PRECES PARA THEMIS Cezar Britto* A deusa grega Themis, também chamada de Justitia pelos romanos, era filha de Urano e Gaia, sendo considerada a personificação da Ordem e do Direito divinos, ratificados pelo Costume e pela Lei. No Olimpo, ocupava o destacado cargo de conselheira de todos os deuses, sentava-se ao lado do poderoso Zeus, selava o destino da sociedade, determinava as regras morais, sociais e religiosas e, enfim, julgava a todos com o dom da infalibilidade. Tornou-se, com este currículo, a Deusa da Justiça, ainda mais quando impressionava o seu austero exemplo divino, bem representado no fato de que se apresentava com os olhos vendados, segurando uma balança e uma tábua de leis. E para quem não está familiarizado com o jeito de ser da badalada deusa, esclarece-se que ela não vendava os seus próprios olhos por capricho, marketing religioso ou assumido prazer masoquista. Ao contrário, assim agia por deliberado querer funcional, pois, não enxergando a classe social, o poder econômico, a aparência física ou o aspecto intelectual dos suplicantes, poderia melhor julgar e aplicar a Justiça requerida. As tábuas de leis que acompanham a sua indumentária, significam que todos devem seguir, universalmente, as mesmas regras e os mesmos princípios preestabelecidos, independentemente da condição humana ou divina do julgado. A balança que porta simboliza o equilíbrio que deveria pautar o mundo, observando-se que os deuses, as pessoas e os seus atos têm seus pesos quantificados, igualitariamente, tanto em relação aos seus respectivos erros e acertos, quanto aos prêmios e os castigos. É escrever em outras palavras: não olhando "o quem" postulava, seria mais justa e sensível para escutar e julgar "o que" se buscava. Assim, não poderia surpreender a constatação de que a deusa Themis tivesse se tornado uma verdadeira popstar entre gregos, troianos, romanos e todos aqueles que acreditavam na divindade dos que habitavam o Olimpo. Ela era invocada por todos aqueles que se sentiam injustiçados, oprimidos ou indefesos diante dos poderosos deuses, das pessoas que se diziam deuses e dos que endeusavam a arbitrariedade. Os seus devotos sabiam que poderiam contar com a sua voz defensiva nas reuniões dos deuses, especialmente quando violados os ordenamentos impositivos inscritos em suas famosas tábuas, desequilibrando a balança da vida. E, segundo consta dos livros sagrados divulgados pelas sacerdotisas de seus templos, ela sempre atendia as súplicas mais justas. Sobrevivendo aos caprichos implacáveis do tempo, assistindo de camarote a derrocada da própria mitologia grega que a revelou para o mundo, o deslumbrante charme de Themis continuou conquistando a atenção de todos os povos do planeta, inclusive os ateus e os que professam o monoteísmo, fundamentalista ou não. Basta constatar que Themis foi presença cativa em vários episódios que deixaram marcas profundas na História, até porque não se pode falar em igualdade, liberdade e fraternidade sem clamar por Justitia. E não se pode esquecer que a sua imagem, desde o início do seu *
Advogado e escritor, autor de livros jurídicos, romances e crônicas. Foi presidente da Ordem dos Advogados do Brasil e da União dos Advogados da Língua Portuguesa. É membro vitalício do Conselho Federal da OAB e da Academia Sergipana de Letras Jurídicas.
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