LiteraLivre Vl. 6 - nº 33 – Mai./Jun de 2022
Joedyr Bellas São Gonçalo/RJ
“O Menino” As cruzes. Cruz credo. Em frente ao cemitério o menino não passava nem amarrado, nem ameaçado de morte, porque de morte ele iria para a última morada, como dizia o vovô quando o menino perguntava pela vó, a vovó foi para a última morada. E a última morada, na imaginação do menino, era onde moravam os fantasmas, as assombrações e o menino de fantasmas e assombrações não queria saber. Sabia da bola dente de leite no paralelepípedo e da seta no bolso de trás do calção onde ele carregava as bolas de gude e a seta quando ia pro morro caçar passarinho, não caçava, tinha pena e medo, se pelava de medo. Um dia ele falara todo de peito estufado, hoje vou pro morro e vou matar rolinha. E ele falara isso logo para uma senhora cheia de miçangas no turbante branco na cabeça e parangolés nos pulsos, dona Rosa, a Rosa das magias, dos feitiços, das rezas para desinchar pé inchado de cachaça ou de trabalho feito. Diziam até que ela reconstruía casamentos, mas que um belo dia, pela mocidade dela, toda bonita e fagueira, acabara com um casamento. O homem ficou bobão e caidinho por Rosa, nessa época ainda era Rosa, só Rosa, eu já a conheci como dona Rosa e dona Rosa falara para o menino que rolinha era bichinho de Deus e quem matasse rolinha ou qualquer outro bicho da criação ia penar dentro do cemitério. E desde esse dia o menino nunca mais matara passarinho algum. Subia o morro com a sete no bolso e ficava sentado em cima de uma pedra encantado com a passarada. Desconfiavam os colegas do menino que ele nunca matara passarinho nenhum. Nem calango. Cruz credo. E o menino levava a vida dele assim. Pés no chão. Brigava por Ritinha, corria atrás de borboleta, pegava tanajura pra vó fazer farofa, tanajura na cabeça dele não estava na lista dos bichos que não podia matar. A galinha ensopada no fim de semana com batata também não. De bife de boi com farofa e batata frita não precisava nem de arroz nem de feijão, a mãe obrigava. Então ele comia
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