judiciais estão sendo praticadas aos montes e denunciá-las é um dever ético. Se o Estado no passado foi capaz de fabricar sentenças injustas e ilegais contra líderes políticos como Tiradentes, Olga Benário, Mandela e Gandhi, entre outros, por qual motivo o presente não faria o mesmo? Quais as garantias de que perseguições políticas contra líderes populares não mais ocorrerão? No Estado democrático de direito deveria ser a Constituição o limite do arbítrio estatal e a garantia de que nenhum ser humano seja perseguido e injustiçado. A norma constitucional assegura o devido processo legal (art. 5º, LIV), proíbe a prova obtida por meio ilícito (art. 5º, LVI) e assegura a presunção de inocência (art. 5º, LVII). Entretanto, a frágil democracia brasileira passa, desde 2015, a ser ainda mais vilipendiada com a abertura de um indevido processo de impeachment, recepcionado por Eduardo Cunha (hoje preso), que desencadeou o afastamento da presidenta democraticamente eleita Dilma Rousseff. O medo de que a trama antidemocrática seja desfeita tem residido na possível candidatura do nordestino que desafia seus limites e, pela terceira vez, pode vir a ser presidente do Brasil (novamente legítima e democraticamente). Sem exceção, os processos que envolvem o maior líder político da América Latina são repletos de obscuridades, informações truncadas, erros e abusos judiciais, teses jurídicas avessas às usadas pela jurisprudência consolidada, falta de compromisso com a materialidade do crime e muita, mas muita espetacularização seletiva de atos processuais pelos meios de comunicação que, mancomunados com os organizadores do
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Doutor e mestre em Direito pela USP. Professor da PUC-Campinas e advogado. peruzzopp@hotmail.com Doutorando em Direito Público pela Universidade de Coimbra e Mestre em Direito pela UFMT. Professor da Faculdade de Direito e Relações Internacionais da UFGD e advogado. tiagobotelho@ufgd.edu.br **
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