LiteraLivre Vl. 6 - nº 33 – Mai./Jun de 2022
Helena Schiavoni Sylvestre Americana/SP
O pedido de aniversário Havia acordado com a cabeça explodindo. Mal conseguia abrir os olhos devido à claridade do dia entrando pela fresta da janela do quarto. Sequer despertara por completo e já estava arrependido pelas quinze doses de tequila tomadas na noite anterior. Fizera aniversário e quis comemorar com tudo o que tinha direito. Mas não imaginou que fosse acordar no dia seguinte sentindo o corpo todo rígido e pesando uma tonelada. Tentou mexer-se na cama. Percebeu-a pequena para seu tamanho. Estranhou. Passados alguns minutos, com os olhos já adaptados à luz do Sol, reparou na sua aparência recém-adquirida: meia dúzia de longuíssimas pernas e uma rígida carapaça. Horrorizado, levantou-se de supetão e percebeu que não apenas sua cama ficara pequena, mas todo o seu quarto. Com alguma dificuldade, olhouse no espelho do armário e encontrou outros sinais da sua monstruosidade. Num impulso, jogou o objeto na parede, com a esperança de que os vidros estilhaçados o fizessem voltar à sua forma anterior. Passado o ímpeto de raiva, parou para pensar sobre o que poderia tê-lo levado a acordar sob aqueles moldes. Lembrou-se do bolo.
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Perguntou a si mesmo o que acontecera com o pedido que havia feito na noite anterior ao cortar seu bolo de aniversário. Tinha certeza de ter fechado bem os olhos e invocado com muita fé. Queria se transformar em borboleta. Uma bela borboleta de asas azuis, para pousar de flor em flor e poder tocar suas pétalas sensíveis com as minúsculas perninhas. Agora estava ali, metamorfoseado na forma de um inseto asqueroso. Tinha certeza que o problema estava na espátula de bolo. No ano passado, também foi o caos. Pediu para ganhar a habilidade de ficar invisível, e acabou sumindo do mapa. Foi parar em Fiji, um país completamente desconhecido localizado no meio do Pacífico Sul. Com seu novo corpo, de tamanho descomunal, arrastou-se até a cozinha. A primeira pessoa que o encontrou metamorfoseado foi sua mãe. Olhou-o de cima a baixo antes de soltar um rápido sermão. — Felipe, Felipe... De novo essa história? Da próxima vez eu mesma vou cortar esse bendito bolo. E agora, o que te dou pra comer no café? Pão com manteiga ou meia dúzia de