LiteraLivre Vl. 5 - nº 30 – Nov./Dez. de 2021
Joaquim Bispo Odivelas, Portugal
Meia dúzia de safanões «O novo panorama terrorista mundial obriga-nos a gastar muitos recursos e a equacionar outras formas de guerra.» — alertava a caixa introdutória do artigo da revista. O assunto interessava a Patrício Neves. Verificou as outras “gordas”: «Até aonde devemos ir no combate ao terror? De quanta humanidade estamos dispostos a abdicar? Devemos aceitar descer aos níveis de desumanidade dos terroristas, desde que nos salvemos e aos nossos compatriotas?» Enquanto os colegas analisavam o conteúdo de uma escuta à comunicação de um suspeito, foi lendo o corpo do artigo. De repente, cresceu a agitação à sua volta. Parecia que as semanas de vigilância nas comunicações tinham dado frutos. Hasnain, o intérprete que trabalhava para os serviços secretos, foi perentório: — Bomba! Eles falar em bomba. Falar “Baixa-Chiado”. Passar gravação outra vez! Não foi possível detetar a origem da chamada, mas o SS já conhecia a morada do recetor: uma casa decrépita na zona da Mouraria. Eram sete e meia da manhã quando os agentes entraram na rua do Capelão, já de saídas bloqueadas. O suspeito, um
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paquistanês de menos de 30 anos, não ofereceu qualquer resistência. Uma busca minuciosa encontrou uma dúzia de telemóveis e uns vinte sacos, de cinco quilos, de farinha. Antes das nove, iniciou-se o interrogatório nas instalações dos Serviços. Ahmid, o suspeito, garantia que não sabia quem lhe tinha telefonado. — Tu não me venhas com tretas! Quem é que te telefonou? Era uma ordem para um atentado? Fala, senão faço-te engolir esses dentes! — irritava-se o agente Moreira. — Eu não sabe. Telefone tocar, Ahmid ouvir. Parecia sincero, mas terroristas nunca se sabe.
com
— Mas quem foi e o que queria? — Não sabe. perguntar loja fruta.
Falar
Lisboa,
Não se passou disto toda a manhã, até que, pelas duas da tarde, os quatro agentes envolvidos na detenção, cansados e irritados, resolveram fazer uma pausa para comer qualquer coisa. Um deles sugeriu uma conhecida adega do Lumiar, ali perto. Àquela hora já devia ter lugares.